Ministro de Lula rejeita termo Centrão e defende mais partidos no governo
Novo titular do Turismo, Celso Sabino apoia política de abrir espaço a siglas do bloco e fala que tem plano para quase duplicar fluxo de viajantes ao Brasil
Há pouco mais de um mês no cargo, o advogado, administrador e auditor fiscal Celso Sabino (União Brasil-PA) chegou ao Ministério do Turismo como uma indicação da bancada do partido na Câmara. Deputado federal no segundo mandato, a sua nomeação para o posto no lugar da então ministra, Daniela Carneiro, era vista como necessária para melhorar a relação da legenda, uma das maiores da Câmara, com o governo Lula, que tinha dificuldades no Legislativo. A sua chegada marcou o início de um movimento mais amplo do governo para abrir espaço na máquina pública ao Centrão, o agrupamento parlamentar que há anos dá as cartas no Congresso e que deve emplacar também representantes do PP e do Republicanos na Esplanada dos Ministérios. Sabino evita utilizar o termo no aumentativo porque avalia que a expressão “Centrão” adquiriu uma conotação negativa, da qual discorda. Prefere usar o termo centro democrático, que para ele representa o diálogo e ajuda a evitar a construção de muros nos extremos do espectro ideológico. Na entrevista dada a VEJA, ele diz que é “página virada” o imbróglio político que consumiu seis meses de trabalho do ministério e aposta em um plano de desenvolvimento do setor turístico, que movimenta 7,6% do PIB, para aumentar em 70% o fluxo de visitantes estrangeiros (atualmente de 6 milhões ao ano), além de alavancar o turismo interno. A seguir, os principais trechos.
O senhor chegou ao governo para melhorar a sintonia do União Brasil com a gestão Lula. O que falta para o partido dar apoio total aos projetos governistas no Congresso? O União só fica atrás do PT, quando o assunto é votar com o governo em temas importantes para o país. Foi assim na reforma tributária e na PEC da Transição. Temos entregado 47, 48, 50 votos, de um total de 59 deputados. Cada parlamentar é um mandato e vejo grande disposição da bancada no sentido de promover um bom diálogo. O partido vai continuar votando com o governo o que for mais importante.
O União comanda três pastas na Esplanada. A sigla almeja obter mais algum quinhão na administração? Esse debate sobre espaço começou no primeiro dia da transição e vai até o último dia do governo. Não é questão de uma semana, um mês. A discussão sobre isso é com muitos partidos, com o PT, o PSB e o MDB também.
Lula chegou a falar que o Centrão não existe. Por que acha que ele negou a existência do bloco? Penso que o centro democrático seja necessário e importantíssimo. Mas não concordo com o uso dessa expressão (Centrão), como se fosse uma entidade negativa, que promove coisas ruins. Tenho certeza que as pessoas entendem a importância da moderação, da conversa. Em algumas cidades e estados, os extremos se negam ao diálogo, a algo que os aproxime. É importante que o centro saiba reconhecer o bem dos dois lados, impedindo a construção de um muro entre eles.
O que acha da abertura de espaço ao PP e Republicanos na gestão? São siglas que contribuem para o país em pautas que julgam importantes. O diálogo existe. Acredito que estarão no governo nos próximos dias.
“O União Brasil só fica atrás do PT quando o assunto é votar com o governo. Temos entregado 47, 48, 50 votos, de um total de 59 deputados. O partido vai seguir assim”
Críticos da escolha de seu nome citaram sua falta de experiência no setor de turismo. O senhor entende do ramo? Tivemos grandes realizadores que entregaram grandes políticas, como a do medicamento genérico, feita pelo ex-ministro da Saúde José Serra. Ele não era enfermeiro, médico, nem da área da saúde. Eu sou pessoa determinada, esforçada, empenhada. Sou auditor fiscal de carreira, tenho especialização em áreas de gestão pública.
A gestão da sua antecessora, Daniela Carneiro, foi marcada desde o início por denúncias envolvendo o seu nome e polêmicas que a mantiveram presa a uma agenda negativa. Como será a sua atuação na pasta? Os primeiros meses de 2023 foram de transição, com a recriação do Ministério do Turismo, que voltou a ser uma pasta única, após o desmembramento com a Cultura. Com o novo arranjo, passamos um longo período de transição. Agora temos essa página virada e lançaremos no próximo mês um grande plano de desenvolvimento do turismo, cujas ações serão direcionadas para os próximos cinco anos.
Quais serão os principais pontos do projeto? Ele parte da ideia do governo de baratear passagens aéreas? Vamos apresentar o plano ao presidente Lula no mês que vem, mas posso adiantar que pretendemos aumentar para dois dígitos o número de turistas estrangeiros, hoje na casa de 6 milhões por ano. É parecido com o que fez Portugal, que saltou de 7 milhões de estrangeiros em 2011 para 22 milhões em 2022. Eles investiram na conectividade do país com outras nações, ampliaram linhas aéreas e aumentaram a ligação de trens e ônibus com outros hubs globais. Também houve investimento em promoção, especialmente na Europa. Venderam um país seguro, que tinha conexão aérea e boa infraestrutura turística.
Mas esses não são justamente os nossos gargalos eternos? O novo PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) lançado agora pelo presidente Lula tem a previsão de construir e reformar aeroportos, recuperar estradas. Por isso temos dialogado muito com outros ministérios. O Turismo é uma pasta transversal.
Além da infraestrutura, quais as outras áreas que vão merecer investimos? Vamos relançar a polícia turística em todos os estados, juntamente com o Ministério da Justiça. Vamos apresentar um protocolo de como cada polícia deverá agir em caso de eventualidades com os turistas. Faremos aportes para a compra de equipamentos, veículos, montagem de estruturas e treinamentos, entre outros. Vamos criar acordos com hotéis e pousadas para que haja preço mais justo para quem tem carteira assinada fora da alta temporada. As empresas programam as férias de seus funcionários de forma escalonada e há muitos meses em que os destinos estão ociosos. Diante disso, as companhias estão dispostas a ofertar mais assentos e leitos nesses períodos. Outra ideia: faremos um programa-piloto em Brasília para que estudantes secundaristas, universitários, pesquisadores e outras pessoas venham à capital nos fins de semana, quando a cidade fica vazia. Se der certo, o segundo piloto será em Petrolina (PE). Teremos programas para o trabalhador de baixa renda, para aposentados, tudo sem dinheiro público.
Boa parte do orçamento do seu ministério é voltada para obras de infraestrutura não relacionadas diretamente ao turismo, como urbanização, reforma de praças. Essa política permanecerá? O foco deve ser na movimentação turística, não vamos fazer obras que fogem do interesse turístico. Temos classificação das cidades consideradas atrativas e nossas energias serão voltadas para essas regiões. Vamos nos dedicar à ampliação da infraestrutura em locais que merecem efetivamente receber os recursos.
Quais locais, por exemplo? Tivemos recentemente um desmoronamento de falésias na praia de Pipa, em Natal (RN). Para chegar lá é preciso percorrer uma rodovia federal e pegar 25 quilômetros de estrada estadual, em condições ruins. Obras nesses locais facilitam o acesso de turistas, são claramente relacionadas ao turismo.
A sua gestão será capaz de melhorar a imagem do Brasil no exterior, onde somos malvistos em algumas questões, como a da segurança pública? Há violência em vários países. Conheço pessoas que foram assaltadas em Portugal. Na França o goleiro do PSG teve a sua casa invadida. Sem falar na guerra que ocorre na Ucrânia. O Brasil possui problemas com segurança, mas o presidente Lula tem se esforçado em apresentar programas em áreas sociais. E a gente está dialogando com a indústria do cinema, com setores da cultura, do streaming, no sentido de ter filmes e séries no Brasil, para mostrar as coisas boas do país.
Mas é fato que a imagem do Brasil no exterior é bastante ligada à violência. Como reverter isso? O Brasil é reconhecido como o primeiro destino mais interessante do ecoturismo, passamos a Austrália. Com a COP30 (conferência ambiental da ONU que ocorrerá em Belém em 2025), vamos ter uma chance de nos mostrar. Uma das palavras mais ditas no mundo é Amazônia. Teremos a oportunidade de fazer com que o mundo olhe para o Brasil. Haverá as comitivas, virão reis, ministros de Estado. Serão 80 000 pessoas entrando e saindo do país.
“Há violência em vários países. Conheço pessoas que foram assaltadas em Portugal. Estamos dialogando com diversos setores para mostrar as coisas boas do Brasil”
Tivemos uma chance de nos mostrar ao mundo com a realização da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada dois anos depois, mas o país não aproveitou a visibilidade para aumentar seu potencial turístico. Por que seria possível com a COP30? Eu não estava como ministro nessa época. Muitos investimentos foram feitos, mas temos que olhar para a frente. Não precisamos buscar culpados ou responsáveis pelo que não funcionou.
O governo do ex-presidente Jair Bolsonaro contribuiu para a piora da imagem do Brasil lá fora? O fato é que o presidente Lula, através da sua credibilidade, visitando diversos países, fez com que a imagem do Brasil melhorasse nesses primeiros meses de gestão. Mais recentemente, ele fez um acordo com o Japão para a isenção de vistos. O diálogo com a União Europeia para ampliar o comércio do Mercosul também foi importante.
O senhor era filiado ao PSDB em 2020 quando foi indicado para assumir a liderança da maioria na Câmara, posto alinhado ao Palácio do Planalto, então comandado por Bolsonaro. O senhor ainda conversa com o ex-presidente? Fui indicado por onze partidos na legislatura passada, e o ex-presidente da República nunca se envolveu com a eleição. Todos foram escolhidos pelos partidos. Não houve nenhum tipo de intervenção na escolha ou decisão de bloco da maioria.
Há uma foto sua ao lado de Bolsonaro que circula pela internet. Vocês eram ou são amigos? Tenho foto com vários ex-presidentes, como Michel Temer, José Sarney, Dilma Rousseff, Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso. Com Jair Bolsonaro, a foto foi durante a divulgação de um aparelho turístico em Belém. Todos os parlamentares do Pará foram convidados, de vários partidos. Naquele momento, dentro do avião, vários se levantaram para tirar foto com o presidente e eu fui um deles. Não tenho o celular dele, nunca falamos pelo WhatsApp. Não lembro de ter discutido qualquer assunto com ele. Isso tudo é uma ligação que tentam fazer para gerar constrangimentos.
Publicado em VEJA de 18 de agosto de 2023, edição nº 2855