Rebeldes atacam QG do Exército sudanês, impedindo retirada de civis
Bombardeios e fortes explosões continuam em Cartum, capital do Sudão com 5,5 milhão de habitantes, apesar de cessar-fogo; ao menos 270 pessoas morreram
O Exército do Sudão enfrentou ondas de ataques ao seu quartel-general na quarta-feira, 19, por uma força paramilitar rebelde que tenta tomar o posto. O fracasso do cessar-fogo mediado pelos Estados Unidos dificultou os esforços para resgatar estrangeiros e residentes presos na capital no quinto dia de conflitos.
Houve bombardeios contínuos e fortes explosões no centro de Cartum, uma das maiores cidades da África, ao redor do complexo que abriga o quartel-general do exército e também no aeroporto principal, inoperante desde o início dos combates no fim de semana.
No início da semana, o governante militar do Sudão, general Abdel Fattah al-Burhan, disse que estava operando em uma casa de hóspedes presidencial dentro do complexo. Não se sabe se ele continua no local nesta quarta-feira.
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“As forças armadas estão respondendo a um novo ataque nas proximidades do Comando Geral, infligindo pesadas baixas ao inimigo e destruindo vários veículos de combate”, disse o Exército em um comunicado.
Combates entre militares sudaneses e o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (FAR) eclodiram no último fim de semana, em uma luta pelo governo do país. Pelo menos 270 pessoas morreram e 2.600 ficaram feridas, disse o Ministério da Saúde do Sudão, citado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
O conflito corre o risco de atrair atores da vizinhança do Sudão, que apoiam diferentes facções, e aumentar a competição entre a Rússia e os Estados Unidos pela influência regional.
Os alvos dos paramilitares incluem hospitais e trabalhadores humanitários. As Nações Unidas registraram relatos de violência sexual contra seus funcionários, e a maioria dos hospitais não está funcionando.
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Mesmo antes do conflito, cerca de um quarto da população do Sudão era afetada por fome aguda. O Programa Mundial de Alimentos interrompeu suas operações de assistência no país, uma das maiores do mundo, no sábado, depois que três de seus funcionários foram mortos.
Potências estrangeiras, incluindo os Estados Unidos, pediram por um cessar-fogo entre o Exército e a FAR para permitir que os residentes presos pelos combates obtenham ajuda e suprimentos, e para que cidadãos estrangeiros sejam resgatados.
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Ambos os lados concordaram com uma pausa de 24 horas nas hostilidades a partir das 18h (13h de Brasília) na terça-feira 17, mas os ataques persistiram. Militares e paramilitares emitiram declarações acusando-se mutuamente de não respeitar a trégua.
Com o aeroporto internacional de Cartum fechado e ataques contra diplomatas e outros alvos, incluindo um comboio de veículos americanos, qualquer operação de retirada de civis parece impraticável. O Departamento de Estado dos Estados Unidos disse que a “situação de segurança incerta” e o fechamento do aeroporto significam que não há planos para uma evacuação coordenada pelo governo americano.
A Alemanha interrompeu uma missão para retirar cerca de 150 cidadãos do país nesta quarta-feira, que viajariam em três aviões de transporte Luftwaffe A400M, informou a revista alemã Spiegel. Enquanto isso, o secretário-chefe do gabinete do Japão disse que o país planeja usar um avião das Forças Armadas de Autodefesa para retirar cerca de 60 cidadãos japoneses do território sudanês.
O Exército do Sudão trouxe reforços de outras partes do país para Cartum, incluindo áreas do leste perto da fronteira com a Etiópia, segundo a agência de notícias Reuters. O acesso à capital sudanesa, uma metrópole de cerca de 5,5 milhões de pessoas, ainda é controlado pelos militares, que parecem estar tentando cercar a FAR. Muitos paramilitares permanecem posicionados nas ruas da cidade.
Os combates levaram a uma interrupção generalizada do fornecimento de energia e água, deixando os moradores órfãos nos últimos dias do mês sagrado do Ramadã, quando os muçulmanos jejuam entre o amanhecer e o anoitecer. Escritórios e escolas foram fechados em Cartum, onde se proliferam saques e assaltos. As padarias que ainda funcionam tem filas quilométricas, disse a Reuters.
A luta, que coloca o líder militar Burhan contra o chefe da FAR, o general Mohamed Hamdan Dagalo, começou após desacordos sobre um plano para integrar os paramilitares às forças armadas regulares.
Burhan lidera um conselho governante instalado no golpe militar de 2021, que ocorreu depois que o autocrata Omar al-Bashir foi deposto, em 2019. Dagalo – mais conhecido como Hemedti – era seu vice no conselho governante.