O plano da Casa Branca para combater a candidatura de Trump à presidência
Assessores de Joe Biden têm uma estratégia para responder ao esperado fluxo constante de ataques do ex-presidente ao atual governo
O ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, após semanas de provocações, confirmou na noite de terça-feira 15 que vai se candidatar à presidência em 2024 pelo Partido Republicano. O anúncio era esperado, e a Casa Branca está preparada. Há meses, assessores do presidente Joe Biden planejam o chamado “projeto Trump”, para combater suas acusações infundadas de que as eleições de 2020 teriam sido fraudadas e que ele seria o verdadeiro vencedor.
Biden passou grande parte do ano passado criticando a agenda que denomina “ultra-MAGA” (acrônimo de “Make America Great Again”, ou Faça a América Grande de Novo, slogan de Trump), tentando manchar a imagem de senadores, governadores e legisladores estaduais republicanos. Agora, ele retornará o foco para seu líder.
Na Casa Branca, um pequeno grupo de assessores presidenciais tem trabalhado para desenvolver um plano de como Biden e a Casa Branca responderão ao que eles esperam ser um fluxo constante de ataques do ex-presidente, agora que ele é formalmente um candidato. Em seu anúncio na terça-feira, ele já afirmou que “Biden e os lunáticos da esquerda radical levando nosso governo até o chão”.
Biden deve continuar enfatizando que Trump é uma ameaça à democracia, mas também está determinado a mostrar que os quatro anos de governo Trump não foram especialmente bons para o povo americano.
Poucas horas antes do discurso de Trump, Biden postou um vídeo no Twitter zombando de falas do ex-presidente sobre ter dado prioridade à “infraestrutura em ruínas” do país. O vídeo, intitulado “A diferença entre falar e entregar”, mostrava Biden assinando um projeto de infraestrutura de US$ 1 trilhão (R$ 5,34 trilhão), justaposta a uma compilação de clipes do ex-presidente usando a palavra “infraestrutura”.
The difference between talking and delivering. pic.twitter.com/TC3X6H3nj0
— Joe Biden (@JoeBiden) November 15, 2022
No meio do anúncio de Trump, ele postou outro vídeo, intitulado “Donald Trump falhou com a América”, mostrando cenas da invasão de eleitores trumpistas ao Capitólio, sede do Congresso americano, em 6 de janeiro de 2021.
Donald Trump failed America. pic.twitter.com/fylyocYcse
— Joe Biden (@JoeBiden) November 16, 2022
O “projeto Trump” é liderado por Anita Dunn, uma das principais estrategistas de comunicação de Biden, e Jen O’Malley Dillon, que comandou a campanha de Biden em 2020 e agora é vice-chefe de funcionários da Casa Branca.
Biden disse na semana passada que “pretende” concorrer em 2024, mas conversaria com sua família antes de anunciar uma decisão no início do próximo ano.
Ainda assim, autoridades disseram que a presença de Trump na corrida o motivaria a concorrer novamente. Biden vê seu antecessor como um mal que precisa ser cortado pela raiz e observa regularmente que é a única pessoa que já derrotou Trump, o que implica que ele seria a melhor escolha para repetir o feiro. Ele disse anteriormente que “não ficaria desapontado” em enfrentar o ex-presidente em uma revanche.
Recentemente, Biden foi encorajado pela performance melhor do que o esperado entre os democratas durante as eleições de meio de mandato, as midterms. Mas ele próprio continua profundamente impopular, com aprovação de 40%, e enfrenta ventos políticos contrários: uma economia ainda fustigada pela inflação, uma guerra sem resolução na Europa e sua idade avançada.
+ A volta por baixo? Trump vai anunciar candidatura num momento ruim
+ Democratas vencem no Senado dos EUA e fortalecem Biden
Antes das midterms, Biden intensificou as críticas ao movimento criado por Trump. Ele atacou “300 projetos de lei discriminatórios” aprovados pelas legislaturas republicanas e condenou o governador do Texas, Greg Abbott, por investigações sobre famílias com pais transgênero. O presidente também acusou Ron DeSantis, governador republicano da Flórida, de banir livros; e Rick Scott, senador republicano do estado, de uma conspiração secreta para aumentar os impostos dos americanos.
O Comitê Nacional Democrata reuniu cerca de 40 pesquisadores para catalogar cada discurso, entrevista de rádio, aparição na TV e artigo de jornal sobre Trump e outros candidatos republicanos, tentando criar o caso mais abrangente contra o ex-presidente e seus aliados nas próximas campanhas.
Na terça-feira, o Partido Democrata anunciou que começaria a contratar funcionários em New Hampshire, Flórida e outros estados que costumam dar mais votos ao Partido Republicano para fiscalizar o que os candidatos presidenciais republicanos dizem quando começarem campanhas para a Casa Branca em 2024. Esta é a ação mais precoce do tipo na história da legenda.
“Hoje é apenas o pontapé inicial para o que será uma primária republicana confusa, com candidatos competindo para ser o republicano mais extremo da corrida”, disse Jaime Harrison, presidente do Comitê Nacional Democrata, em comunicado. “O Comitê Nacional Democrata estará pronto para todos eles.”
+ Ex-assessor de Trump é condenado à prisão por desacato ao Congresso
Outros candidatos republicanos em potencial serão monitorados, incluindo DeSantis e trumpistas como Tucker Carlson, o apresentador direitista da Fox News, e Mike Lindell, CEO da empresa MyPillow, que apoiou as alegações de fraude eleitoral em 2020. Mas Trump ainda receberá atenção especial.
Segundo Biden, sua campanha para a presidência em 2020 foi motivada por Trump. Ao anunciar sua campanha em 2019, ele criticou seu rival por reivindicar uma “equivalência moral entre aqueles que espalham ódio e aqueles com coragem de se opor a ele”, fazendo referência a um evento defendendo a supremacia branca em 2017, na cidade de Charlottesville, Virgínia.
Depois, como presidente, Biden tentou ignorar Trump para evitar dar-lhe espaço na mídia, mas sua entrada formal na corrida presidencial pode acabar com a contenção do líder democrata.
O ex-presidente e o movimento de conservadorismo intransigente que ele criou foram temas centrais nas eleições de meio de mandato, mesmo sem o anúncio formal da candidatura do próprio Trump, já que 91% dos seus candidatos venceram as disputas primárias (briga de republicano contra republicano para decidir quem concorreria com a oposição).
Além disso, as nomeações bem-sucedidas de Trump de três juízes conservadores para a Suprema Corte abriram caminho para a decisão de reverter as proteções constitucionais ao aborto. Biden e os democratas aproveitaram essa decisão como parte fundamental de sua campanha para atrair eleitores às urnas em um país onde o voto não é obrigatório.
Também está na mira dos democratas o apoio de Trump à Associação Nacional dos Rifles, em um ano marcado por mais ataques a tiros em massa, inclusive contra crianças em uma escola Uvalde, no Texas, bem como as tentativas do ex-presidente de tentar reverter os resultados das eleições de 2020, com foco em seu papel na invasão ao Capitólio.
Não está claro até que ponto Trump mantém o controle de ferro sobre os políticos e eleitores republicanos, que ele exerceu de forma tão eficaz durante seus quatro anos na Casa Branca. A maioria dos candidatos que ecoam as acusações de fraude eleitoral foi derrotada – embora por margens estreitas – pelos democratas, que argumentaram que os americanos deveriam rejeitar a agenda do ex-presidente.
+ O ‘Plano Trump’: o que ainda pode estar por vir na estratégia bolsonarista
Ainda não está certo quando, nem se, Biden anunciará formalmente sua própria candidatura. Mas, enquanto isso, o próprio presidente está cada vez mais convencido de que sua missão de remover Trump do cargo – e mantê-lo fora da Casa Branca – ainda não acabou.
“Ninguém identificou mais claramente a ameaça existencial que Donald Trump representa para o país do que Joe Biden”, disse Kate Bedingfield, diretora de comunicações da Casa Branca, antes do anúncio de Trump.