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“A política de segurança do Rio está errada”, diz Dornelles

Vice de Pezão critica o modelo das UPPs, condena gastos com a obra do Maracanã e admite que as provas de corrupção envolvendo Sérgio Cabral são contundentes

Por Thiago Prado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 12 ago 2017, 11h40
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  • O vice-governador do Rio de Janeiro Francisco Dornelles (PP) se prepara para deixar a vida pública. Aos 82 anos e com passagens pela Câmara dos Deputados, Senado e Esplanada dos Ministérios nas eras FHC e José Sarney, ele decidiu que não será mais candidato no ano que vem. O usual jeito mineiro de quem sempre precisou de votos e alianças partidárias dá lugar agora a um discurso que coloca mais o dedo na ferida de pontos da administração de Luiz Fernando Pezão, da qual faz parte desde janeiro de 2015. Em conversa com VEJA, Dornelles aponta equívocos na atual estratégia de policiamento do Rio, diz ter sido desnecessário reformar o Maracanã e admite ter tomado um susto ao conhecer a roubalheira da quadrilha de Sérgio Cabral desvendada pela operação Lava-Jato. Sua análise do cenário nacional e as apostas para as eleições de 2018 também são abordadas nesta entrevista a seguir:

    A violência explodiu no Rio e os índices de homicídios e assaltos não param de crescer. Como o governo deixou a situação chegar a este ponto?

    A política de segurança pública do Rio está errada. A UPP tem 12 000 homens e nos bairros, onde estão ocorrendo efetivamente os roubos e assassinatos, não há policiamento. Estão usando grande parte da polícia para ficar dentro das favelas sem qualquer tipo de inteligência. Não sou especialista da área, mas acho que a fiscalização para coibir a chegada das armas nas mãos dos bandidos deveria acontecer nos portos, aeroportos, rodovias e acesso das favelas. Não chove fuzil no morro, as armas estão vindo de algum lugar. Se você deixa para combater os traficantes só lá dentro da favela, o risco de o tiroteio atingir pessoas inocentes aumenta.

    Mas essa ocupação territorial de favelas dominadas pelo tráfico não é o principal conceito das UPPs?

    Olha, eu confio plenamente no atual secretário de Segurança, Roberto Sá, acho um ótimo quadro. Mas acho que ele tem que repensar o projeto, não necessariamente acabar com a UPP. A ideia foi boa, deu uma grande projeção ao Rio, mas é preciso pensar se vale a pena continuar por este caminho. Nada deve ser permanente. Os índices de criminalidade chegaram a níveis inacreditáveis. E o problema não é falta de policial. A nossa relação de agentes de segurança por habitante é das mais altas do país. A questão é a distribuição do efetivo.

    Internamente o senhor também tem reclamado sobre a questão envolvendo o Maracanã. Qual o erro na sua visão?

    Estava tudo acertado para a Odebrecht vender a sua participação no estádio para o grupo francês Lagardère. Até que  a Procuradoria do Estado deu um parecer contrário ao negócio. Não entendo. Se a mesma empreiteira foi autorizada a vender para um grupo chinês a sua parte no aeroporto Galeão sem necessidade de nova licitação, por que não pode fazer o mesmo com o Maracanã? Também fui voto vencido neste debate no governo.

    E hoje o estádio que custou caríssimo raramente recebe jogos…

    Foi um erro gastar mais de 1 bilhão de reais no Maracanã. O estádio já funcionava muito bem, não precisava de uma obra daquelas. Aliás, a construção de tantas arenas pelo Brasil para a Copa do Mundo foi outro equívoco. O que o país desperdiçou nisso poderia ter sido usado na área de infraestrutura de forma muito mais proveitosa.

    Sérgio Cabral, seu aliado político há anos, está preso acusado de ter recebido mais de 300 milhões de reais em propina. Como recebeu a notícia?

    Com muita tristeza. É tão absurdo que às vezes me pego torcendo para não ser verdade. Quem acompanhou a excelente administração que o Sérgio fez no Rio não poderia imaginar essas distorções.  Mas as provas são muito contundentes. Nunca imaginei, contudo, que ele e seu grupo estariam operando nesta dimensão.

    Mas quando o senhor diz “nesta dimensão” é porque o senhor já sabia que eles faziam algo de errado em uma proporção menor?

    O que eu digo é que se fosse revelado que faziam apenas caixa dois… Isso todas as campanhas fizeram no Brasil esses anos todos. Agora cobrar percentual em cada obra? Isso eu nunca poderia imaginar. Tomei um susto quando soube de tudo.

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    Os defensores do governo Pezão sempre batem na tecla que a crise no estado é consequência da queda dos royalties e da recessão econômica do país. A roubalheira não contribuiu também?

    Pode ter contribuído sim na medida em que começaram a fazer obras demais movidas por outros interesses. Mas o que realmente bateu e foi determinante na crise do estado foram estes motivos que você enumerou inicialmente. Mais duas questões: houve um excesso de benesses dadas por Cabral ao funcionalismo imaginando receitas futuras que não vieram.  E há um nó nas aposentadorias do Rio. Temos mais inativos que ativos hoje na nossa folha de pagamento. Pezão tem sido um gigante para tentar resolver esses problemas.

    O senhor falou de caixa dois. Por que esta prática se proliferou na política brasileira?

    É uma maneira de financiamento que sempre predominou no Brasil por um motivo muito simples. Um exemplo: na campanha do Eduardo Azeredo para o governo de Minas em 1998, uma empresa grande participou ativamente da campanha. Tudo declarado certinho. Pois bem, Itamar Franco acabou ganhando a eleição e tirou a tal empresa de todas as obras do estado depois que assumiu. No interior este tipo de prática é mais comum ainda. A verdade é que muitas empresas sempre preferiram o caixa dois e os políticos acabavam aceitando.

    Quem o senhor acha que vai substituir Pezão no Palácio Guanabara a partir de 2019?

    Muito cedo ainda para prever. Acho que Eduardo Paes, Indio da Costa, Rodrigo Neves (prefeito de Niterói) e Anthony Garotinho serão candidatos.

    Garotinho de novo?

    Ele quer, embora tenha perdido a eleição em Campos, seu reduto eleitoral, e esteja sem base política para disputar. Garotinho cria muitos atritos e tem necessidade de agredir as pessoas. A Rosinha seria uma candidata muito mais forte do que ele.

    O PMDB, tão desgastado por denúncias, perderá Paes?

    Acho difícil ter no estado um partido com a estrutura do PMDB. Além disso, Jorge Picciani ainda é a maior liderança política do Rio. Eduardo deveria levar isso em conta antes de tomar uma decisão. O PMDB está presente em todos os municípios, bairros, clubes e associações. Esse voto de opinião que se incomoda com as denúncias nunca foi do PMDB mesmo. As pessoas às vezes falam sobre a possibilidade de candidaturas de figuras de fora da política como Bernardinho ou Eduardo Bandeira de Mello do Flamengo. São dois excelentes nomes, mas sem estrutura partidária forte fica difícil. O tempo passa, mas esse estilo de política mais micro não vai acabar.  Postulante ao executivo ainda vai precisar de candidato a deputado pedindo voto em cada esquina. E os tais candidatos outsiders, se realmente existirem em 2018, não terão tempo suficiente para construir relacionamento com essas lideranças locais.

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    Perder a capital para Crivella em 2016 dificulta ainda mais a volta de Paes?

    Sem dúvida. Ele e o marqueteiro erraram demais na última campanha. Ali tinha que ser o Eduardo falando na TV toda hora, mostrando tudo o que fez em oito anos de administração. Pedro Paulo tinha que aparecer só em um terço dos programas.

    Com a projeção alcançada, Rodrigo Maia deve alçar voos mais altos?

    Ele foi uma surpresa agradável, deu uma projeção muito grande à Câmara dos Deputados. Rodrigo está na ponta do trampolim, chegou a hora de saltar para uma disputa majoritária. Acho pouco se escolher voltar pela escada por onde subiu.

    Qual a sua expectativa para eleição nacional?

    Tudo vai depender se o Lula disputa ou não. Creio que se for candidato, é muito forte. Ele tem muito carisma e fez um governo de apelo social enorme. O juiz Sérgio Moro teve o bom senso de não prendê-lo, senão o transformaria em mártir. Agora, se o PT escolher o Fernando Haddad, será um erro. Acho que ele não sai do chão. Um candidato que perde a prefeitura de São Paulo não pode ser forte para o Planalto. Melhor apoiar o Ciro Gomes.

    Seu ex-companheiro de PP, Jair Bolsonaro, é forte?

    Almoçou comigo há dez dias. Ele tem certeza absoluta de que vai ganhar a eleição. De verdade, acho muito difícil prever o futuro. No Brasil um ano é um século e, historicamente, todas as previsões estão sempre erradas. Quem imaginaria que Fernando Collor sairia de Alagoas, seria eleito e depois deposto?  Todos achavam que o Itamar Franco ao assumir seria um desastre, deu certo. Depois, ganhou o FHC que anos antes estava preocupado com a eleição para deputado. Quem poderia imaginar que Lula faria dois governos fortes e sairia com tamanha aprovação popular? Elegeu uma mulher que ninguém conhecia e que depois foi expulsa do cargo. Como dizia o Winston Churchill:  “A política é a habilidade de prever o que vai acontecer amanhã, na semana que vem, no mês que vem e no ano que vem. E ter a habilidade de explicar depois por que nada daquilo aconteceu”.

    Na disputa entre Geraldo Alckmin e João Dória no PSDB, quem leva a melhor para sair candidato?

    Acho que ganha o Alckmin. Ele tem o partido e o controle dos diretórios.

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    Mesmo com a acusação de que o cunhado recebeu recursos de caixa dois pela Odebrecht?

    Olha, vai chegar a um ponto no Brasil que se o sujeito não estiver citado na Lava-Jato vai até perder valor na política. De novo: quem é que não recebia recursos de empresa via caixa um e dois? Quando se faz uma campanha, designam-se pessoas para conseguir recursos. Se Alckmin escolheu o cunhado para fazer isso, confiou no rapaz. Ele não pode ser responsabilizado  por isso.

    O senhor acha que foi melhor o Congresso manter Temer na Presidência mesmo diante das acusações?

    Foi, senão teríamos uma imagem de republiqueta que cada hora tira um presidente do cargo. O Procurador-geral da República Rodrigo Janot exagerou na denúncia. Para tirar um presidente tem que ser algo muito grave.

    Temer diz “ótimo, ótimo” enquanto o empresário Joesley Batista afirma estar comprando juízes e promotores, não se opõe à compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha… Isso não é grave?

    Olha, um político como o Temer concorda com tudo que um interlocutor diz. Tancredo Neves era assim. Se um sujeito falasse “vai chover hoje” e o outro “vai fazer sol”, ele arrumava um jeito de concordar com os dois de alguma forma. São políticos que não discutem.

    E a mala de dinheiro para o Rocha Loures, designado pelo próprio presidente para tratar dos problemas que Joesley queria resolver?

    Aí é outra coisa. Ninguém provou ali a contrapartida e muito menos que aqueles recursos iriam para o Temer. Estou falando, faltou investigar melhor. Essa conduta do Janot de dizer toda hora que tem flecha contra o presidente é inadequada. O procurador-geral pode propor dez, vinte ações, mas não deve anunciar antes. Acaba sendo midiática esta atitude.

    Como o senhor reagiu ao ouvir seu primo Aécio Neves pedindo dois milhões de reais para o Joesley em uma gravação?

    Tenho a impressão de que o Aécio… (neste momento Dornelles faz um gesto que indica que o senador havia bebido no dia da conversa).

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    Estava embriagado?

    Eu achei. Aquele palavreado não é dele. Mas de novo: ele pediu dinheiro para o Joesley e deu alguma contrapartida em Minas Gerais? Não. Admito que foi tudo mal conduzido, botar um sujeito para transportar o dinheiro depois… Mas estive com o Aécio e ele acha que não fez nada de errado.

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