Sem um candidato encabeçando uma chapa presidencial pela primeira vez desde a redemocratização, com o ninho cindido em intrigas internas entre caciques e um desempenho pífio na recente eleição ao Congresso, o PSDB parecia caminhar de forma acelerada para o abismo. O resultado final do pleito trouxe algum alívio. Dos quatro estados onde foi ao segundo turno, a sigla venceu em três, todos de virada, consolidando os projetos de Eduardo Leite (RS) e Eduardo Riedel (MS), e levando a oposição ao governo com a vitória de Raquel Lyra em Pernambuco. Apesar desses triunfos de última hora, eles não foram suficientes para apagar o saldo negativo da campanha. Em termos dos Executivos estaduais, o partido ganhou o direito de comandar menos da metade da população que governava quatro anos atrás (veja o quadro abaixo). Fator que pesou decisivamente para isso foi a derrota de Rodrigo Garcia em São Paulo, que não conseguiu chegar sequer ao segundo turno. O estado mais poderoso da federação era comandado pela agremiação havia quase três décadas e as feridas abertas pelo fracasso devem mudar o eixo do poder das decisões nacionais do PSDB, sempre muito influenciado pelos caciques paulistas que fundaram o partido.
Dentro desse processo, o nome de Eduardo Leite desponta como maior liderança nacional do partido. Mesmo com uma trajetória errática, que incluiu a derrota nas prévias presidenciais para João Doria e a renúncia ao Palácio Piratini ainda aspirando a voos maiores, Leite se tornou o primeiro governador a vencer duas vezes seguidas no Rio Grande do Sul. Ele ocupará um espaço que ficou vazio com as derrotas de caciques como José Serra, Tasso Jereissati, Arthur Virgílio Neto e Marconi Perillo, além da saída de cena de Doria. Empoderado pela vitória, o gaúcho passou a ser a primeira voz a defender a mudança no eixo do poder. “São Paulo é força e fraqueza do PSDB, porque ao mesmo tempo em que é relevante, também consome muita energia. Nas prévias presidenciais, o projeto paulista falou mais alto que o nacional dentro do partido. Então a mudança traz efeitos positivos para compor um novo momento mais abrangente”, afirmou a VEJA Eduardo Leite.
A tentativa de renascimento do PSDB passa ainda por uma correção de rota e a renovação da Executiva Nacional para repensar a posição do partido em meio a um novo cenário político. O mandato do atual presidente da sigla, Bruno Araújo, termina em junho de 2023. Nos bastidores tucanos, fala-se em uma disputa pelo comando nacional entre Eduardo Leite e o deputado federal Aécio Neves, que ainda exerce forte influência sobre a bancada tucana no Congresso. Independentemente de quem assumir o leme, terá de levar o barco pelas águas incertas do centro democrático, cada vez mais rasas em meio ao ambiente polarizado. Os tucanos, que já andam de mãos dadas com o Cidadania, negociam a integração do MDB à federação. Em nível regional, também há conversas com outras legendas, como o Podemos, o PDT e o PSB. “Acho que há uma tendência de unificação de todo o centro democrático”, afirma o deputado Paulo Abi Ackel (PSDB-MG).
Para além de alianças, o partido precisa encarar a crise ideológica que se arrasta há tempos. “O PSDB S.A. faliu”, decretou Aécio Neves, em clara alusão ao projeto paulista de Doria, cuja marca sempre foi fazer uma gestão pública com espírito empresarial (com resultados positivos, diga-se). Aécio, aliás, contribuiu para o agravamento da cizânia interna, ao liderar um levante contra a vitória de Doria nas prévias. Uma das possibilidades aventadas no processo de reconstrução seria uma volta às origens, tentando resgatar o espírito da social-democracia da época da fundação do partido. Mas nem os mais otimistas dos tucanos acreditam que será fácil a tarefa de levantar voo de novo em meio a tantas dificuldades do presente.
Publicado em VEJA de 9 de novembro de 2022, edição nº 2814