Envolvido no enrosco da venda e recompra de joias ofertadas por chefes de Estado estrangeiros ao Brasil, o ex-presidente Jair Bolsonaro conta agora que um parecer da Comissão de Ética Pública da Presidência da República endosse a tese de que, na falta de uma legislação que deixe claro que bens devem ser incorporados ao acervo da União e quais podem ser levados como inventário privado do ex-mandatário, não haveria ilegalidade no fato de ele ter tomado para si os chamados kits ouro branco e rosé, formados, entre outras peças, por um Rolex cravejado de brilhantes, rosários árabes e abotoaduras.
Depois de a defesa de Bolsonaro anunciar que pretende questionar o Tribunal de Contas da União (TCU), órgão de fiscalização do Legislativo que exigiu a devolução das joias, o capitão quer anexar em sua defesa a tese de que, no vácuo legal, ele poderia ser acusado, no máximo, de infração administrativa por não ter registrado que levaria os pertences para o exterior, como exigem resoluções de governos anteriores, mas não de crime. A tese é de que, como não há lei que defina que tal atitude é um ilícito penal, a ele não poderia ser imputada, por exemplo, a suspeita de peculato.
Advogados ligados a Bolsonaro que acompanham o caso consideram que outra possibilidade aventada, a de peculato culposo – situação em que se apropria de um bem sem ter consciência de que se tratava de uma conduta ilícita –, é difícil de vingar no Judiciário porque do outro lado da mesa há a figura do ministro Alexandre de Moraes, algoz do capitão no Supremo Tribunal Federal (STF) e condutor das investigações sensíveis que miram o ex-presidente. Por esse raciocínio, complicaria a tese de ação culposa o fato de auxiliares terem atuado para reaver os bens, uma demonstração, segundo essa análise, de que eles sabiam que haviam praticado um ilícito.