Avatar do usuário logado
Usuário
OLÁ, Usuário
Ícone de fechar alerta de notificações
Avatar do usuário logado
Usuário

Usuário

email@usuario.com.br
Oferta Relâmpago: Assine VEJA por 9,90/mês

Por que Maria Antonieta foi a rainha da imagem

Última monarca da França entendia a moda como instrumento de soft power e assim se fez famosa, como mostra uma ótima exposição sobre ela em Londres

Por Júlia Sofia Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 19 out 2025, 08h00

Ao ser despachada da corte austríaca para Versalhes em 1770, já de casamento marcado com o futuro rei Luís XVI, Maria Antonieta era uma adolescente dada à espontaneidade que, sem traquejo, espantou-se com o rígido manual de códigos que movia o opulento palácio a meia hora de Paris. Mal sabia ela quão bem aprenderia a se movimentar no tabuleiro da poderosa monarquia da França, que inspirava todas as outras na Europa, e o papel que a história lhe reservava. Seu nome é hoje automaticamente associado à folclórica frase que teria sido proferida ao povo faminto às vésperas da Revolução Francesa: “Se não têm pão, comam brioches”. Uma fake news que resistiu firme à passagem do tempo, mas que espelha a visão à época de uma soberana perdulária, descolada da áspera realidade à sua volta. Só que a derradeira rainha francesa, também lembrada por ter se juntado à vala comum dos guilhotinados, exibia muitas outras facetas, como mostra uma recém-inaugurada exposição no museu londrino Victoria & Albert, O Estilo de Maria Antonieta.

A visita promove um passeio por 250 itens expostos pela primeira vez fora de Versalhes, entre roupas, joias e objetos que, em seu conjunto, ajudam a contar a trajetória da monarca que ditou moda e modos no gran siècle, o glorioso século XVIII na França, e segue atiçando a curiosidade contemporânea. Estão ali brilhantes que tentou carregar consigo na malfadada tentativa de fuga do palácio com a revolução em marcha, a lâmina que lhe decepou a cabeça na Place de la Concorde, um vestido de noiva que uma nobre resolveu fazer tal e qual o dela e uma série de outros saídos das pranchetas de pesos-pesados das grandes maisons, como Dior, Chanel e Yves Saint Laurent, exemplares do chamado rococó chic. O curador, Manolo Blahnik, o célebre espanhol que converteu sapatos em objetos de desejo e lançou modelos à la Maria Antonieta, buscou aliar moda e história para jogar nova luz sobre a complexa personagem, que cultivava o visual sem medir gastos e não por acaso foi apelidada de “Madame Déficit”.

NA FICÇÃO - Vivida por Kirsten Dunst no cinema, em 2006: incompreendida
NA FICÇÃO - Vivida por Kirsten Dunst no cinema, em 2006: incompreendida (Columbia Pictures/.)

Em uma corte na qual era difícil se infiltrar, alheia às grandes decisões seladas sob os pesados candelabros, a jovem demarcou espaço com looks que rompiam com o padrão e penteados monumentais, uma espécie de arma de soft power. Influenciou assim as nobres rodas e até as massas empobrecidas, que adaptavam as novidades ao bolso. Quando era aguardada em trajes bufantes que escondiam o corpo, dava de aparecer de calça ou vestidos menos armados, como a chemise à la reine, o que ironicamente lhe rendia críticas por se aproximar de um “ideal camponês”. Nada a ver com Versalhes.

Os historiadores costumam dizer que Maria Antonieta já revelava uma moderna percepção do poder da imagem: sabia como poucos mudar o estilo ao sabor das circunstâncias e entendia a moda como ferramenta para se fazer falada e famosa. As aparições estratégicas e o seletivo vazamento de informação sobre como se apresentaria em certa ocasião eram como um hobby. “Ela usou seu guarda-roupa para reforçar a ideia de autoridade e de liberdade individual”, explica Rosanna Naccarato, especialista em design de moda do Senai Cetiqt.

Continua após a publicidade
OLHAR MODERNO - Peças em exibição: releitura feita por grandes grifes
OLHAR MODERNO - Peças em exibição: releitura feita por grandes grifes (Peter Kelleher/V&A Museum/.)

Ao longo de sua estada em Versalhes, onde morava em um palacete à parte na propriedade, o Petit Trianon, Maria Antonieta recebeu críticas vindas dos mais distintos estratos da sociedade. Para os conservadores, era uma forasteira incômoda, a l’Autrichienne — maliciosa fusão das palavras “austríaca” e “cadela” —, que não tinha o que acrescentar à bem estabelecida elite francesa. Sob o prisma dos republicanos, ali estava a encarnação dos velhos vícios do Antigo Regime, uma “parasita insaciável”, como aparecia nos panfletos, cujos gastos exorbitantes com jardineiro, pintor e cozinheiro insuflavam a ira da multidão pronta para derrubar a Bastilha. Sua costureira particular, aliás, Rose Bertin, foi alçada ao cargo de “ministra da moda”, ganhou projeção internacional e é considerada a primeira a profissionalizar o ofício, plantando, na parceria com a rainha, as bases da alta-costura. Por tudo isso, Maria Antonieta conquistou holofotes, para o bem e para o mal. “A dramaticidade de sua biografia, somada ao contexto em que vivia, a tornaram mais icônica do que várias outras monarcas”, observa o historiador Felipe Goebel.

O passar dos séculos suavizou o julgamento sobre ela e abriu novas frentes de leitura sobre a figura que nunca deixou de ser observada e comentada. Nos anos 1990, seu estilo não apenas ressurgiu repaginado pelas grifes de alta-costura, como vestiu Madonna em uma muitíssimo comentada premiação do MTV Awards. Aí veio o filme Maria Antonieta, de 2006, dirigido por Sofia Coppola e protagonizado por Kirsten Dunst, que a retratou como uma inquieta monarca incompreendida e a consolidou como ícone pop. Até uma ala do feminismo encontrou um ângulo para trazê-la ao presente: por ter conseguido destaque após um matrimônio arranjado aos 14 anos, sofrer pressão para ter filhos que demoraram a chegar e cravar ao seu modo o nome na história, a jovem soberana seria, ela também, feminista. Em 1793, Maria Antonieta tinha 37 anos e da prisão, às margens do Rio Sena, seguiu para a guilhotina, mas não sem pensar no figurino. Foi de branco, cor associada à monarquia, falando para quem quisesse ouvir que os revolucionários haviam lhe tomado a coroa, mas jamais apagariam o seu espírito.

Publicado em VEJA de 17 de outubro de 2025, edição nº 2966

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

15 marcas que você confia. Uma assinatura que vale por todas.

OFERTA LIBERE O CONTEÚDO

Digital Completo

A notícia em tempo real na palma da sua mão!
Chega de esperar! Informação quente, direto da fonte, onde você estiver.
De: R$ 16,90/mês Apenas R$ 3,99/mês
OFERTA EXCLUSIVA

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada revista sai por menos de R$ 7,50)
De: R$ 55,90/mês
A partir de R$ 29,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.