Secretário da Defesa dos EUA nega que negociar com Putin seja ‘trair’ a Ucrânia
Os líderes americano e russo concordaram em iniciar tratativas de paz 'imediatamente', e comunidade internacional exige que Kiev tenha protagonismo

O secretário da Defesa dos Estados Unidos, Pete Hegseth, afirmou nesta quinta-feira, 13, que não acredita que o impulso acelerado para encerrar a guerra na Ucrânia seja equivalente a “trair” Kiev. A declaração veio depois de vários líderes internacionais frisarem que o governo ucraniano deve ser central para as negociações de paz, depois do presidente americano, Donald Trump, tratar dos termos para o fim do conflito em um telefonema com o homólogo russo, Vladimir Putin.
Confrontado por repórteres antes da reunião dos ministros da Defesa de membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), em Bruxelas, Hegseth negou sugestões de que as tratativas com Putin podem ser vistas como uma traição à Ucrânia.
“Esse termo é de vocês, não meu. Certamente não é uma traição”, insistiu, em meio a elogios a Trump como “o melhor negociador do planeta” por trazer os dois lados à mesa de negociações. “Não há traição; há um reconhecimento de que o mundo inteiro e os Estados Unidos estão investidos na paz, em uma paz negociada”, reiterou.
Rússia é “importante responsabilidade europeia”
A autoridade americana também deu uma declaração relativamente controversa, olhando para a invasão à Ucrânia como copo meio cheio, ao afirmar que a guerra atuou como uma “reinicialização de fábrica” para a Otan. A aliança militar ocidental, que estava desmontada (sofreu “morte cerebral”, como famosamente definiu o presidente francês, Emmanuel Macron), precisou se fortalecer para reagir à agressão russa.
A invasão foi um momento de “percebimento de que essa aliança precisa ser robusta, forte e real”.
“É por isso que o presidente Trump pediu um aumento nos gastos com defesa em todos os níveis para a Otan, para que os países europeus reconheçam que essa é uma ameaça urgente e real ao continente e que essa agressão precisa ser um chamado para despertar”, justificou. Ele acrescentou ainda que enfrentar a agressão russa é “uma importante responsabilidade europeia”.
A reação cautelosa à conversa entre Trump e Putin
Na quarta-feira 12, Trump, disse que conversou por telefone com Putin e que os dois concordaram em iniciar “imediatamente” as negociações pelo fim da guerra na Ucrânia. Poucos dias antes, porém o Kremlin havia subido o tom e informado que só vai encerrar o conflito nos termos determinados pelo presidente russo.
Os desenvolvimentos geraram uma forte reação internacional. O ministro das Relações Exteriores ucraniano, Andrii Sybiha, afirmou em entrevista ao jornal francês Le Monde, nesta quinta, que seu país e o resto da Europa não devem ser excluídos de futuras negociações de paz. “Nada sobre a Ucrânia pode ser discutido sem a Ucrânia, ou sobre a Europa sem a Europa”, disse ele.
Sybiha voltou a defender que a entrada de Kiev na Otan continua sendo a maneira mais barata para a aliança militar garantir a segurança ucraniana e europeia, e que os termos para o fim da guerra não podem incluir compromissos que prejudiquem a integridade territorial ou a soberania da Ucrânia. Anteriormente, o secretário americano Hegseth havia descartado a possibilidade de adesão à Otan e chamou de “irrealista” um retorno às fronteiras ucranianas pré-2014 (quando a Rússia começou sua anexação, tomando a Crimeia).
“Queremos um acordo completo. É do interesse dos Estados Unidos. Com a liderança de Trump, com um forte compromisso europeu e unidade europeia, temos a chance de dar um novo ímpeto a esse processo. Mas, até onde sei, nossos aliados americanos ainda não finalizaram seus planos”, disse Sybiha ao Le Monde. “Todos os nossos aliados disseram que o caminho da Ucrânia em direção à adesão à Otan é irreversível. Essa perspectiva está em nossa Constituição. É do nosso interesse estratégico”, completou.
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O comissário para a Justiça da União Europeia, Michael McGrath, reiterou em entrevista à rádio irlandesa RTÉ nesta quinta que Kiev deve ser central para qualquer acordo de paz que possa ser discutido por Trump e Putin. Segundo ele, que a Ucrânia recebe a atenção pessoal do presidente dos Estados Unidos é positivo, mas enfatizou que o país do Leste Europeu faz fronteira com o bloco e está no caminho para se juntar à UE.
“O povo da Ucrânia e o governo ucraniano devem estar envolvidos de forma central em qualquer negociação sobre o futuro de seu próprio país. O que não podemos ter é uma situação em que a agressão seja recompensada”, destacou.
O chanceler alemão, Olaf Scholz, que ao que tudo indica deixará o posto após as eleições de 23 de fevereiro no país, também defendeu que nenhum acordo pode ser imposto a Kiev.
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“A próxima tarefa é garantir que não haja paz ditada”, disse Scholz ao portal de notícias Politico, apesar de conceder que Trump é um ator importante na equação. “Está bem claro para mim que não pode haver solução em que os Estados Unidos não estejam envolvidos”, declarou.
Segundo o líder da Alemanha, não está claro sob quais condições a Ucrânia estaria preparada para aceitar um acordo de paz, mas ele enfatizou que o país precisa de “um exército forte”, maior do que era antes da guerra, e equipado com armas ocidentais. Só não se disse aberto a enviar soldados alemães para ajudar a proteger Kiev – o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, falou em instalar uma força de manutenção de paz com 200 mil militares europeus no seu país. “Todo mundo sabe que isso está fora de questão agora”, disse Scholz.