Às vésperas de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começar o julgamento que deve decretar a inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro por oito anos, o ministro Alexandre de Moraes minimizava os riscos de fortes mobilizações e tumultos em torno da Justiça Eleitoral em Brasília. A certeza, disse, irônico, a interlocutores, estava baseada em um fato simples: “Todos estão presos”. Nêmesis do bolsonarismo desde que, ainda no início do governo do capitão barrou a posse do delegado Alexandre Ramagem para a diretoria-geral da Polícia Federal, Alexandre de Moraes, que presidirá na próxima quinta-feira, 22, a sessão de análise do caso que pode tirar Bolsonaro do jogo político, é peça central nos planos golpistas armazenados dentro do celular de Mauro Cid, revelados com exclusividade por VEJA na edição que chega neste fim de semana às bancas e plataformas digitais. Após a reportagem de VEJA, Moraes determinou à Polícia Federal que apurasse a origem do vazamento das informações.
Os documentos apreendidos pela PF mostram que, se dependesse unicamente do projeto golpista gestado na coxia do ex-presidente, o magistrado seria afastado do Supremo Tribunal Federal (STF), investigado, eventualmente julgado no Senado por crime de responsabilidade e, de quebra, banido do TSE. O antagonista do bolsonarismo serve de justificativa, nos documentos em posse de Cid, para que se planejasse de fato uma virada de mesa, com a anulação das eleições, a nomeação de um interventor e a revogação de decisões judiciais que os golpistas classificassem como “inconstitucionais”.
Ao discorrer sobre o que classificam como “ativismo judicial”, o documento com o passo a passo do golpe afirma que o país está diante de uma “desvirtuação da ordem constitucional pelos tribunais superiores” e lista exemplos de supostas ilegalidades cometidas por integrantes do TSE. A maior parte deles tem o presidente do TSE como pano de fundo. “Nestas eleições, o ministro Alexandre de Moraes nunca poderia ter presidido o TSE, uma vez que ele e Geraldo AIckmin possuem vínculos de longa data, como todos sabem”, diz. A escolha do presidente de um tribunal como o TSE, porém, segue um rodízio entre ministros do Supremo, não havendo óbice para que o magistrado assuma se um determinado político concorrer às eleições. O juiz, no entanto, deve se declarar suspeito se for amigo ou inimigo da parte a ser julgada e ficar impedido de atuar no processo se for parente de uma das partes ou se tiver atuado como advogado, acusador ou perito, por exemplo, no mesmo caso em outra instância.
Na ofensiva contra Alexandre, o plano para o golpe também elenca entre os pretensos abusos de Moraes e do Judiciário a decisão do tribunal de não abrir investigação após ex-ministros bolsonaristas terem alegado que rádios boicotavam propaganda eleitoral do ex-presidente na campanha e a determinar multa ao PL, partido de Bolsonaro, e outras legendas da coligação do ex-presidente por tentativa de tumultuar o processo eleitoral. Em dezembro passado, por ordem de Moraes, o PL foi multado em 22.991.544,60 de reais por litigância de má-fé depois de a legenda ser instada a apresentar e, segundo o TSE, não conseguir nenhum indício real que justificasse a abertura de uma verificação extraordinária em urnas eletrônicas utilizadas no segundo turno.
No acervo captado pela Polícia Federal, Alexandre de Moraes também é citado nominalmente pela esposa de Mauro Cid, Gabriela Cid. Em conversa com uma das filhas do general Villas-Boas, ex-comandante do Exército, Gabriela comenta a multa de mais de 22 milhões de reais imposta ao PL – bolsonaristas interpretaram como provocação o fato de o valor coincidir com o número do partido, 22 – e diz que caminhoneiros irão reagir à decisão promovendo paralisações. “Os caminhoneiros irão parar. Não há como eles concordarem com essa multa imposta por Alexandre de Moraes e não fazerem nada pelos companheiros. O STF, TSE é corporativista. Todos se unem. Está na hora do Brasil se unir pelo Brasil”, afirmou.