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Ministério em transe

Sai Vélez, entra Weintraub, e a turma dos olavetes canta vitória. Enquanto isso, os rumos para a maltratada educação do país continuam a ser um mistério

Por Monica Weinberg Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Maria Clara Vieira Atualizado em 12 abr 2019, 07h00 - Publicado em 12 abr 2019, 07h00

A bolsa de apostas para a sucessão de Ricardo Vélez Rodríguez, o ministro da Educação desenganado pelo próprio presidente da República, produzia a cada instante um novo nome. Nenhum deles vingou, em razão de uma premissa equivocada — a de que a turma de Olavo de Carvalho, o guru da extrema direita, havia sido nocauteada depois da ascensão do tenente-brigadeiro Ricardo Machado, ungido ao posto de número 2 do MEC pela alta cúpula militar. Nos corredores, os olavetes bem que avisavam que tinham perdido um round mas não a luta. Eis que, por meio de um fiel escudeiro do guru, Filipe Martins, assessor especial para assuntos internacionais, chegou às mãos do presidente Jair Bolsonaro uma lista tríplice com nomes para ocupar o cargo: Eduardo Melo, ex-tenente da Marinha e atual diretor da TV Escola; Carlos Nadalim, atual secretário de Alfabetização; e o economista Abraham Weintraub, secretário executivo da Casa Civil, chefiada por Onyx Lorenzoni. No sábado 6, Weintraub foi o escolhido para comandar o feudo que, até aqui, vem produzindo uma mistura de ideologia, desgoverno e paralisia em doses constrangedoramente excessivas.

O novo responsável por um orçamento de 122 bilhões de reais tomou posse na terça-feira 9, no Palácio do Planalto. Weintraub enfatizou que quer “pacificar” o ministério — este, aliás, verbo muito usado para referir-se à necessidade de trégua em uma pasta fatiada entre várias correntes. Em discurso de cinco minutos, achou necessário declarar: “Não sou uma pessoa radical”. De educação, nada falou. Às 17h30, seguiu para o auditório do MEC para receber o cargo de Vélez. Quando a palavra foi dada ao ex-ministro, ele se estendeu por meia hora em uma calorosa defesa da sua conturbada gestão. “Está tudo funcionando muito bem”, disse, para, em ato atípico, pedir o apoio das massas na plateia. Aos funcionários, perguntou: “Alguém está vendo baderna por aqui? Não, né?”. Arrancou aplausos. Weintraub manteve um ar discretamente contrariado.

O EX - Vélez saiu com discurso triunfal: “O ministério está funcionando muito bem” (Amanda Perobelli/Reuters)

Aos 47 anos, paulista, casado e pai de dois filhos, Weintraub passou de completo desconhecido dos brasileiros à condição de ministro mais pesquisado no Google — oito vezes mais que o até então campeão Sergio Moro, da Justiça. Na corte bolsonarista, Weintraub (pronuncia-se o w como v) circula desde 2017, quando Lorenzoni esbarrou com ele e o irmão Arthur, de 42 anos, hoje assessor especial da Presidência, em um seminário no Congresso. Entusiasmado com a conversa, Weintraub arranjou um encontro com o deputado Bolsonaro, em Brasília. Era para ser coisa rápida, mas acabou durando duas horas. E os irmãos Weintraub entraram no barco de JB, como o novo ministro costuma se referir ao chefe. Especializados em Previdência, miravam a economia. A área, porém, foi ocupada por Paulo Guedes, que desaprovou as ideias da dupla. Aí foi cada Weintraub para um canto do governo. A subida do primogênito ao MEC deixou em Lorenzoni o sabor da vitória. “Ele sempre quis fincar os pés lá”, diz uma testemunha das artimanhas de Lorenzoni.

Profundo conhecedor do olavismo, Weintraub recebeu rasgados elogios do guru. “Vélez era pseudo-olavete. Weintraub é olavete para valer”, comparou Olavo de Carvalho em uma entrevista. Em dezembro de 2018, foi a vez de o agora ministro sair em defesa aberta das teorias de Olavo na Cúpula Conservadora das Américas, em Foz do Iguaçu. Eduardo Bolsonaro estava lá e, àquela altura, o economista e o Zero Três já tinham laço estreito. Adaptando os ensinamentos olavistas à política, Weintraub disse então: “Dá para ganhar deles (comunistas)”. E prosseguiu: “Quando ele (um comunista) chegar para você com o papo nhoim­­- nhoim, xinga”. Weintraub ainda expôs uma estratégia que usava como professor universitário. No fim da lição, mostrava imagens de Fidel Castro, seu “garoto-propaganda”. “Playboy gosta de roupa de grife. (…) Fidel usa Lacoste, Puma, Adidas.” Essas e outras afirmações do homem que diz que não é radical acenderam entre especialistas o medo de uma reprise da novela Vélez, com novo colorido. “A educação deve ser prioridade. Não dá para cometer os mesmos erros”, alertou Priscila Cruz, presidente da ONG Todos pela Educação, no lançamento de uma frente parlamentar no Congresso Nacional para tentar destravar pautas adiadas pela inação do MEC.

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O MENTOR - Olavo de Carvalho comemorou: “Weintraub é olavete para valer” (//Reprodução)

O único elo de Weintraub com sua nova pasta é a carreira de cinco anos como professor de economia na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), da qual se licenciou para integrar o time da transição do governo. Antes disso, ele trabalhou quase duas décadas no Banco Votorantim. Escalou de office-boy a economista-chefe e diretor. “É uma pessoa incisiva, de ideias muito claras sobre o que quer. Não teme a polêmica e tem alta capacidade de gestão”, define um ex-colega de banco. Em uma troca de poder no grupo, Weintraub foi demitido, conseguiu emprego em uma corretora, depois se bandeou para a academia. Sobre as universidades federais, apresenta ideias muito próprias. “Ele costuma dizer: quando o governo dá dinheiro a essas instituições, está alimentando a esquerda do PT, do PCdoB”, conta um colega de Esplanada. Suas declarações causaram espanto ao deputado estadual petista Paulo Fiorilo, que em 2016 recebeu 3 000 reais de Weintraub para sua campanha. “Fiquei surpreso quando ele disse que só vota no PT quem não sabe ler nem escrever”, diz Fiorilo. Afinal, se quem vota é analfabeto, quem dá dinheiro, então, seria o quê?

PARALISIA - Sala de aula: o governo Bolsonaro completou 100 dias sem nenhum horizonte de avanço no ensino (Cristiano Mariz/VEJA)

Na Unifesp, Weintraub meteu-se em vários embates de cunho ideológico. Escreveu em 2017 uma nota com o irmão em resposta ao repúdio do Centro Acadêmico ao vínculo dos dois com Bolsonaro. Os alunos de economia “puxam a média do câmpus para baixo” e “esperam ansiosamente pela ditadura do proletariado”, dispararam. Nas redes sociais, uma estudante a quem ele decidiu processar tratou de revolver um episódio do qual o ministro não gosta de falar: em 2011, os irmãos entraram com uma ação na Justiça contra o próprio pai, o psiquiatra Mauro Salomão Weintraub, alegando que ele havia doado todos os bens à segunda mulher, vinte anos mais jovem. A dupla pede que a doação seja anulada porque o patriarca não reservou a eles os 50% determinados por lei. O psiquiatra cita má-fé por parte de Arthur e Abraham e garante que já deu o quinhão do patrimônio que lhes cabe. A VEJA, foi categórico: “Não vou falar sobre esse assunto”. O advogado dos filhos também não quis se pronunciar. No processo contra a estudante, o hoje ministro deu o seu lado: disse que a ação, na verdade, tinha o propósito de proteger o pai.

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Nas primeiras horas à frente do MEC, Weintraub demitiu secretários de Vélez (o único que ficou foi o olavete Nadalim, da Alfabetização) e ocupou rapidamente cadeiras que estavam vazias. Em uma conversa vazada, deixou escapar que quer um levantamento do “perfil” dos colaboradores atuais e demitidos ligados a Olavo de Carvalho. O saldo até agora chama atenção por duas razões: 1) o novo secretariado tem predominantemente formação em economia e administração de empresas; e 2) o brigadeiro Ricardo Machado foi removido do cargo de número 2, um baque para a ala militar, que cantara vitória dias antes. Entre seus componentes, o combinado é recuar por ora, para esperar a poeira baixar. E a educação, hein?

Com reportagem de João Batista Jr.

Publicado em VEJA de 17 de abril de 2019, edição nº 2630

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