O ministro Vélez Rodríguez, da Educação, anda a perigo. O próprio presidente Jair Bolsonaro, em entrevista à Band há duas semanas, admitiu que as coisas não estão andando no MEC. E parece que o ministro deseja cair atirando: em entrevista ao jornal Valor Econômico, anunciou que pretende promover uma revisão progressiva dos livros didáticos, para fazer valer a visão que ele considera mais apropriada do golpe de 1964 e da ditadura que dele emergiu. E a tal visão correta, claro, é que não houve golpe nem ditadura.
VEJA havia revelado em reportagem na semana passada que alunos ficarão ao menos mais um ano com a bibliografia desatualizada porque um grupo de avaliadores do MEC está caçando textos com “ideologias contrárias às do governo” nos livros do segundo ciclo do ensino fundamental. Na entrevista, Vélez demonstrou outra vez que a sua pasta está mais compromissada com a propaganda ideológica do que com a qualidade do ensino no Brasil. O ministro lançou mão de uma malandragem retórica para dizer que, para ser salvo do totalitarismo, o país passou, a partir de 1964, por “um regime democrático de força”. A expressão é um oximoro, uma contradição em termos. E é também um eufemismo para o termo correto: ditadura.
Vélez ainda é visto no Palácio do Planalto como um problema. Bolsonaro só não o demitiu porque tal decisão aumentaria o clima de incerteza em meio à crise de articulação com o Congresso. Os poderes do ministro, no entanto, estão sendo paulatinamente retirados. Primeiro, os militares ganharam a queda de braço com alunos do falastrão Olavo de Carvalho e emplacaram como secretário executivo do MEC o tenente-brigadeiro Ricardo Machado Vieira. Na quinta-feira 4, mais dois assessores, ambos próximos ao ministro, foram demitidos. Perderam o emprego o assessor especial Bruno Garschagen, alinhado a Olavo, e a chefe de gabinete Josie de Jesus, depois de menos de um mês no cargo.
O material didático brasileiro tem, sim, problemas. Em 2008, VEJA examinou apostilas e 130 livros de história, geografia e português adotados por escolas privadas e encontrou informações distorcidas por questões ideológicas ou erros factuais em 75% deles. No ano anterior, 20 milhões de alunos haviam usado um livro de história reprovado pelo MEC que, entre outros absurdos, dizia que o ditador chinês Mao Tsé-tung fora um “grande estadista” que “amou inúmeras mulheres e por elas foi correspondido”. O que Vélez propõe, no entanto, é substituir aberrações de esquerda por aberrações de direita. Como pontuou o vice-presidente Hamilton Mourão há algumas semanas, “não se combate comunismo com comunismo de sinal contrário”.
Publicado em VEJA de 10 de abril de 2019, edição nº 2629
Qual a sua opinião sobre o tema desta reportagem? Se deseja ter seu comentário publicado na edição semanal de VEJA, escreva para veja@abril.com.br