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‘Adiós, compañeros’

Acusados de sequestros, assassinatos e ligações com grupos terroristas receberam o status de refugiados no governo Lula. Moro vai devolvê-los a seus países

Por Hugo Marques Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 17 jul 2019, 16h55 - Publicado em 7 jun 2019, 07h00

Jair Bolsonaro assumiu o mandato de presidente da República com a promessa de combater o comunismo, devidamente registrada no mantra “nossa bandeira jamais será vermelha”. Logo nos seus primeiros dias no Palácio do Planalto, ele comemorou a extradição do terrorista italiano Cesare Battisti, que vivia em liberdade no Brasil graças, entre outras coisas, ao status de refugiado político que recebeu do governo do então presidente Lula (veja o quadro). “Finalmente a justiça será feita ao assassino italiano e companheiro de ideais de um dos governos mais corruptos que já existiram no mundo (PT)”, escreveu Bolsonaro numa rede social. “Ciao, Battisti. A esquerda chora”, acrescentou o deputado Eduardo Bolsonaro, o filho Zero Três do presidente. A extradição agradou às hostes bolsonaristas e estimulou o governo a programar novos expurgos de refugiados que receberam guarida na gestão petista e são associados a movimentos terroristas.

AJUDA – Martí (de óculos): status dado pelo PT livrou o sequestrador da Justiça (//.)

Em março, Bolsonaro prometeu ao presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, cancelar o status de refugiado de três paraguaios acusados de sequestro. Tal fatura está prestes a ser liquidada. No último dia 27, o coordenador-­geral do Comitê Nacional para Refugiados (Conare), Bernardo Laferté, defendeu em nota técnica a suspensão do refúgio de Juan Arrom, Anuncio Martí e Victor Cólman, que havia sido garantido a eles em 2003, no primeiro ano de mandato de Lula. O trio é acusado pelo governo paraguaio de integrar o grupo guerrilheiro Exército do Povo Paraguaio (EPP), de extrema esquerda, e de participar do sequestro, em 2001, de Maria Edith de Debernardi, nora de um ex-ministro e mulher de um dos empresários mais ricos do país vizinho. Acossados pela Justiça de lá, os três pediram refúgio ao governo brasileiro, sob a alegação de que sofreram perseguição política e foram torturados. A argumentação convenceu o governo Lula, que apontou para a existência de graves violações aos direitos humanos no caso. Desde então, diferentes presidentes paraguaios tentaram a extradição. Abdo Benítez, um ex-paraquedista do Exército, exatamente como Bolsonaro, está perto de alcançar esse objetivo.

É ardiloso sustentar tese de que haveria perseguição injusta baseado no perfil político dos interessados.”

Parecer do Ministério da Justiça
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No pedido apresentado ao Conare, o governo paraguaio lista o que considera serem provas da participação do trio no crime. As cédulas entregues aos sequestradores como pagamento pelo resgate foram previamente fotografadas pela polícia. Depois, parte delas foi encontrada com Juan Arrom e com Victor Cólman. Além disso, Anuncio Martí teria sido reconhecido pela vítima como um dos guardas do cativeiro. Ele seria o “guarda mau”, segundo definição da própria sequestrada. Indicado para o cargo de coordenador-geral do Conare em novembro de 2017, ainda no governo de Michel Temer, Laferté diz que não há razão para a manutenção do refúgio. “Parece-nos estar diante de uma situação onde não mais a proteção internacional, conferida por intermédio do instituto do refúgio, se faz presente, tendo em vista a atual ausência de fundado temor de perseguição.” Em sua nota técnica, ele também destaca que, conforme relato do Itamaraty, o Paraguai vive um período de estabilidade política, e o presidente Abdo Benítez tem agido sem revanchismos.

Vinculado ao Ministério da Justiça, comandado pelo ex-juiz Sergio Moro, o Conare deve julgar o caso no próximo dia 14. Se a posição de Laferté prevalecer, estará pavimentado o caminho para a extradição. Desde que receberam o status de refugiados, Juan Arrom, Anuncio Martí e Victor Cólman são monitorados pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e pela Polícia Federal. Martí mora em Dourados (MS), Arrom em Curitiba (PR) e Cólman em Almirante Tamandaré (PR). A VEJA, a advogada Caroline Godoi, que representa o trio, negou o envolvimento de seus clientes no sequestro e a participação deles em grupos terroristas de esquerda. No último dia 28 de maio, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, rejeitou recurso apresentado com o objetivo de impedir qualquer ordem de prisão decorrente de mandado ou pedido de extradição emitido pelo governo do Paraguai, bem como a suspensão de todo procedimento que vise à cessação ou perda da condição de refugiado. O governo também está analisando a revisão do status de outro terrorista famoso. O colombiano Francisco Antonio Cadena Collazos, conhecido como Padre Olivério Medina, mora no Brasil desde 2005. Ele se autointitulava porta-voz das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), organização paramilitar de inspiração comunista, notória pelos crimes em série, como sequestro e assassinato, recentemente dissolvida por acordo de paz. Investigações das autoridades colombianas revelaram que Medina contava com uma rede de proteção e financiamento que incluía vários petistas, alguns ocupando postos importantes no governo Lula. Em 2002, oficiais da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) produziram um relatório em que informavam que Medina, em uma reunião, teria prometido doar 5 milhões de dólares à campanha do candidato do PT. Não se sabe até hoje se o dinheiro efetivamente foi entregue.

CLANDESTINIDADE – Olivério Medina, em mensagens para as Farc e a militância no Brasil: “discrição” (Luis Acosta/AFP/.)

Devo agir com cautela para não dar ao inimigo argumentos que levem ao questionamento do refúgio. Manterei a discrição até a neutralização. Uma vez obtido, terei um passaporte brasileiro e a primeira coisa que quero fazer é ir vê-los.”

Mensagem enviada por Olivério Medina, encontrada no computador de um líder das Farc morto em 2007

As autoridades colombianas sempre suspeitaram que a presença de Medina no Brasil envolvia a negociação de armas para a guerrilha. Apesar de tudo, em 2006, Lula concedeu refúgio ao terrorista. Protegido pelo Estado brasileiro, o padre continuou sua militância clandestina. Em uma troca de mensagens com um dos líderes das Farc, em 2007, escreveu: “Devo agir com cautela para não dar ao inimigo argumentos que levem ao questionamento do refúgio”. E acrescentou: “Manterei essa discrição até a neutralização. Uma vez obtido, terei um passaporte brasileiro e a primeira coisa que quero fazer é ir vê-­los”. A revisão do refúgio do guerrilheiro será feita por iniciativa do governo. De fato, acabou a moleza para os compañeros.

Colaborou Laryssa Borges

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Publicado em VEJA de 12 de junho de 2019, edição nº 2638

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