O primeiro integrante do primeiro escalão do governo do presidente Jair Bolsonaro a passar por um processo de “fritura” seguido de demissão, o ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência Gustavo Bebianno entende que o método de expor divergências com subordinados publicamente para depois descartá-los, ou levá-los a pedir para sair, pode comprometer a confiança e a lealdade dos membros da equipe em relação ao presidente.
Bebianno foi demitido em fevereiro, depois de o vereador Carlos Bolsonaro, o filho Zero Dois do presidente, publicar mensagens no Twitter que desmentiam a declaração do então ministro de que vinha conversando normalmente com Jair Bolsonaro durante a crise dos laranjas do PSL. Depois que o advogado saiu da pasta, VEJA revelou áudios que mostram que Bebianno havia, de fato, conversado com o presidente no aplicativo WhatsApp.
“Considero esse modelo de gestão bastante equivocado. Nunca se sabe o dia de amanhã. Além disso, comprometem-se também a confiança e lealdade da tropa”, disse Bebianno a VEJA nesta segunda-feira, 17.
“É preciso distinguir os bajuladores daqueles que realmente querem ajudar. O primeiro grupo, sempre, é constituído por fracos que abandonam o barco ao primeiro sinal de risco”, completou o advogado, sem entrar em detalhes sobre a quem se referia.
Em entrevista a VEJA em maio, Bebianno já havia criticado o que chamou de “processo de difamação” e “queima” de ministros. “Nesse governo, no entanto, a exoneração é sempre precedida de um irresponsável e desnecessário processo de difamação. Por que tentar manipular a opinião pública? Para que o presidente e seus filhos pareçam mártires, enquanto todos os demais, traidores, comunistas ou infiltrados? Queimar injustamente os ministros de Estado escolhidos pelo próprio presidente não me parece o método mais inteligente e ético. Isso terá consequências.”
Fogo alto
Depois de Gustavo Bebianno, passaram por processos de desgaste público deflagrados por Bolsonaro ou Carlos o ex-ministro da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz, o presidente dos Correios, general Juarez de Paula Cunha, e o ex-presidente do BNDES, Joaquim Levy.
No caso de Santos Cruz, o general resistiu à primeira onda de ataques públicos de Carlos e do escritor e polemista Olavo de Carvalho, guru bolsonarista, mas foi demitido pelo presidente na quinta-feira 13, após abrir duas frentes de conflito interno: com o chefe da Secretaria de Comunicação do governo, Fábio Wajngarten, próximo de Carlos, e com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
Em relação ao general Cunha, ainda oficialmente no cargo, e a Levy, que renunciou neste domingo 16, foi o próprio presidente quem iniciou a fritura. Em um café da manhã com jornalistas na sexta-feira 14, Bolsonaro disse que o general deixaria o cargo por se comportar como um “sindicalista” em visita ao Congresso, onde tirou fotos com parlamentares de esquerda e declarou que a estatal não será privatizada – contrariando ideia de Bolsonaro revelada por ele em entrevista a VEJA.
Joaquim Levy, por sua vez, foi alvo de declarações de Jair Bolsonaro no sábado e pediu demissão no dia seguinte. Bolsonaro afirmou que estava “por aqui” com o ex-presidente do BNDES e que o demitiria nesta segunda-feira se ele não desistisse da nomeação do advogado Marcos Barbosa Pinto para o cargo de diretor de mercado de capitais do banco de fomento. Barbosa Pinto ocupou cargos no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Levy foi secretário do Tesouro entre 2003 e 2006, no governo Lula, e ministro da Fazenda em 2015, na gestão Dilma Rousseff.
“Governo tem que ser assim, quando bota gente suspeita em cargos importantes. E essa pessoa, como o Levy, vem há algum tempo não sendo leal àquilo que foi combinado e àquilo que conhece a meu respeito. Ele está com a cabeça a prêmio já tem algum tempo”, declarou Bolsonaro.
Também contribuíram para a saída de Joaquim Levy da presidência do BNDES a não abertura da “caixa-preta” do banco, uma das promessas de campanha de Jair Bolsonaro, que, na visão do presidente, vai expor ilegalidades em empréstimos a países como Venezuela, Cuba e Angola nos governos do PT; e a não devolução de recursos do BNDES ao Tesouro, como queria o ministro da Economia, Paulo Guedes.