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Lava Jato poupou donos da Odebrecht de medidas duras para fechar delação

Segundo mensagens obtidas pelo The Intercept, procuradores cogitaram obrigar donos da empreiteira a vender ações, mas descartaram ideia com negociações

Por Da Redação 22 set 2019, 09h27

Diálogos obtidos pelo site The Intercept Brasil e analisados e publicados neste domingo, 22, pelo jornal Folha de S.Paulo apontam que os procuradores da Lava Jato pouparam a Odebrecth e seus principais executivos de medidas mais duras cogitadas durante as negociações do acordo de delação da empresa que colaborou com as investigações a partir de 2016.

De acordo com as mensagens, os procuradores pensaram até em obrigar os donos da empreiteira a vender suas ações para que se afastassem completamente dos negócios após a delação.

Mas o grupo desistiu da ideia com o andar das negociações. A ideia era não inviabilizar o acordo com a Odebrecht.

Os investigadores também discutiram a possibilidade de impedir a empreiteira de pagar os advogados dos delatores e se responsabilizar pelas multas impostas aos executivos, com o objetivo de evitar que eles mantivessem o valor acumulado com os atos de corrupção.

As mensagens também mostram que a cúpula da Odebrecht tinha um envolvimento muito maior com o esquema de lavagem de dinheiro criado pela empresa para pagar propina a políticos e funcionários públicos do que sugerem os documentos divulgados até agora.

Os procuradores calcularam que Emílio Odebrecht, seu filho Marcelo e outros 16 executivos receberam 167 milhões de dólares em contas secretas no exterior em um período de dez anos. O valor equivale a quase metade do total dos pagamentos ilegais feitos pela empreiteira a políticos entre 2001 e 2016. Segundo o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, que participou das negociações, o total é estimado em 349 milhões de dólares.

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Os diálogos vazados mostram que a Lava Jato conhecia muito sobre os crimes praticados pela cúpula da Odebrecht, por exemplo, a existência do Setor de Operações Estruturadas, departamento criado para movimentar dinheiro sujo no Brasil e no exterior.

O procurador suíço Stefan Lenz informou aos procuradores brasileiros que Emílio Odebrecht e outros executivos sabiam do esquema e recebiam pagamentos fora do país ilegalmente. Em abril de 2016, ele afirmou a Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa em Curitiba que “Emílio e a maioria dos diretores têm contas na Suíça e estão com suas contas diretamente envolvidas no esquema ilegal. Então, por favor, não facilitem muito para eles”.

Em novembro, quando as penas começaram a ser discutidas, Emílio declarou ter recebido 172 milhões de reais no Brasil e outros 148 milhões de reais na Suíça desde 2006 e que tinha um saldo de 9 milhões de dólares em suas contas no exterior. Ele aceitou pagar multa de 40% dos rendimentos que recebeu ilegalmente, mas queria abater 42 milhões de reais que recolheu em impostos. Com isso, Emílio tinha legalizado algo em torno de 280 milhões de reais, valor maior do que o recebido do Setor de Operações Estruturadas.

Ainda assim, o empresário se dispôs a devolver apenas 300 mil dólares, para atender às condições negociadas pela Odebrecht com a Lava Jato.

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O procurador Júlio Noronha falou sobre o assunto no grupo do Telegram: “Vejam que piada o cálculo de multa e do perdimento do Emílio”. A procuradora Laura Tessler completou: “Perdeu totalmente o senso do ridículo”.

Após duas semanas de negociações, Emílio aceitou pagar uma multa de 69 milhões de reais, sem abatimento de impostos.

O acordo da Odebrecht foi o maior negociado pela Lava Jato até hoje. Para poder voltar a fazer negócios com o setor público, a empresa concordou em pagar multa de 3,8 bilhões de reais, além de revelar crimes e fornecer provas. 77 executivos da empresa assinaram acordo de delação premiada para ter pena reduzida e outros benefícios.

A Odebrecht se comprometeu a indenizar os ex-funcionários pela perda de bens confiscados durante as investigações e por danos causados à sua reputação, já que muitos não conseguiriam voltar ao mercado de trabalho após o escândalo.

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Segundo as mensagens, a medida foi essencial para garantir a colaboração dos executivos. Mas, em junho de 2016, Deltan e outros dois procuradores eram contra: “Executivos devem arcar, na minha opinião”, disse Dallagnol no Telegram. Ele chegou a defender que a empresa fosse punida com a rescisão do acordo se pagasse pelos executivos.

Mas outros procuradores avaliaram que o procedimento poderia inviabilizar o acordo e afastar os executivos das negociações. O procurador Marcelo Miller disse aos colegas: “O acordo, é assim no mundo, deve salvar empregos. Temos de ter muito cuidado com isso”. Antônio Carlos Welter afirmou que era preciso garantir punições aos que cometeram crimes: Ninguém quer quebrar a Odebrecht. Mas a pena tem que ser adequada e proporcional. Tá com peninha do MO, leva pra casa”, disse, se referindo a Marcelo Odebrecht.

De acordo com o jornal Folha de S.Paulo, os investigadores nunca procuraram a empresa para discutir a forma do pagamento das multas.

Outro lado

A força-tarefa da Lava Jato em Curitiba afirmou ter descartado a ideia de obrigar os controladores da Odebrecht a vender suas ações por falta de previsão legal para a medida e pelas dificuldades que teria para calcular o valor dos ativos vendê-los. O grupo também disse que não interferiu na decisão da Odebrecht de pagar as multas impostas aos executivos que se tornavam colaboradores.

A Odebrecht afirmou ter assegurado aos seus ex-funcionários “condições para que pudessem colaborar de forma voluntária, ampla, eficaz e contínua com as autoridades, permitindo a celebração dos acordos de leniência da empresa e contribuindo para o combate à corrupção no Brasil e em outros países. Não cabe à empresa comentar as tratativas e o teor final dos acordos de colaboração de pessoas físicas e de leniência da empresa, os quais foram devidamente homologados pela Justiça”.

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