Nova direção da CNBB quer abrir ‘canal de diálogo’ com Bolsonaro
Em fevereiro, relação foi abalada após vazamento de relatório de inteligência que classificava como 'de esquerda' evento católico sobre a Amazônia
A julgar pelo perfil dos bispos eleitos durante a 57ª Assembleia-Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), reunida em Aparecida (SP) até sexta-feira, 10, a Igreja manterá sua atuação, sem “rupturas”, reafirmando posicionamentos já conhecidos.
Além de seguir a tradição de marcar uma audiência da cúpula com o papa Francisco, a presidência recém-eleita da CNBB pretende se reunir com o presidente Jair Bolsonaro (PSL). O objetivo do encontro é abrir um “canal de diálogo” com o governo e discutir temas voltados à Igreja.
Segundo bispos, eventuais diferenças ideológicas existentes na Igreja são pouco perceptíveis e insuficientes para dividir os integrantes do episcopado entre “conservadores e progressistas”. Os bispos disseram ainda evitar essa “classificação”, sob o argumento de todos concordam em questões de moral e doutrina.
Na segunda-feira 6, o arcebispo de Belo Horizonte, dom Walmor Oliveira de Azevedo, baiano da cidade de Cocos, foi eleito o novo presidente da CNBB para os próximos quatro anos. Dois vice-presidentes – dom Jaime Spengler, arcebispo de Porto Alegre (RS), e dom Mário Antonio Silva, bispo de Roraima –, também foram escolhidos na assembleia-geral.
Doutor em teologia dogmática, dom Walmor foi transferido para Belo Horizonte em 2004. Considerado homem de diálogo, sempre trabalhou em união com seus bispos auxiliares.
Arcebispo emérito de Aparecida, dom Raymundo Damasceno Assis afirmou que, independentemente da troca da cúpula da conferência, a Igreja “não vai mudar”, mantendo o olhar dirigido aos “pobres, negros, indígenas, quilombolas, sem-teto e aos desprotegidos”. Segundo ele, a Igreja vai intervir se alguma dessas populações “sofrer ameaças ou correr riscos com novas políticas de governo”.
Dom Raymundo, que foi duas vezes presidente da CNBB, citou o documento Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2019-2023, aprovado na segunda-feira pelo episcopado. Com base nessas diretrizes, disse dom Raymundo, a Igreja vai atuar, “buscando contato com autoridades e reafirmando posições, como sempre tem feito”. “Isso não depende da opinião de um ou de outro membro da diretoria da CNBB”, declarou.
O arcebispo de Salvador, dom Murilo Krieger, foi na mesma linha. “A publicação de uma nota não depende da assinatura de todos os membros da diretoria.” Ele defendeu a independência da Igreja. “Igreja é igreja, governo é governo”. Defensor da causa indígena e de questões ligadas à terra, dom Erwin Krautler, bispo do Xingu, afirmou que ficou satisfeito com os nomes escolhidos na assembleia em Aparecida. Disse que não haverá ruptura de compromissos e que os “ideais” da Igreja estão mantidos.
Sínodo
Arcebispo emérito de São Paulo, dom Cláudio Hummes, relator-geral do Sínodo da Amazônia, foi questionado sobre a preocupação do Planalto com o que considera “agenda de esquerda” por parte da Igreja. Segundo ele, após conversas com generais, o caso está superado.
À época, informes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e dos comandos militares relataram encontros de cardeais brasileiros com o papa Francisco, no Vaticano, para discutir a realização do sínodo. A inteligência do governo manifestou a preocupação com eventuais ameaças à soberania nacional por parte da pauta do encontro. Dom Leonardo Steiner, então secretário-geral da CNBB, afirmou que o sínodo era “da Igreja para a Igreja” e que não dizia respeito às autoridades.