Aos 80 anos, o ex-presidente Michel Temer voltou às rodas do poder. Se, enquanto exerceu o mandato ao lado da presidente Dilma Rousseff, rechaçava o posto de “vice decorativo” que lhe era imposto, Temer agora vive uma espécie de redenção. Recentemente, ele se reuniu com o governador de São Paulo, João Doria, manteve conversas com candidatos à presidência da Câmara e do Senado e foi procurado pelo presidente Jair Bolsonaro – com quem deve ter um encontro nos próximos dias.
O ex-presidente é tratado pelo governo como um personagem central para emplacar uma estratégia de ampliar seu leque de apoio político e pavimentar o caminho para a reeleição, em 2022. Temer foi até sondado a ocupar um ministério no governo de Jair Bolsonaro.
A proposta, recebida de maneira oficiosa, foi transmitida por Flávio Rocha, secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência e braço direito de Bolsonaro. Em conversa recente, Rochinha indagou o ex-presidente s ele aceitaria assumir o Itamaraty, hoje ocupado por Ernesto Araújo. A solução destravaria dois nós do governo: poderia ser uma solução para levar o MDB, partido tido como independente, para a órbita da aliança com Bolsonaro, ao mesmo tempo em que limaria Araújo do cargo, tirando de cena um importante foco de instabilidade dentro do Executivo.
Temer ajudaria na construção de pontes com o novo presidente norte-americano, Joe Biden, com quem se reuniu algumas vezes enquanto era vice-presidente da República, e apaziguar os ânimos com a China. A boa relação diplomática do emedebista é estendida ao presidente chinês Xi Jinping, de quem era próximo quando sucedeu Dilma – à época da Operação Carne Fraca, que apurava fraudes em frigoríficos brasileiros, Temer contactou Xi Jinping pedindo para que o país asiático não boicotasse a carne brasileira.
Outras soluções aventadas para Temer seria entregar-lhe uma embaixada em Portugal ou nos Estados Unidos. Seus interlocutores limitam-se a dizer que o ex-presidente está focado em resolver suas pendências na Justiça e que ele não recebeu a sondagem como um convite real, mas ponderam que ele se sentiria “estimulado” a ajudar o país neste momento de crise.
O principal álibi de Michel Temer é ser um profundo conhecedor da política e de seus meandros. Ex-presidente da Câmara ao longo de três mandatos, ele sempre defendeu a boa relação com os principais partidos, o que lhe garantiu a chegada à Presidência da República, com o apoio em massa de legendas que antes sustentavam Dilma Rousseff, a aprovação de pautas de difícil consenso, como a reforma trabalhista e o teto de gastos, e, claro, a sua sobrevivência no cargo, ao escapar das denúncias por corrupção. É com esse portifólio que ele tem defendido, em conversas com Bolsonaro, que abandone o radicalismo e faça uma composição com diversos partidos, o que ele chama de criar um “centro expandido”.
Parte dessa composição esbarra no próprio partido de Temer, que tem Baleia Rossi entre os candidatos à Presidência da Câmara em 2021, enquanto o Planalto trabalha por Arthur Lira, do PP. Nos últimos dias, Temer conversou com os dois (e também com demais candidatos à Câmara e ao Senado, como o líder do Congresso, Eduardo Gomes). Pessoas próximas ao ex-presidente afirmam que ele é partidário até o fim – ou seja, sempre vai defender o MDB -, mas que também poderia tentar um caminho alternativo.
“Se ele entender que é o melhor, pode dizer [ao Baleia]: ‘Faça um acordo, vamos unir o país, você pode ajudar na agenda de reformas’”, afirma um aliado. Nos bastidores, o MDB do Senado tenta demover Baleia Rossi de disputar a Câmara. A medida seria parte de um acordo com as legendas de centro para entregar o apoio a Lira e, em troca, receber o apoio a um nome do partido no Senado.