‘Afronta ideológica’ do governo impede diálogo, diz deputado evangélico
Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) citou pautas progressistas, como aborto e linguagem neutra, como obstáculos para aproximação com o Planalto
O deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) participou da edição desta sexta-feira da live de Os Três Poderes, programa de VEJA com análises sobre os principais fatos da semana. O parlamentar, aliado e do mesmo partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, faz parte da bancada evangélica, bloco conservador que reúne dezenas de membros, e falou da dificuldade de aproximação com o governo Lula.
Perguntado sobre a relação de Lula com os evangélicos e sobre como avalia os primeiros passos do governo, Cavalcante lembrou que o presidente teve apoio maciço do segmento no primeiro mandato, mas que “um conjunto de políticas que afrontavam os valores cristãos” a partir do segundo mandato iniciou esse afastamento. O deputado citou “resoluções do Ministério da Saúde” que possibilitaram o aborto, a legalização de casamento de pessoas do mesmo sexo e a utilização de linguagem neutra como alguns dos motivos. “Isso começou a nos chocar. Isso foi distanciando o segmento por questões ideológicas”, afirmou.
Sóstenes também citou os casos de corrupção descobertos durante os governos petistas como razão para o distanciamento dos evangélicos. Para ele, Lula e o PT nunca assumiram seus erros nem pediram perdão, o que poderia ajudar em uma reaproximação. “Quando não se pede perdão, a gente não dá perdão. Temos um governo que afrontou valores quando esteve no Executivo, se envolveu com corrupção e não reconhece esse envolvimento”, ressaltou o deputado. “A conduta de dia a dia do governo é uma conduta de afronta. O governo vai ter que fazer uma autocrítica e autoavaliação se eles querem o segmento por perto. Vão ter que corrigir muita coisa”, completou.
O parlamentar também falou do crescimento das igrejas no país e disse que isso se deve a “uma forte metodologia de evangelização do segmento”, que começou nos anos 2000. “Estimávamos que em 2025 o país se tornaria maioria evangélica. Mas acredito que só vamos conseguir inverter a pirâmide religiosa e passar a ser maioria em 2035”, ponderou. “A igreja tem feito esse trabalho (social) com muita eficiência”, acrescentou. Segundo ele, a “influência política” do grupo “é uma coisa natural e sociológica, que faz parte de todos os países do mundo”.
Questionado se deveria haver uma autocrítica do segmento devido à aproximação com o governo Bolsonaro e possíveis campanhas dentro de templos, o deputado afirmou que isso nunca ocorreu. “O que existe é um trabalho de conscientização política. Isso fizemos e faremos sempre”, disse. O deputado também salientou que a igreja nunca fez “vista grossa para erros” de Bolsonaro.
Cavalcante também disse defender o “aprimoramento do sistema eleitoral” e que sempre votará a favor do “voto impresso auditável”. Ressaltou que não há racha na bancada evangélica por causa da votação da reforma tributária, na qual alguns deputados votaram a favor e outros, contra. “Sempre defendemos a reforma, mas jamais foi feito acordo para votarmos favorável”, revelou. “A bancada está reunida e o papel dos evangélicos é lutar por valores e não questões econômicas”, completou.
Beneficiadas no recente projeto de reforma tributária aprovado na Câmara, as igrejas evangélicas tiveram, nos últimos anos, um salto do número de templos no país. Conforme mostra a capa de VEJA desta semana, um levantamento minucioso e inédito comprova que a proliferação dos locais de culto da corrente religiosa quase dobrou em uma década, passando de 54 mil para mais de 100 mil. Junto com esse aumento, sobe também a influência política do grupo, que tem uma bancada parlamentar cada vez maior.
O programa Os Três Poderes é apresentado pelo editor José Benedito, com comentários de Clarissa Oliveira, Robson Bonin e Matheus Leitão. Assista abaixo: