Dez meses depois de abrir um procedimento disciplinar para apurar possíveis ilegalidades na decisão do subprocurador-geral da República Ronaldo Albo de conceder um desconto bilionário na multa que a J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, havia concordado em pagar em seu acordo de leniência, a Corregedoria do Ministério Público Federal chegou à fase de ouvir os servidores da 5ª Câmara do MP, responsável por casos de combate à corrupção. Foi lá que, por decisão de Albo, houve o abatimento dos valores da multa – de 10,3 bilhões de reais para 3,53 bilhões.
Em um momento em que o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), tem proferido despachos em série a favor dos mais notórios investigados na operação Lava-Jato, anulando, por exemplo, processos contra o empreiteiro Marcelo Odebrecht, o caso da J&F pode ser o último entre as maiores empresas alvo de investigações sobre corrupção a conseguir expressivos benefícios da justiça.
Embora a delação dos irmãos Batista e a leniência da J&F não tenham relação com o braço de Curitiba da Lava-Jato, Toffoli concedeu à holding acesso integral às mensagens hackeadas que retratam conversas entre o ex-procurador Deltan Dallagnol, outros investigadores e o ex-juiz Sergio Moro. Foi a partir dessas mensagens que o STF jogou por terra todos os processos contra o presidente Lula, habilitando-o a voltar ao jogo político. Foi também com base nesses diálogos que Toffoli suspendeu o pagamento da multa bilionária imposta à J&F na leniência.
Com o avanço do caso contra Ronaldo Albo, foram ouvidos, entre outros, os subprocuradores Alexandre Camanho e Eitel Santiago, que haviam rejeitado a hipótese de abatimento da multa, além do procurador da República no Distrito Federal Carlos Henrique Martins, contrário a qualquer diminuição das cifras a serem pagas e a quem o Conselho Institucional do MP havia conferido poderes para eventuais renegociações de valores a serem pagos na leniência.
Interlocutores ligados ao subprocurador Ronaldo Albo alegam que o desconto ocorreu porque os valores originais de 10,3 bilhões de reais haviam sido calculados com base em lucros também de outras empresas do grupo J&F que não tinham relação com pagamento de propinas. Em acordo de delação premiada, o diretor da JBS Ricardo Saud chegou a apontar mais de 1.000 políticos beneficiários por dinheiro ilegal.