O relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, afirmou nesta quarta-feira, 12, não ver riscos à operação com a divulgação de conversas entre o ex-juiz federal Sergio Moro (hoje ministro da Justiça) e o coordenador da força-tarefa Deltan Dallagnol.
“A Lava Jato é uma realidade. Não acredito que essa realidade venha a ser afastada por qualquer circunstância conjuntural”, disse Fachin ao chegar à corte, pouco antes do início da sessão plenária da tarde desta quarta.
“A operação trouxe um novo padrão normativo, jurídico e também de natureza ética ao Brasil e à administração pública. Tenho confiança plena de que isso não é suscetível de qualquer retrocesso”, concluiu o ministro na primeira vez em que se manifesta publicamente sobre o tema.
As mensagens divulgadas no último domingo, 9, pelo site The Intercept Brasil, mostram que Moro e Deltan trocavam colaborações quando integravam a força-tarefa da Lava Jato. Os dois discutiam processos em andamento e comentavam pedidos feitos à Justiça pelo Ministério Público Federal.
Após a publicação das reportagens, a equipe de procuradores da operação divulgou nota chamando a revelação de mensagens de “ataque criminoso à Lava Jato”. Também em nota, Moro negou que haja no material revelado “qualquer anormalidade ou direcionamento” da sua atuação como juiz.
A Polícia Federal tem ao menos quatro investigações abertas para apurar ataques de hackers em celulares de pessoas ligadas à Lava Jato, em Brasília, São Paulo, Curitiba e Rio de Janeiro. Uma das suspeitas é a de que os invasores tenham conseguido acesso direto a aplicativos de mensagens dos alvos, sem precisar instalar programas para espionagem.
O pacote de diálogos que veio à tona inclui mensagens privadas e de grupos da força-tarefa no aplicativo Telegram de 2015 a 2018.
Segundo as mensagens, Moro sugeriu ao Ministério Público Federal trocar a ordem de fases da Lava Jato, cobrou a realização de novas operações, deu conselhos e pistas e antecipou ao menos uma decisão judicial.
Nas conversas privadas, membros da operação fazem referências a casos como o processo que culminou com a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por causa do tríplex de Guarujá (SP), no qual o petista é acusado de receber R$ 3,7 milhões de propina da empreiteira OAS em decorrência de contratos da empresa com a Petrobras.
Preso em decorrência da sentença de Moro, Lula foi impedido de concorrer à Presidência na eleição do ano passado. A sentença de Moro foi confirmada em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e depois chancelada também pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Suspeição
No próximo dia 25, a Segunda Turma do STF — colegiado que Fachin integra — deve julgar um habeas corpus de Lula, em que o petista acusa Moro de agir com parcialidade ao condená-lo no caso do tríplex do Guarujá e depois assumir cargo no primeiro escalão do governo de Jair Bolsonaro (PSL).
Em dezembro do ano passado, quando o caso começou a ser discutido pela Segunda Turma, Fachin e a ministra Cármen Lúcia rejeitaram o pedido do petista. Apesar de frustrar a defesa de Lula, Fachin fez uma observação ao final do voto: “Cumpre consignar que ninguém está acima da lei, especialmente da Constituição: nem administradores, nem parlamentares, nem mesmo juízes. Procedimentos heterodoxos para atingir finalidade, ainda que legítima, não devem ser beneplacitados”.
A discussão foi interrompida por pedido de vista (mais tempo para análise) de Gilmar Mendes, que deve liberar o processo para julgamento nos próximos dias.
Gilmar e o ministro Ricardo Lewandowski ainda não votaram no habeas corpus em que Lula tenta derrubar os atos de Moro no caso do tríplex.
Também falta se posicionar o quinto membro do colegiado, o decano do STF, ministro Celso de Mello, que deve ser crucial para a definição do placar.
Chefe
Sem citar nomes, o ministro Gilmar Mendes disse na terça-feira 11 que “juiz não pode ser chefe de força-tarefa”, ao criticar métodos da Lava Jato. Segundo ele, o Supremo não é um tribunal “destinado a condenar, nesse modelo em que juiz chefia procurador”. “Não é o caso desta Corte. Juiz não pode ser chefe de força-tarefa”, afirmou Gilmar durante sessão da Segunda Turma.
O ministro Marco Aurélio Mello também comentou o episódio envolvendo Moro. “Coitado do juiz Moro. O presidente (Jair Bolsonaro) o colocou numa sabatina permanente quando anunciou que houvera um acordo para ele deixar uma cadeira efetiva (de juiz) para vir para a Esplanada, colocando-o na vitrine. E aí, (em) quem está na vitrine, o estilingue funciona”, disse Marco Aurélio na terça.
“Se admitiria um diálogo com os advogados da defesa? Não. Por melhor que seja o objetivo, não se pode admitir com o Ministério Público”, completou.