Ao menos 11 pessoas morreram, incluindo duas crianças, e outras 3.000 ficaram feridas na terça-feira, 17, no Líbano após uma série de explosões quase simultâneas de pagers utilizados por membros da milícia libanesa Hezbollah. O grupo responsabilizou Israel, prometendo represálias. O governo israelense optou por não comentar as detonações.
O episódio ocorre em um contexto de crescente tensão entre os dois lados. As explosões aconteceram poucas horas antes de um anúncio de militares israelenses de que estavam expandindo seus objetivos na guerra iniciada pelos ataques do grupo militante palestino Hamas, aliado do Hezbollah, em 7 de outubro, para incluir também a luta contra o Hezbollah ao longo da fronteira com o Líbano.
As circunstâncias que possibilitaram o ataque ainda não estão claras. Não existem precedentes na história que se comparem à sabotagem em larga escala desses equipamentos, selecionados para substituir os celulares e utilizados justamente para reduzir o risco de assassinatos pontuais realizados por Israel.
Como ocorreu o ataque?
As explosões tiveram início na capital do Líbano, Beirute, e rapidamente se espalharam por diversas outras regiões do país.
Testemunhas relataram ter visto fumaça saindo dos bolsos das pessoas antes de ouvirem pequenas explosões que lembravam fogos de artifício e tiros. O caos se intensificou quando, após cerca de uma hora de incidentes, dezenas de pessoas começaram a ser levadas a hospitais, sobrecarregando o sistema de saúde.
Um oficial americano, que preferiu não ser identificado, afirmou ao The New York Times que os pagers receberam mensagens que pareciam ter sido enviadas pela liderança do Hezbollah antes de detonarem. Em vez de instruções, essas mensagens parecem ter ativado os dispositivos.
Analistas sugerem que a explicação mais plausível envolve um ataque à cadeia de suprimentos, resultando na adulteração dos pagers durante a fabricação ou transporte.
Uma fonte da segurança libanesa disse à agência de notícias Reuters que uma pequena quantidade de explosivos foi plantada dentro de um novo lote de 5.000 pagers encomendados pelo Hezbollah para seus membros. Relatos indicam que até 3 gramas de explosivos estavam escondidos em cada pager, resultando em 3.000 explosões após o recebimento de mensagens que pareciam vir da liderança do Hezbollah.
“O Mossad injetou uma placa dentro do dispositivo que contém material explosivo acionado por um código. É extremamente difícil de detectar, mesmo com equipamentos ou scanners”, afirmou a fonte, citando a agência de inteligência e espionagem israelense.
O Mossad não comentou sobre o ataque.
A origem dos pagers
A análise de fragmentos dos pagers sugere que eles foram fabricados pela empresa taiwanesa Gold Apollo, mas o CEO da empresa nega.
O fundador, Hsu Ching-Kuang, disse que sua empresa havia assinado um acordo com uma empresa sediada na Hungria, chamada BAC, para fabricar os dispositivos e usar o nome de sua empresa. Ele acrescentou que as transferências de dinheiro tinham sido “muito estranhas”, sem dar mais detalhes.
Registros da empresa BAC revelam que ela foi constituída pela primeira vez em 2022. O endereço registrado revela um prédio indefinido em um subúrbio de Budapeste. A CEO Cristiana Bársony-Arcidiacono disse à rede americana NBC que não sabia nada sobre as explosões. “Eu não faço os pagers. Sou apenas a intermediária. Acho que você entendeu errado”, disse ela.
Não há evidências de que a Gold Apollo tenha sido informada sobre a adulteração de seus dispositivos.
Por que o Hezbollah usa pagers?
O Hezbollah opta por pagers devido à menor suscetibilidade ao rastreamento em comparação aos celulares. Muitos membros do grupo, não apenas líderes, utilizavam esses dispositivos para evitar vigilância israelense.
Os celulares são altamente rastreáveis, pois emitem sinais para se conectar às redes de telefonia, permitindo que sua localização seja determinada. O Hezbollah está ciente desses riscos e alertou seus membros sobre os perigos do uso desses dispositivos. Já os pagers funcionam apenas como receptores, sem emitir sinais rastreáveis. No entanto, o grupo não previu que esses dispositivos poderiam ser utilizados contra eles.
A recente falha de segurança que transformou os pagers em armas explosivas é considerada um dos maiores desastres de contrainteligência enfrentados pelo Hezbollah nas últimas décadas.
Os pagers, dispositivos sem fio que recebem e, em alguns casos, enviam mensagens, mas não realizam chamadas, foram populares nas décadas de 1980 e 1990, mas seu uso diminuiu rapidamente com a ascensão dos celulares nos anos 2000.