Netanyahu expressa apoio a plano de Trump para tirar palestinos de Gaza
Premiê não comenta a parte da proposta sobre os EUA assumirem controle do enclave; ministro israelense manda Exército preparar saída da população

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, disse na noite de quarta-feira 5 que não vê nada de errado com a proposta do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de tirar palestinos de Gaza e realocá-los em outros países da região, uma ideia que atraiu críticas mundo afora e que viola as leis do direito internacional.
As Nações Unidas e grupos de direitos humanos afirmaram que uma operação dessas equivale a “limpeza étnica”. Além de Trump sugerir que os palestinos no enclave deveriam ser permanentemente deslocados, propôs que os Estados Unidos tomassem controle do enclave.
A proposta de Trump é a transformação mais radical da posição americana sobre o território desde a criação do Estado de Israel, em 1948, e a guerra de 1967, que viu o início da ocupação militar israelense de terras, incluindo a Faixa de Gaza. Segundo a lei internacional, tentativas de transferência forçada de populações são estritamente proibidas.
“O que há de errado com isso?”
Em uma entrevista à emissora americana Fox News, Netanyahu não comentou explicitamente a ideia de Trump sobre os Estados Unidos assumirem o controle da Faixa de Gaza, mas apoiou a ideia de “permitir que os habitantes de Gaza que queiram sair saiam.”
“Quero dizer, o que há de errado com isso? Eles podem sair, podem depois voltar, podem se realocar e voltar. Mas é preciso reconstruir Gaza”, afirmou o premiê israelense.
Netanyahu disse ainda que não acreditava que Trump tenha sugerido enviar soldados americanos para lutar contra o Hamas em Gaza, ou que Washington financiaria os esforços de reconstrução.
“Esta é a primeira boa ideia que ouvi”, pontuou. “É uma ideia notável, e acho que deve ser realmente perseguida, examinada e realizada, porque acho que criará um futuro diferente para todos.”
Saída “voluntária”
Nesta quinta-feira, 6, o ministro da Defesa israelense, Israel Katz, ordenou ao Exército que prepare um plano para a partida voluntária da população da Faixa de Gaza.
“Dei instruções para preparar um plano que permita a saída de qualquer residente de Gaza que deseje, para qualquer país que queira aceitá-los”, afirmou. “O plano incluirá opções de saída através de passagens terrestres, bem como arranjos especiais para saídas por mar e ar”, acrescentou.
Katz, membro da coalizão de extrema direita que sustenta o governo Netanyahu, também sugeriu cinicamente que os países que se opuseram a operações militares israelenses em Gaza deveriam receber os palestinos que deixarem o enclave voluntariamente.
“Eu celebro o plano ousado do presidente Trump, os moradores de Gaza devem ter a liberdade de sair e emigrar, como é a norma em todo o mundo”, disse Katz, segundo a rede israelense Canal 12. “Países como Espanha, Irlanda, Noruega e outros, que fizeram acusações e falsas alegações contra Israel sobre suas ações em Gaza, são legalmente obrigados a permitir que qualquer morador de Gaza entre em seus territórios.”
Ele acrescentou: “A hipocrisia deles será exposta se eles se recusarem a fazê-lo. Há países como o Canadá, que tem um programa de imigração estruturado, que já expressaram a disposição de aceitar moradores de Gaza”.
Proposta indecente
Trump vem sugerindo repetidamente que os palestinos deveriam ser acolhidos por nações árabes da região, como Egito e Jordânia, uma ideia rejeitada tanto por essas nações quanto pelos líderes palestinos. Na terça-feira 4, o republicano voltou a defender a proposta de uma realocação permanente, dizendo que Gaza é um “local de demolição”. “Espero que possamos fazer algo para que eles não queiram voltar. Quem iria querer voltar? Eles não tiveram nada além de morte e destruição”, afirmou após reunião com Netanyahu na Casa Branca.
Além disso, afirmou que vislumbra a possibilidade de os Estados Unidos permanecerem no controle de Gaza “no longo prazo” e que o propósito seria levar “estabilidade” ao enclave e ao Oriente Médio. Trump também não descartou enviar tropas americanas a Gaza: “No que diz respeito a Gaza, faremos o que for necessário. Se for necessário, faremos isso”.
Os assessores de Trump defenderam sua proposta, mas recuaram em alguns elementos após a condenação internacional.
A porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, afirmou na quarta-feira que Trump, na verdade, não se comprometeu a enviar militares americanos para a Faixa de Gaza.
Em coletiva de imprensa, ela disse a repórteres que o presidente acredita que Washington precisa se envolver na reconstrução de Gaza “para garantir a estabilidade na região”, mas que “não vão pagar” por isso. Também disse que soldados não vão “pisar lá”, embora não tenha especificado como os Estados Unidos poderiam tomar o controle do território sem usar força militar. Ainda negou que a proposta de Trump de tirar os palestinos do enclave seja permanente, afirmando que o presidente americano está “comprometido com a realocação temporária dos que estão lá”.
Leavitt não foi a única a contradizer o presidente. Falando com repórteres na Guatemala, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, sugeriu duas vezes que Trump estava apenas propondo limpar e reconstruir Gaza, e não reivindicar posse indefinida do território. Steve Witkoff, enviado especial para o Oriente Médio do governo, declarou a senadores republicanos em um almoço a portas fechadas que seu chefe “não quer colocar nenhum soldado dos Estados Unidos no território, e ele não quer gastar nenhum dólar americano” em Gaza, informou o jornal The New York Times.
Mais cedo, quando questionado pela imprensa no Salão Oval sobre as reações negativas às suas declarações sobre o território palestino, Trump negou que seu plano tenha sido mal recebido: “Todo mundo ama”.
Rechaço geral
A proposta, que segundo o republicano poderia criar uma “Riviera do Oriente Médio”, porém, foi rapidamente condenada pela comunidade internacional. Nesta quarta-feira, o Escritório de Direitos Humanos da ONU, com sede em Genebra, afirmou que “qualquer transferência forçada ou deportação de pessoas de território ocupado é estritamente proibida”.
Anteriormente, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, disse que o projeto equivaleria a uma “limpeza étnica” e colocaria em risco de “tornar impossível um Estado palestino para sempre”. As propostas de Trump, se realizadas, envolveriam uma população de mais de 2 milhões de pessoas.
O representante palestino na ONU, Riyad Mansour, disse que líderes mundiais devem respeitar o desejo dos palestinos de permanecer em Gaza.
“Nossa pátria é nossa pátria, se parte dela for destruída, a Faixa de Gaza, o povo palestino escolheu retornar a ela”, disse ele. “Acredito que os líderes e o povo devem respeitar os desejos dos palestinos.”
Países como França, Espanha, Reino Unido e Rússia se posicionaram contra a medida e condenaram qualquer avanço em direção à retirada de palestinos de suas terras. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jian, alertou que irá se opor à “transferência forçada” de palestinos, dizendo defender um governo formado por palestinos para governar para os palestinos como “princípio básico da governança de Gaza no pós-guerra”.
A Arábia Saudita, potência regional com quem Trump tenta fortalecer os laços com Israel, afirmou que não normalizará relações com Tel Aviv sem a criação de um Estado palestino e rejeitou qualquer tentativa de deslocar os palestinos de suas terras.
“A Arábia Saudita também reitera sua rejeição inequívoca, anunciada anteriormente, de qualquer violação dos direitos legítimos do povo palestino, seja por meio de políticas de assentamento israelenses, da anexação de terras palestinas ou de tentativas de deslocar o povo palestino de suas terras”, afirmou o Ministério das Relações Exteriores de Riad.