A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou a suspensão do direito ao voto da Venezuela na entidade a partir do ano que vem e o impedimento da participação do governo de Nicolás Maduro nas decisões que afetam a agenda da saúde internacional. A medida isolará ainda mais o país e amplia o temor de que questões de saúde não estejam recebendo um tratamento adequado por Caracas.
O motivo da proposta de afastamento é financeiro. Cabe agora aos ministros dos 193 países presentes na Assembleia Mundial da Saúde, que se reúne a partir de segunda-feira (21), decidir o destino da Venezuela. O governo de Caracas não paga suas contribuições obrigatórias à agência de saúde da Organização das Nações Unidas (ONU) desde 2014.
O total da dívida chega a 8 milhões de dólares (30 milhões de reais), valor considerado pequeno em um orçamento de 1 bilhão de dólares (3,6 bilhões de reais) da entidade. Mas, pelas regras, atrasos consecutivos nos pagamentos e a falta de um plano para quitar a dívida resultam na suspensão de voto.
De acordo com o documento da OMS, “se até a abertura da 72ª Assembleia Mundial da Saúde” Caracas estiver em “atraso com seus pagamentos, os privilégios de votos devem ser suspensos desde seu início”. Na prática, a agência está dando até 2019 para que a dívida seja quitada. Caso contrário, a suspensão entrará em vigorar. Se esse cenário se confirmar, a Venezuela entra em um grupo de países afastados que conta ainda com República Centro-Africana, Gâmbia, Guine-Bissau e Sudão do Sul.
A situação humanitária na Venezuela tem sido alvo de uma atenção especial na ONU, particularmente em razão do impacto que isso poderia ter para o Brasil e outros países da fronteira — o temor é que doenças possam se proliferar. A crise venezuelana se reflete em uma hiperinflação que deve chegar a 13.800% este ano, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), além de escassez de alimentos, remédios e todo tipo de bens básico.
Dados suspeitos
Na OMS, a desconfiança vai muito além da dívida com a entidade. A entidade com sede em Genebra passou a não mais confiar nos dados de saúde apresentados pelo governo Maduro. Alguns dos números suspeitos fazem referência ao sistema de saúde, mortalidade e o número de casos de malária. A Venezuela, por exemplo, informou à OMS que registrou apenas uma morte pela malária em 2016. Mas a entidade estima que ocorreram até 280 mortes.
A agência da ONU estima que, em 2017, mais de 400.000 casos foram registrados no país, quase dez vezes mais do que no início da década. Para a entidade, essa realidade já é uma ameaça ao Brasil, diante do fluxo de refugiados e imigrantes que poderia provocar uma nova onda de transmissão.
Em 2010, o país havia informado 45.000 casos de malária. Em 2016, a taxa divulgada pelo governo já era de 240.000. Contudo, nem a OMS acreditou nos dados oficiais e estima que havia 300.000 casos. Agora, para 2017, os dados preliminares da organização apontam 406.000 casos.
Para a agência de saúde da ONU, o risco é o de que esses casos voltem a afetar zonas brasileiras que tinham conseguido se livrar da malária ou reduzir a incidência da doença. Em entrevistas nos últimos meses, ministros de Caracas vêm insistindo que não há uma crise humanitária no país.
(com Estadão Conteúdo)