PSOL expulsa milicianos suspeitos de infiltração na legenda de Marielle
VEJA revelou que membros do Escritório do Crime se filiaram ao partido; expulsão foi confirmada pela presidente da sigla no Rio de Janeiro
Dois milicianos do Escritório do Crime sob suspeita de infiltração no partido da vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada a tiros junto ao motorista Anderson Gomes em uma emboscada no Estácio, bairro da região central do Rio de Janeiro, em 14 de março de 2018, foram expulsos da legenda nesta quarta-feira, 16. A informação foi confirmada à reportagem pela presidente da sigla no Rio, Isabel Lessa. O caso foi revelado por VEJA na última semana.
“Por decisão do diretório nacional do PSOL, eles foram expulsos e já foi encaminhada a desfiliação”, declarou ela. Embora o partido soubesse do ingresso dos dois na sigla desde meados do ano passado, a expulsão não havia ocorrido porque a legenda não queria obstruir os trabalhos da Delegacia de Homicídios da Capital, que investiga o caso. O processo de desfiliação dos milicianos, segundo a reportagem apurou, seguiu-se respeitando os trâmites normais do estatuto do PSOL.
Exclusivo: Milicianos do Escritório do Crime se filiaram ao PSOL em 2016
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“De fato, para nós, causou uma consternação muito grande dessas pessoas estarem filiadas ao PSOL. Nós fomos informados há algum tempo pela Polícia Civil e mantivemos em sigilo no sentido de colaborar com a polícia para que as investigações pudessem correr da maneira mais tranquila possível, para que a gente pudesse chegar logo ao final desse inquérito. Causa uma indignação, um grito no nosso peito: Quem mandou matar Marielle?”, declarou ela à reportagem.
Na semana passada, o caso completou mil dias sem essa resposta, tampouco sem responder o porquê da vereadora e de seu motorista terem sido assassinados na emboscada feita por um Chevrolet Cobalt prata clonado. O PM reformado Ronnie Lessa e o ex-PM Élcio de Queiroz são réus apontados, respectivamente, como atirador e motorista do veículo. Queiroz está preso na Penitenciária Federal de Porto Velho, em Rondônia. Já Lessa, por sua vez, foi transferido desta unidade na semana passada para o Presídio Federal de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, a pedido do Ministério Público do Rio, conforme VEJA antecipou.
Escritório do Crime no caso Marielle e Anderson
A informação sobre as filiações do casal Laerte Silva de Lima e de Erileide Barbosa da Rocha, obtida com exclusividade por VEJA, reposiciona o setorizado grupo de milicianos e sicários formado por Adriano Magalhães da Nóbrega, ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope), novamente no caso Marielle. Um dos milicianos que se filiou ao PSOL era homem de extrema confiança do capitão. Laerte e Erileide foram presos nas Operações Intocáveis 1 e 2, desencadeadas pelo MP do Rio. Adriano, por sua vez, foi morto pela Polícia Militar da Bahia em circunstâncias ainda não esclarecidas.
Embora polícia e Ministério Público do Rio tenham descartado a participação do Escritório do Crime no atentado contra Marielle e Anderson, a decisão sigilosa da 1ª Vara Criminal Especializada do TJ do Rio, que levou os herdeiros de Adriano, os irmãos Leonardo Gouvêa da Silva, o Mad, e Leandro Gouvêa da Silva, o Tonhão, à cadeia em 30 de junho deste ano indica o contrário. “Vale destacar, também, a palpável linha de investigação no sentido do possível envolvimento da organização criminosa no homicídio consumado das vítimas MARIELLE FRANCISCO DA SILVA e ANDERSON PEDRO MATIAS GOMES.”
A decisão segue: “Ressalte-se, ainda, a estreita vinculação da organização criminosa com o reconhecido grupo criminoso de natureza paramilitar que atua na comunidade de Rio das Pedras, no Rio de Janeiro, que foi alvo da operação denominada “INTOCÁVEIS” (que teve por base elementos de prova decorrentes do procedimento investigativo que lastreia a presente demanda), deflagrada em 22.01.2019”.
Tudo indica que Laerte, braço armado da milícia de Rio das Pedras e Muzema, na Zona Oeste do Rio, não fazia parte do consórcio criminoso que mata sob encomenda – um dos ramos de atuação do Escritório. Erileide, por sua vez, fazia a contabilidade do grupo, supostamente sem atuar com armas, mas sabendo sobre toda a forma de organização da máfia, inclusive gerenciando carros clonados.
Cabe, agora, às autoridades responderem o porquê dos réus pela milícia de Rio das Pedras e Muzema terem se filiado à legenda de esquerda. Pelo histórico documentado de ambos em atividades criminosas, parece estar longe de uma suposta afinidade com os ideais da sigla de Marielle.