Queiroz reaparece, fala de coronavírus e diz a amigo: ‘Eternamente grato’
Ouça a mensagem e veja as imagens mais recentes do misterioso amigo do presidente Bolsonaro envolvido no escândalo da 'rachadinha'
Amigo do presidente Jair Bolsonaro e suspeito de ser laranja do senador Flávio Bolsonaro, o ex-policial militar Fabrício Queiroz passou por uma cirurgia, no mês passado, para a retirada da próstata. Antes de ir para o hospital, ele fez questão de entrar em contato com um amigo para deixá-lo a par da situação. Em mensagem de áudio a que VEJA teve acesso, Queiroz falou de sua saúde, debilitada desde que começou a lutar contra um câncer no intestino, e também dos favores que deve. “Valeu, valeu, meu irmãozão. Obrigado por tudo aí, tá? Gratidão não prescreve, cara, não prescreve mesmo. O que você está fazendo pelas minhas filhas aí, cara, não tem preço. Serei eternamente grato, entendeu?”, diz.
OUÇA O ÁUDIO DE QUEIROZ:
No mesmo áudio, o ex-policial mostra preocupação com o surto de coronavírus em São Paulo, mas acredita que, assim como ele, os brasileiros vão conseguir atravessar esse momento difícil. “Amanhã, estou me submetendo a essa cirurgia grande aí, anestesia geral, entendeu. Esse problema aqui em São Paulo está demais também, de coronavírus. Se Deus quiser, vou sair dessa aí, e todo o povo brasileiro também, né, irmão? A gente se vê. Assim que eu terminar a cirurgia, eu recuperar, eu ligo para você. Forte abraço.” O amigo não foi identificado. VEJA também obteve imagens do ex-policial captadas no dia em que ele se submeteu à cirurgia para a retirada da próstata.
A gratidão de Queiroz interessa a altas autoridades da República. O ex-policial militar ganhou notoriedade depois de o órgão de inteligência financeira do governo – o antigo Coaf, rebatizado de UIF – detectar que ele movimentou uma dinheirama incompatível com sua remuneração mensal quando trabalhava no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio. Entre 2014 e 2015, foram 5,8 milhões de reais. Entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, mais 1,2 milhão de reais. O relatório também registrou que Queiroz depositou 24.000 reais na conta da primeira-dama Michelle Bolsonaro. A reação inicial do presidente foi admitir que era amigo de Queiroz e dizer que o dinheiro repassado a Michele fazia parte do pagamento de um empréstimo que o próprio Bolsonaro havia concedido ao amigo de longa data. O Ministério Público do Rio de Janeiro investiga o caso.
Desde então, há um esforço nos bastidores para manter Queiroz escondido – e calado – até que seus advogados e os de Flávio Bolsonaro consigam suspender ou arquivar o caso na Justiça. A ofensiva nesse sentido é incessante e abrange da primeira instância ao Supremo Tribunal Federal (STF). No último dia 11 de março, a desembargadora Suimei Cavalieri, do Tribunal de Justiça do Rio, suspendeu a investigação da rachadinha a pedido da defesa de Flávio Bolsonaro. Menos de duas semanas depois, Suimei derrubou a sua própria decisão. O recuo da magistrada deixou o entorno de Bolsonaro preocupado. Pessoas próximas ao presidente temem que a Justiça do Rio, aproveitando-se da debilidade demonstrada pelo mandatário na crise do coronavírus, decrete alguma medida contra Queiroz e seus familiares, como uma prisão preventiva. Isso, alegam os bolsonaristas, poderia levá-lo a ser cooptado por adversários do presidente, que o obrigariam a testemunhar contra Jair e Flávio Bolsonaro.
Como se sabe, a primeira-família da República debita tudo na conta das grandes conspirações contra ela. A investigação da rachadinha, por exemplo, seria uma armação do governador do Rio, Wilson Witzel, com o objetivo de impedir a reeleição de Bolsonaro. Há um problema de origem nessa tese. O relatório do Coaf sobre Queiroz é de janeiro de 2018. Jair e Flávio tomaram conhecimento do documento entre o primeiro e o segundo turnos daquela eleição, quando decidiram exonerar o faz-tudo da família. Naquela época, reta final da campanha, o filho mais velho do presidente trabalhava pela eleição justamente de Witzel, que hoje sim é um rival da família. Até as transações suspeitas serem detectadas, Queiroz era um mandachuva no gabinete de Flávio na Assembleia do Rio. Tinha poder para contratar quem bem entendesse. Em contrapartida, segundo a investigação, recolhia parte dos salários dos servidores. Foi ele quem empregou a mãe e a ex-mulher do ex-capitão do Bope Adriano Magalhães da Nóbrega no gabinete. Morto numa operação policial realizada em janeiro, Adriano era acusado de chefiar um grupo de extermínio que atuava para uma milícia. Na década passada, quando respondia por homicídio, foi defendido por Jair e Flávio Bolsonaro, que dispensaram a ele a alcunha de heroi.
O outrora poderoso Queiroz também empregou no gabinete de Flávio duas filhas, Evelyn e Nathália, que lhe devolviam parte do que recebiam como salário. São a elas que ele faz menção no áudio. É de um futuro tranquilo para elas que depende a sua gratidão.
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