Passava pouco das 22h30 quando o empresário Joesley Batista chegou ao Palácio do Jaburu, a residência oficial de Michel Temer. Era 7 de março deste ano. Ao passar pela guarita de segurança, o sócio do grupo JBS ouvia notícias no rádio do carro. O gravador, escondido no bolso, já estava ligado e registrava tudo. O empresário não foi importunado pelos guardas e nem precisou se identificar, como de praxe – o staff presidencial, aparentemente, já estava avisado do encontro reservado.
Em poucos minutos, Joesley estava diante de Temer. A gravação divulgada nesta quinta-feira pelo Supremo Tribunal Federal após o ministro Edson Fachin suspender o sigilo do caso revela um diálogo aberto entre o presidente e o empresário. Os dois conversam francamente sobre assuntos espinhosos. O presidente da República ouve Joesley falar com tranquilidade sobre o que estava fazendo para se livrar de investigações de que é alvo – em mais de uma vez, ele chega a aprovar as medidas – e é informado das iniciativas para calar o ex-deputado Eduardo Cunha e o operador de mercado Lúcio Funaro, que, presos, ameaçavam fazer um acordo de delação premiada com a Lava Jato capaz de comprometer muita gente, inclusive o próprio Temer e outros integrantes da cúpula do PMDB.
Após começarem a conversa tratando das medidas econômicas adotadas por Michel Temer desde que assumiu o Planalto, Joesley indaga o presidente sobre como estava a relação dele com Eduardo Cunha. “Queria saber como está…”, diz. Temer se queixa da postura do ex-deputado, que já havia dado sinais públicos de que guarda segredos capazes de comprometê-lo. “Eduardo tentou me fustigar”, diz o presidente. Joesley, então, dá um panorama do que estava fazendo em favor de Eduardo Cunha – em outras palavras, dos acertos que fizera para garantir o silêncio do ex-deputado. Ele diz que “zerou” as pendências que tinha com Cunha.
“Dentro do possível, eu fiz o que deu. Zerei tudo”, diz Joesley. Ele cita também o “amigo” de Cunha, referência a Lúcio Funaro, parceiro de negócios do ex-deputado preso em Brasília desde o ano passado. O empresário arremata em seguida: “Tô de bem com Eduardo”. É quando Temer assente com uma frase que, na avaliação dos investigadores da Lava Jato, seria um sinal de aprovação aos pagamentos feitos em troca do silêncio de Cunha: “Tem que manter isso, viu?”.
Em seguida, Joesley Batista atualiza Temer sobre a situação das investigações em que ele e o grupo do qual é dono são alvos – entre elas, um processo em curso na Justiça Federal de Brasília para investigar pagamentos de propina a dirigentes de fundos de pensão de empresas estatais. É quando o empresário relata ao presidente, com a frieza de quem conversa sobre um tema comezinho numa mesa de bar, que estava cuidando de “segurar” os dois juízes que atuam no caso. “Está segurando os dois?”, pergunta Temer. “Tô segurando os dois”, responde Joesley, no que Temer emenda: “Ótimo, ótimo”.
Joesley conta também ao presidente que havia cooptado um integrante do Ministério Público Federal, que lhe repassava informações privilegiadas da investigação – ele se referia ao procurador da República Angelo Goulart, preso nesta quinta-feira por ordem do ministro Edson Fachin. O empresário diz ainda que estava tentando trocar um outro procurador, encarregado de investigá-lo. “Consegui um procurador dentro da força-tarefa que também está me dando informação. E tô para dar conta de trocar o procurador que está atrás de mim. Se eu der conta, tem o lado bom e o lado ruim. O lado bom é que dá uma esfriada (no caso) até o outro chegar. E tem o lado ruim que, se vier um cara com raiva, não sei o quê…”.
Mais adiante, o empresário detalha ao presidente que estava pagando 50 mil reais mensalmente ao procurador que topara repassar informações sobre o andamento do processo. “Tô fazendo um, 50 mil por mês, dando pro rapaz e tal, e ele me dá informação”, diz.
Em nota distribuída na noite desta quinta-feira, Michel Temer afirmou que, durante a conversa com Joesley Batista, não acreditou quando o empresário lhe disse que estava cuidando de “segurar” dois juízes e ainda cooptar um procurador da República que participava das investigações. “O presidente Michel Temer não acreditou na veracidade das declarações. O empresário estava sendo objeto de inquérito e por isso parecia contar vantagem. O presidente não poderia crer que um juiz e um membro do Ministério Público estivessem sendo cooptados”, diz a nota da Presidência da República.
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