O Reino Unido anunciou nesta quinta-feira, 3, que devolverá sua última colônia na África às Ilhas Maurício depois de 13 rodadas de negociações, iniciadas em 2022. Em 1965, as Ilhas Chagos foram separadas ilegalmente das Maurício pelo governo britânico, que concedeu independência a esta última três anos depois. Após a divisão, milhares de chagossianos foram expulsos entre as décadas de 1960 e 1970 — episódio considerado crime contra a humanidade, como apontam as definições do Tribunal Penal Internacional (TPI).
O acordo histórico permite, no entanto, que o Londres mantenha o controle da base militar Reino Unido-EUA em Diego Garcia, maior atol do arquipélago de Chagos. Para instalar a base na ilha, cerca de 1.500 moradores foram retirados de suas casas. Segundo o secretário de Relações Exteriores britânico, David Lammy, o tratado assegurou o futuro da instalação militar e o bom relacionamento com as Ilhas Maurício.
“O acordo de hoje assegura esta base militar vital para o futuro. Ele fortalecerá nosso papel na salvaguarda da segurança global, acabará com qualquer possibilidade de o Oceano Índico ser usado como uma rota perigosa de migração ilegal para o Reino Unido, bem como garantirá nosso relacionamento de longo prazo com Maurício”, disse ele.
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Autodeterminação em risco
As discussões foram impulsionadas após os argumentos de soberania das Ilhas Maurício serem reconhecidos pelo Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), pela Assembleia Geral das Nações Unidas e pelo Tribunal Internacional do Direito do Mar (ITLOS), entre 2019 e 2021. Na época, o pedido do TIJ para que a ilha fosse devolvida não foi bem recebido pelo Reino Unido, que alegou que tratava-se apenas de uma “opinião consultiva”.
Por mais que coloquem fim a anos de imbróglios, as negociações desta quinta-feira colocam em risco a autodeterminação dos chagossianos. Afinal, Maurício não considera as Ilhas Chagos como um território independente. Em janeiro de 2023, uma tentativa de interromper as tratativas por falta de consultas com representantes das Chagos falhou. A ONG Chagossian Voices condenou, portanto, o anúncio britânico.
“Chagossian Voices lamenta a exclusão da comunidade chagossiana das negociações que produziram esta declaração de intenções sobre a soberania de nossa terra natal”, afirmou em comunicado.
“Os chagossianos aprenderam este resultado pela mídia e permanecem impotentes e sem voz na determinação de nosso próprio futuro e do futuro de nossa terra natal. As opiniões dos chagossianos, os habitantes indígenas das ilhas, foram consistentemente e deliberadamente ignoradas e exigimos inclusão total na elaboração do tratado”, acrescentou.