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Parece coisa de Asterix

Refletindo a desunião europeia, o governo direitista da Itália e o presidente centrista da França abrem uma crise nas relações diplomáticas

Por Thais Navarro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 15 fev 2019, 07h00 - Publicado em 15 fev 2019, 07h00

Desde a declaração de guerra de Benito Mussolini, em 1940, não se via coisa igual: a França chamar “para consulta” seu embaixador em Roma, um gesto diplomático dos mais agressivos. A convocação, na quinta-feira 7, exacerbou um bate-boca que se desenrola há meses e contrapõe dois vice-primeiros-ministros da Itália, Matteo Salvini e Luigi Di Maio, de um lado, ao presidente da França, Emmanuel Macron, de outro. No pano de fundo da troca de desaforos — que traz à mente gauleses contra romanos nos quadrinhos de Asterix —, desenha-se a batalha por relevância e voz ativa na política que engolfa a Europa e boa parte do mundo.

O motivo da retirada do embaixador francês foi a postagem de uma foto de Di Maio com organizadores do movimento dos coletes-amarelos, que vem atormentando Macron com seguidas manifestações — a de sábado 9, a 13ª da série, levou às ruas cerca de 50 000 pessoas. A legenda dizia: “Ótima reunião, a primeira de muitas”. E mais adiante: “O vento da mudança cruzou os Alpes”. Diz o professor alemão Emil Kirchner, doutor em política internacional: “Uma das críticas constantes do governo italiano é que as decisões na União Europeia são tomadas de cima para baixo e os cidadãos comuns não são consultados. O protesto dos coletes-amarelos reforça esse ponto”.

Antes disso, em janeiro, Salvini, que fez fama nas redes sociais como um sujeito falastrão, havia incentivado os franceses a “se livrar de um presidente muito ruim”. O pontapé inicial da briga, porém, partiu do francês, que em julho passado classificou de “cínica e irresponsável” a decisão do governo italiano de fechar os portos do país a um navio de refugiados vindo da África. “A desavença entre França e Itália se encaixa no contexto mais amplo da tensão em torno das políticas migratórias”, afirma o cientista político Daniel Kelemen, professor da universidade Rutgers, nos Estados Unidos. “O número de imigrantes caiu desde o auge da crise, mas a questão continua em aberto.”

PERSISTÊNCIA – Coletes-amarelos protestam em Paris pelo 13º sábado seguido: combustível para a troca de farpas (Zakaria Abdelkafi/AFP)

Até Leonardo da Vinci entrou na refrega: Lucia Borgonzoni, vice-ministra da Cultura em Roma, ameaça voltar atrás em um acordo de empréstimo ao Louvre de obras do artista para uma exposição em outubro, em celebração dos 500 anos de sua morte. A extradição de Cesare Battisti, italiano condenado por assassinatos em atentados nos anos 1970 e que por muitos anos se abrigou no Brasil, foi motivo de novo atrito. “Este é o momento de escrever para o presidente da França e pedir-lhe que pare de permitir que terroristas que massacraram italianos continuem livres, bebendo champanhe”, disse Salvini. A Itália quer a extradição de quinze condenados acolhidos pelo governo francês.

Os protagonistas do embate são jovens e se apresentam como alternativa aos velhos partidos. Só que Salvini, de 45 anos, e Di Maio, de 32, estão no lado direito do ringue — o primeiro lidera a Liga e o segundo comanda o Movimento 5 Estrelas, os dois integrantes da coalizão conservadora que governa a Itália desde junho. Já Macron, de 41 anos, apresenta-se como o centrista moderno que abomina o que chamou de “lepra” populista. Cada insulto, e cada reação deles, tem na mira, em última instância, as eleições para o Parlamento Europeu em maio, que vão mostrar para qual lado pende a maioria da população na Europa dividida. Enquanto isso, França e Itália vão cavando seu poço de mágoas, o mais profundo desde que Zinedine Zidane deu uma cabeçada em Marco Materazzi, foi expulso e a Itália ganhou a Copa de 2006.

Publicado em VEJA de 20 de fevereiro de 2019, edição nº 2622

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