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Astros em extinção

Cientistas dos campos da astronomia e da ecologia se unem para desenvolver um sistema de monitoramento que auxiliará na conservação de animais em risco

Por Jennifer Ann Thomas Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 20 abr 2018, 06h01 - Publicado em 20 abr 2018, 06h00
(Arte/VEJA)

Desde 1800, uma vertente da astronomia passou a se dedicar ao estudo da luz infravermelha emitida por astros longínquos. Invisível a olho nu, essa luz é perceptível pelas ondas de calor geradas por átomos que se movimentam conforme são afetados pela força da gravidade de estrelas e planetas. O avanço científico permitiu o desenvolvimento de telescópios espaciais que, a partir do século XX, começaram a detectar astros a anos-­luz de distância, justamente com o uso de lentes sensíveis às flutuações de calor. O mais célebre deles é o Hubble, lançado em 1990 pela agência americana Nasa.

A novidade é que agora a mesma técnica aplicada para explorar o cosmo está sendo usada para esclarecer assuntos terrenos: o rastreamento de animais em risco de extinção e a detecção de suas condições de saúde. A ideia, no futuro próximo, é monitorar cada exemplar das espécies ameaçadas, de modo a protegê-las.

A iniciativa nasceu da parceria entre dois cientistas europeus. Um deles é astrofísico; o outro, ecologista. Ambos são pesquisadores da Universidade John Moores, na Inglaterra. O detalhe: além de trabalharem juntos, eles eram vizinhos. Certo dia, o inglês Steven Longmore (o astro­físico) e o holandês Serge Wich (o eco­logista) conversavam animadamente sobre os problemas do mundo. Wich reclamou da dificuldade em contar os animais em extinção, processo manual e cansativo. O colega, habituado a ver estrelas, teve um momento de eureca e sugeriu usar, na identificação e contagem dos bichos na Terra, a forma adotada para estudar os astros distantes no espaço sideral.

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“Se na astronomia é necessário enviar telescópios com lentes enormes ao espaço, no trabalho de conservação basta acoplar uma pequena câmera a um drone”, disse Longmore em entrevista a VEJA. “É mais fácil e mais barato.” O progresso tecnológico ajudou a impulsionar a nova empreitada de cuidado com a fauna. Há uma década, uma câmera sensível ao calor instalada nos drones seria um investimento de 400 000 reais. Hoje, sai por cerca de 40 000.

A iniciativa da dupla de pesquisadores foi divulgada ao público no último dia 4, durante a conferência anual da Sociedade Astronômica Europeia, na Inglaterra. O trabalho começou em 2015, quando foi realizado um pioneiro teste em uma fazenda inglesa no qual se provou a possibilidade de diferenciar padrões de calor emitidos por humanos dos propagados por vacas em um pasto. A partir da comprovação de que era possível enxergar as nuances da temperatura corporal de cada espécie, identificando-as tão somente por esse quesito, os cientistas ampliaram o trabalho e partiram para os testes práticos. A inovação já foi experimentada para registrar elefantes asiáticos do zoológico de Chester, também na Inglaterra, e rinocerontes no Deserto de Karoo, na África do Sul. Segundo Longmore, o desafio será adaptar o recurso para ambientes menos propícios ao rastreamento, como hábitats de vegetação mais densa ou de elevadas temperaturas. “Pelos métodos anteriores, era enorme a dificuldade de coletar dados sobre os animais em risco. Esse trabalho pode ser revolucionário”, afirmou o ecologista Wich a VEJA.

Três destinos estão no cronograma dos próximos dois anos de experiências. A primeira parada será na Ilha de Bornéu, na Ásia, onde os cientistas procurarão por orangotangos. Depois planejam viajar para o México, em busca de macacos-aranha. Por fim, eles chegarão ao Brasil, onde os drones sensíveis ao calor devem rastrear botos-cor-de-rosa na Amazônia. Na sequência, a ideia é compartilhar a tecnologia com cientistas ao redor do planeta. O resultado será um banco de imagens térmicas das diversas espécies, da mesma forma como astrofísicos registram as diferentes estrelas detectadas universo afora.

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“O sonho é um dia usar satélites em órbita para observar e proteger a Terra e sua fauna diretamente do espaço”, ambiciona o astrofísico inglês Steven Longmore

Além de monitorar as espécies, a nova tecnologia poderá ser empregada para flagrar ações criminosas contra os animais em risco. Dada a eficácia do mecanismo para fazer rastreamentos durante o período noturno, será possível usá-lo para verificar a ação de caçadores ilegais, que comumente saem em busca de suas presas depois que escurece justamente para não ser pegos pelas autoridades. “O sonho é um dia usar satélites em órbita para observar e proteger a Terra e sua fauna diretamente do espaço”, vislumbra o astrofísico Longmore. Uma iniciativa desse gênero poderá ser um antídoto contra uma estatística que tanto empobrece nosso planeta: todos os dias cinco espécies de animal ou planta são extintas em decorrência de atividades humanas. Se der certo, o engenho humano terá chance de vencer certas previsões catastróficas sobre a vida na Terra.

Publicado em VEJA de 25 de abril de 2018, edição nº 2579

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