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O ministro pop

Moro é o nome mais fulgurante da nova equipe, seguido, muito de longe, por Paulo Guedes — e o restante é, aos olhos do eleitorado, um exército de anônimos

Por Thiago Bronzatto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jan 2019, 07h00 - Publicado em 4 jan 2019, 07h00
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Faltava mais de uma hora para o início da cerimônia de transmissão de cargo, na quarta-feira 2, quando o ex-juiz Sergio Moro decidiu inspecionar pessoalmente a distribuição de convidados no salão em que receberia o posto de ministro da Justiça e Segurança Pública. Acompanhado por três seguranças, checou o nome das autoridades que comporiam o palco no Palácio da Justiça, em Brasília, e das que ocupariam a fileira mais próxima do púlpito. Dias antes havia determinado que a solenidade fosse “moderna”, “modesta” e “rápida”. As instruções vetavam a fila de cumprimentos, o tradicional beija-mão de políticos, o coquetel de boas­-vindas e discursos longos. Foram colocadas 380 cadeiras para acomodar os interessados em prestigiar aquele que é considerado o principal fiador da política de combate à corrupção do novo governo.

Sergio Moro é também o mais célebre dos 22 ministros de Jair Bolsonaro. A pesquisa encomendada por VEJA ao instituto Ideia Big Data expõe em números o alcance da notoriedade do novo chefe da Justiça. O ex-magistrado é conhecido por 97% dos entrevistados — e 76% deles o avaliam de forma favorável. É um resultado direto de sua atuação na Operação Lava-Jato. Diante de tamanho capital político, eram favas contadas que a cerimônia de sua assunção ao ministério rivalizasse com a do novo e igualmente poderoso ministro da Economia, Paulo Guedes, como a mais concorrida da Espla­nada. Mas Moro não é dado a mesuras políticas e nem sequer fez uma lista de convidados. De sua cota pessoal, dois amigos de longa data. Nem mesmo a esposa e os dois filhos, em viagem de férias fora do país, compareceram. O calendário ingrato e as brigas que o ex-juiz comprou ao condenar figurões da política afastaram também tradicionais bicões de solenidades de posse. Sobraram cadeiras.

À exceção dos presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, e do Superior Tribunal de Justiça, João Otávio de Noronha, e do futuro comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, o público era formado essencialmente por servidores do próprio ministério, da Polícia Federal e por familiares da nova equipe de Moro. Nem sinal de grandes bancas de advocacia, governadores ou parlamentares — inquilinos ou não na Lava-­Jato. Único parlamentar presente, o senador José Medeiros (Podemos-­MT) resumiu assim a ausência de outros políticos: “Muita gente ainda se assusta com o Moro. Tanto que, na hora em que ele finalizou o discurso e disse ‘mãos à obra’, teve gente que entendeu ‘mãos ao alto’”. Sergio Moro não ignora que sua cruzada contra a corrupção provoca ojeriza em grande parte da classe política, mas quer aproveitar o início do novo governo para formalizar os primeiros projetos de combate à criminalidade. Na lista estão o aprimoramento das regras para operações policiais disfarçadas e a formalização, em lei, da possibilidade de prisão em segunda instância, tema crucial para interromper os sucessivos recursos de réus que buscam a impunidade. O assunto voltará à pauta do STF em abril.

SUPERMINISTRO – Guedes, o comandante da Economia: desconhecido, poderoso e vital para o sucesso do governo (Valter Campanato/Agência Brasil)

É comum que um governo novo instigue o otimismo das pessoas, mas as promessas de moralização e combate à corrupção sempre foram alvo de muita desconfiança — e com razão. Quem não se lembra do implacável presidente Fernando Collor, “o caçador de marajás”, ou de Lula, o presidente “que não rouba nem deixa roubar”? No entanto, a campanha de Bolsonaro conseguiu despertar a confiança popular. Nem as denúncias de empregar funcionário-fantasma, amealhar um patrimônio um tanto vultoso, dar sumiço em cofre de banco e apresentar ao país o notável Fabrício Queiroz, um dos mais bem-sucedidos negociadores de automóveis do Hemisfério Sul, conseguiram aplacar a esperança do brasileiro no triunfo da ética na vida pública.

Depois do ex-juiz, o auxiliar de Bolsonaro mais badalado é o novo ministro da Economia. Mas, para a maioria dos eleitores, Paulo Guedes ainda é um anônimo. Apenas 5% dos entrevistados ouviram falar de seu nome. Ao contrário da cerimônia de posse de Moro, a de Guedes foi disputada. Entre os quase 400 convidados estavam banqueiros, empresários, advogados, parlamentares, amigos de longa data e familiares. Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do STF, Dias Toffoli, dividiam espaço no palco. Na plateia, o diretor-presidente do Bradesco, Octavio de Lazari, e o presidente do conselho de administração da BRF, Pedro Parente, ouviam atentos o discurso de cinquenta minutos do ministro. Além da reforma da Previdência, Guedes indicou claramente algumas outras prioridades, como o processo de privatização, que deve incluir até 125 estatais, e a simplificação de impostos. Essas propostas deverão sair do papel a partir de fevereiro, quando os novos parlamentares tomarão posse no Congresso. Guedes foi aplaudido mais de dez vezes. Após a cerimônia, a bolsa de valores fechou na máxima histórica. O Ibovespa, o principal índice do mercado acionário do país, subiu e o dólar caiu — sinais de que as palavras do ministro foram bem recebidas.

MINISTÉRIO – A equipe do presidente Bolsonaro é quase anônima para a maioria dos eleitores (Sergio Lima/AFP)

O otimismo sobre o futuro próximo, ao que tudo indica, limita-se apenas ao combate à corrupção e à retomada do crescimento econômico. Em outras áreas, de acordo com pesquisa do instituto Ideia Big Data, percebem-se desconfiança e pessimismo. Apenas 5% dos entrevistados, por exemplo, preveem melhora na gestão da saúde com o governo de Jair Bolsonaro. Na pesquisa, 80% acham que nada mudará no setor, enquanto 15% dizem que a tendência é piorar. Uma parte do pessimismo tem relação com o fato de que 99% das pessoas entrevistadas nunca ouviram falar no nome do atual ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Ao tomar posse na quarta-feira 2, o médico ortopedista e deputado federal por Mato Grosso do Sul viu-se obrigado a se apresentar por meia hora em seu discurso. Depois desse prefácio, prometeu melhorar a gestão dos recursos destinados ao setor, investir na atenção básica e criar um terceiro turno de atendimento na gestão pública, ampliando os horários dos serviços prestados nas unidades de saúde.

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O ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, é outro anônimo: 98% dos pesquisados nunca ouviram falar dele. O colombiano naturalizado brasileiro, com mestrado e doutorado em filosofia, disse em sua posse que vai combater “o marxismo cultural presente nas instituições de educação básica e superior”. Trata-se, segundo ele, de uma “ideologia materialista, alheia aos nossos mais caros valores”. Ao lado do chanceler Ernesto Araújo, que se comporta como um cruzado do século XXI, Vélez Rodríguez é o mais ideológico dos ministros de Bolsonaro, com um discurso quase sempre assustadiço, que parece vislumbrar em cada esquina uma conspirata do campo ideológico oposto. É um caminho temerário para seguir.

Com reportagem de Marcelo Rocha e Nonato Viegas

Publicado em VEJA de 9 de janeiro de 2019, edição nº 2616

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