Atiradores de airsoft são contra armamento da população
Em galpão da Zona Leste de São Paulo, jogadores ouvidos por VEJA acreditam que ampliar concessão de porte de armas não é solução para segurança pública
Vestidos para a guerra, cerca de vinte homens discutem planos para derrubar o adversário sob o som incessante de um tiroteio. O clima é de tensão no War Game Airsoft, um galpão na Vila Carrão, Zona Leste de São Paulo, onde o grupo se reúne toda semana para disputar uma partida de airsoft, jogo cujo objetivo é cruzar o campo, roubar a bandeira do time oponente e voltar à própria base sem ser atingido por balas de plástico — pouco maiores que a cabeça de um alfinete, mas capazes de causar hematomas pelo corpo.
Mais do que uma disputa de quem tem a melhor mira, trata-se de uma competição de estratégia. Sob olhar atento do ranger, monitor que atua como um juiz, cada passo é milimetricamente calculado para não colocar a equipe em risco.
Empunhando armas de airsoft — que são réplicas de fuzis de verdade, mas com a ponta vermelha — eles dizem, no entanto, ser contra o armamento da população como solução para a segurança pública do país, proposta que, vira e mexe, entra no debate entre os pré-candidatos à Presidência da República. Estrategistas, os jogadores de airsoft também criticam a falta de discussão sobre os planos de governo dos candidatos.
“O (Jair) Bolsonaro (PSL) pode até ter boas intenções e dizer que as armas protegem o homem de bem, mas, diante da legislação frouxa de nosso país, isso traria mais desvantagens do que benefícios”, explica o empresário Klauber Vogel, 36 anos.
O deputado federal é autor de um projeto de lei, em tramitação na Câmara, que facilitaria os trâmites para o porte de arma. Atualmente, de acordo com o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03), o civil que deseja ter o registro precisa fazer um requerimento à Polícia Federal, alegando exercício de atividade profissional, como no caso dos seguranças privados, ou riscos excessivos à integridade física, como pessoas que moram em áreas de risco.
Há diferença entre a posse e o porte de arma. A primeira consiste em manter o equipamento no interior de residência ou no local de trabalho. O porte, por sua vez, pressupõe que o objeto esteja fora destes locais, ou seja, em circulação com o cidadão. Caso a pessoa tenha o direito apenas à posse, é necessária uma autorização especial da PF para que seja feito o transporte do armamento.
Klauber sente falta de uma discussão efetiva entre os pré-candidatos com soluções para problema da segurança pública e diz não confiar em nenhum dos nomes que se colocaram na disputa. Porém, indica que em um eventual segundo turno não votaria em hipótese alguma em um candidato de esquerda. “O país regrediu sob as gestões tidas como progressistas. Até acredito que o Lula (PT), lá atrás, se elegeu e passou a seguir uma cartilha deixada por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), mas o desfecho foi trágico.”
Irmão de Klauber, Klaus Vogel já fez a sua escolha. “Não temos um candidato forte, que inspire confiança. O Bolsonaro, que desponta como líder das pesquisas, não tem nenhum plano de governo formado, e os outros, Ciro (Gomes, do PDT), Marina (Silva, da Rede), (Geraldo) Alckmin (PSDB), são mais do mesmo. Não há propostas eficientes, ideias construtivas, foco nos desenvolvimentos cultural e educativo do país”, critica. “Não há um candidato que me represente e, por isso, meu voto será nulo.”
Com relação ao armamento da população, ele acompanha a opinião do irmão. “Em um país plenamente desenvolvido, com um entendimento do que realmente uma arma significa, esta é, sim, uma proposta a ser pensada, já que trata-se de um símbolo de defesa”, aponta o empresário, de 38 anos, que trabalha com importações entre o Brasil e a China. “No Brasil, as armas com maior poder de fogo já estão nas mãos erradas”, diz. Ele afirma que um afrouxamento na lei de porte de arma agravaria o cenário. “Por isso, sou contra o armamento.”
O publicitário Rodolfo Araújo, 29 anos, endossa o coro. “Esse ímpeto pela arma existe, porque um lado tem a arma e comete delitos, então, a outra parte quer poder revidar”, diz ele. No entanto, em sua opinião, uma população mais armada traria problemas maiores. “Embora não seja o que mais acontece (em países onde a legislação para o porte é menos rígida), (aqui) as pessoas poderiam se matar sem muito critério todos os dias”, acrescenta.
Ele também ainda não encontrou um líder que tenha propostas que o convençam e diz que deve anular na eleição de outubro. “A Marina Silva não me transmite confiança para exercer um cargo como o de presidente. Suas propostas são rasas e não funcionariam”, diz. Tampouco Bolsonaro o agrada. De acordo com o jogador, as poucas citações sobre economia ou políticas sociais soam como falta de repertório. Além disso, o discurso radical do deputado também é alvo de críticas. “Não se pode pautar tudo na base da agressão. Afinal, virilidade não significa ofensa e desrespeito.”
O técnico de informática Fernando Quelopana, de 33 anos, não concorda. Ele afirma que pretende votar no deputado federal pelo PSL. “Na área da segurança, ele tem pulso firme, e isso está faltando hoje em dia”, opina. “Ele transparece honestidade. Não sei exatamente como é o jogo político, mas isso me chama a atenção.” Caso Bolsonaro não vá para o segundo turno, ele pretende anular o voto.
Sobre a proposta de ampliar o acesso ao porte de armas, ele tem ressalvas. “Acredito que o processo (para ter a concessão) já é bastante burocrático, demora cerca de um ano, mas o ideal é que a fiscalização seja efetiva”, diz ele, que possui o registro CAC (certificado para colecionadores, atiradores e caçadores, que exerçam atividades com PCEs — produtos controlados pelo Exército).
No entanto, ele diz que o debate sobre os planos de governo ainda está aquém do esperado. ”Eles não apresentam propostas interessantes para que possamos votar, uma agenda política que solucione, então, me parece que apostam em bater uns nos outros”, analisa.