Interlocutores do Exército afirmam que, ao menos a curto prazo, não haverá nenhuma punição ao capitão Osmar Crivelatti, assessor de Jair Bolsonaro durante e após o mandato na Presidência. O militar foi indiciado pela Polícia Federal no último dia 5 pelos crimes de associação criminosa e lavagem de dinheiro no caso que investiga o desvio de joias e presentes recebidos pelo então presidente. Crivelatti era subordinado ao tenente-coronel Mauro Cid na ajudância de ordens.
Conforme interlocutores da força, apesar do indiciamento da PF, a situação jurídica do militar ainda não está definida e ele sequer está sub judice – o próximo passo é o Ministério Público se posicionar sobre o pedido e decidir se denuncia ou não o ex-auxiliar de Bolsonaro. Por isso, avaliam, seria prematuro impor qualquer restrição a ele.
A cautela é a mesma adotada em relação a outros militares, a exemplo do próprio Mauro Cid, que está afastado por ordem do ministro Alexandre de Moraes, e não por decisão própria do Exército.
A diferença é que Crivelatti foi promovido pelo Exército mesmo após o início das investigações do caso. Já Cid, que firmou um acordo de delação e chegou a admitir ilegalidades, como a fraude no cartão de vacina, teve a ascensão vetada pela força. Além disso, dentro do Exército, há um clima de desapontamento com Cid, antes tratado como um “garoto prodígio”, conforme definiu um graduado general, mas que se revelou com um comportamento que rompe completamente as regras militares.
Oficialmente, Crivelatti segue sendo assessor do ex-presidente, mas, por uma decisão expedida por Moraes em agosto do ano passado, está impedido de se comunicar com Bolsonaro. Dessa maneira, o capitão não está exercendo nenhum ofício até que Moraes libere o contato entre os dois ou então o ex-presidente o exonere da função, abrindo caminho para que ele cumpra outras funções dentro da força.
Qual a atuação de Crivelatti?
Osmar Crivelatti acompanhou Bolsonaro em sua temporada nos Estados Unidos após a derrota nas eleições. Ele é tratado como peça-chave pela PF por ter acompanhado de perto tanto a retirada das joias do acervo presidencial, ainda durante o mandato, quanto o processo de resgate dos itens colocados à venda.
Segundo os investigadores, o militar fazia parte de um esquema comandado pelo ex-presidente e seus assessores para desviar itens do acervo presidencial. Foi Crivelatti, por exemplo, quem recebeu o kit composto por um relógio e joias da marca Chopard recuperado por Mauro Cid após ser exposto em um leilão.
Além disso, Cid afirmou que repassou em mãos a Crivelatti o valor de 20 mil dólares para serem entregues a Bolsonaro após a venda de itens do acervo presidencial.
Em depoimento, Osmar Crivelatti negou a versão de que integrava uma organização criminosa, disse que nunca vendeu os presentes direcionados ao presidente e que somente soube das negociações envolvendo os itens em fevereiro de 2023, quando teve início a operação para resgatar os itens e foi acionado por Cid para ajudar no processo. Foi Crivelatti, por exemplo, quem levou à sede do PL, partido de Bolsonaro, um kit composto por um Rolex e outros bens valiosos que, por ordem do Tribunal de Contas da União, tiveram de ser devolvidos.
Entrega de ‘envelopes’ a Bolsonaro
Aos investigadores, o capitão também deu detalhes de quando entregou “envelopes” ao ex-presidente, após orientação de Cid. Ele contou que, no final de fevereiro de 2023 – ou seja, quando o grupo já corria para recuperar os itens vendidos -, recebeu um envelope que envolvia um “volume” dentro, mas não sabia dizer do que se tratava.
A operação foi repetida em março, quando Bolsonaro e seus assessores ainda estavam nos Estados Unidos. Crivelatti garantiu que em todas elas repassou o material ao ex-presidente.
Aos investigadores, tanto Mauro Cid quanto o seu pai, o general Mauro Lourena Cid, admitiram que colocaram o dinheiro fruto da venda das joias nos envelopes para serem entregues de maneira fracionada a Bolsonaro. O general, inclusive, disse que avisava Crivelatti “que se tratava de parte dos valores” que pertenciam ao ex-presidente.
Mentira para proteger o ex-presidente
Aos investigadores, Crivelatti também admitiu ter mentido em um depoimento prestado anteriormente sobre a retirada de kits e presentes do acervo presidencial. Antes, ele havia dito que os itens estavam guardados em uma fazenda do ex-piloto Nelson Piquet – numa versão alinhada ao entorno de Bolsonaro.
No segundo depoimento, o militar admitiu que a retirada se deu ainda enquanto Bolsonaro ocupava a Presidência. Ele disse ter mentido sobre os fatos por acreditar que não haveria maiores desdobramentos na investigação e porque sabia que outro ex-auxiliar, o coronel Marcelo Câmara, havia dito o mesmo.
A defesa de Crivelatti acrescentou que, à época do fato, ele estava sendo acompanhado por uma advogada indicada pela equipe que atua na defesa de Bolsonaro.
O que diz Crivelatti?
Em nota divulgada na segunda-feira, 15, a defesa do capitão Crivelatti informou que ele ascendeu no Exército por seu próprio mérito e que acredita que será inocentado pelo Ministério Público. Confira a íntegra:
Diante das recentes matérias jornalísticas envolvendo o nome do Sr. Osmar Crivelatti, e da repercussão em sua imagem pessoal e profissional, a defesa técnica constituída vem esclarecer que o Sr. Osmar Crivelatti é capitão do Exército Brasileiro com mais de trinta e três anos de serviços prestados à instituição e ao Brasil. Ocupou os principais cargos e funções de sua carreira com esforço e dedicação, sempre por seu próprio mérito, sendo promovido segundo as normas de seleção do Exército Brasileiro. Desde que o Sr. Osmar Crivelatti se tornou investigado na PET 11.645, colocou-se inteiramente à disposição da autoridade policial para prestar todos os esclarecimentos necessários e jamais se recusou a responder qualquer questionamento feito pela Autoridade Policial e, quando indagado, tratou de restabelecer a verdade dos fatos na primeira oportunidade. A defesa tem plena confiança que o Ministério Público, por meio da análise acurada dos elementos informativos reunidos ao longo das investigações, também concluirá que o Sr. Osmar Crivelatti não cometeu nenhum dos crimes pelos quais foi indiciado.