Integrante da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), Ceres Hadich criticou o governo do presidente Lula pela falta de empenho no processo de reforma agrária – uma bandeira histórica da entidade. Em entrevista a VEJA, ela classifica a relação do MST com o Palácio do Planalto como de “muito diálogo e poucas respostas”. “Nossa pauta não avançou. Avaliamos que tem faltado empenho do governo para avançar, concreta e massivamente, o que deixa nossa base insatisfeita”, afirma. A crítica vem no momento em que o MST intensifica o número de invasões a propriedades como forma de pressionar o governo.
As relações com o governo Lula estão abaladas? Apoiamos o governo Lula. No entanto, avaliamos que tem faltado empenho do governo para avançar, concreta e massivamente, na pauta da reforma agrária, o que deixa nossa base insatisfeita. Muitas famílias estão há mais de quinze anos acampadas e têm a expectativa de que vão conquistar a terra sob o governo Lula. Também há um passivo imenso em relação à retomada de políticas públicas para as famílias assentadas, e isso gera um nível de tensionamento bastante grande, porque já estamos no segundo ano de governo. Nossa pauta não avançou. Ao longo de todo ano passado, inclusive na jornada de lutas de abril, apresentamos ao governo, que se comprometeu a avançar, mas não teve nada de concreto.
Há outras insatisfações? O governo não apresentou ainda um plano emergencial para resolver os problemas das famílias assentadas e acampadas e resolver os passivos acumulados nos últimos anos em relação à ausência de políticas para a reforma agrária. Não deu uma sinalização para as famílias que fizeram as ocupações. Assim, a luta das famílias acampadas, inclusive as ocupações, tendem a aumentar. É preciso que o governo garanta o orçamento necessário para que o Incra faça as vistorias e inicie os processos de desapropriação de terras. O programa apresentado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário tem diversas medidas, mas o governo não garantiu o orçamento para implementar.
As invasões não acabam dificultando o avanço da reforma agrária? Há 28 anos, fazemos jornadas de lutas em memória a 21 trabalhadores assassinados no massacre de Eldorado dos Carajás e para defender a reforma agrária, apresentando nosso projeto para a sociedade e cobrando nossas reivindicações dos governos. Nos últimos 10 anos, a reforma agrária está paralisada e existe uma demanda das famílias, que se expressam com as ocupações de terra, realizadas para pressionar as instituições, incluindo o governo federal, a atender as necessidades das famílias. As jornadas de luta e ocupações de terra são parte da natureza e da cultura política do MST, é a forma de organizar o povo e expressar, para governo e sociedade, as demandas da reforma agrária. É uma forma de pressão social.