Desde o início do maior desastre natural da história do Rio Grande do Sul, o presidente Lula já visitou três vezes o estado, com o objetivo de tomar pé do tamanho da tragédia, anunciar medidas de socorro à população e prestar solidariedade pessoalmente a desabrigados.
O presidente também tem tratado o caso como prioridade e convocado representantes dos poderes Legislativo e Judiciário a participarem dos esforços destinados a mitigar as consequências da devastação e acelerar a reconstrução da economia e da infraestrutura gaúchas.
Num governo descoordenado, ineficaz e desconectado da realidade, conforme crítica feita até por petistas ilustres, a ação inicial de Lula é uma tentativa de mostrar liderança e capacidade administrativa, ativos que andam em falta na Praça dos Três Poderes. É também um atestado de que o presidente apreendeu com os exemplos — maus exemplos — de outros governantes.
Negligência
A tragédia no Rio Grande do Sul permite a Lula fazer um contraponto com Jair Bolsonaro, que desdenhou da gravidade da pandemia de covid-19, responsável pela morte de mais de 700 000 pessoas no Brasil, e passeou de jet-ski em Santa Catarina enquanto a Bahia enfrentava uma situação de calamidade provocada pelas chuvas.
Bolsonaro foi o único mandatário brasileiro a não conseguir a reeleição desde a redemocratização, e alguns de seus auxiliares culpam justamente a postura dele na pandemia, marcada por negacionismo científico e falta de empatia, pelo fracasso nas urnas.
Também serve de lição a Lula a postura do então presidente dos Estados Unidos, George W Bush, que negligenciou a devastação provocada pelo furacão Katrina em Nova Orleans e demorou a tomar medidas, o que contribuiu para que a aprovação ao governo dele chegasse ao nível mais baixo até então registrado.
O estrago foi tamanho que Bush, na época, sentiu-se obrigado a se penitenciar em público: “O Katrina expôs sérios problemas na nossa capacidade de resposta, em todos os níveis de governo. E, na medida em que o governo federal não realizou completamente o seu trabalho, eu assumo a responsabilidade”.
Jogo aberto
Ciente dos precedentes dentro e fora do Brasil, Lula agiu rapidamente. É um bom começo, mas o desfecho da história dependerá de como a população avaliará o trabalho do presidente e do governo federal. “O desastre climático joga luz sobre quem está no poder, e esta atenção é potencialmente muito arriscada. Qualquer vacilo ou frase mal empregada terá efeitos cataclísmicos. Quem não lembra o ‘não sou coveiro’ de Bolsonaro”, diz Marcus André Melo, professor de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco.
“Lula e a primeira-dama Janja, em geral, não têm sido felizes, para sermos bem condescendentes, em suas manifestações. Houve aprendizado em relação a falas sobre Ucrânia e Israel? Só o tempo dirá o que vai acontecer”, acrescenta Melo.