Justiça indiana confirma legalidade da maior base de biometria do mundo
Criticado por violar a privacidade, sistema reúne impressões digitais e scanner da íris; cadastro será obrigatório para acesso a programas sociais
A Suprema Corte da Índia confirmou nesta quarta 26 a legalidade da base de dados biométricos Aadhaar, a maior do mundo. O tribunal, no entanto, limitou o uso do sistema de identificação, considerado por críticos como um possível “Big Brother”.
Uma grande ferramenta de desenvolvimento, de acordo com o governo, e um possível sistema de vigilância, segundo os críticos, Aadhaar (“Fundação” em hindi) se tornou um dos temas mais polêmicos nos últimos anos neste país.
Criada em 2009 a partir de dados biométricos (impressões digitais, scanner da íris, entre outros), a base Aadhaar foi concebida como um recurso de identificação para os mais pobres. Quase uma década depois de sua implantação, o registro é quase obrigatório para ter acesso a vários serviços, como escolas, bancos, exames médicos ou telefones celulares.
Até o momento, o sistema Aadhaar forneceu uma carteira de identidade e um número único de doze cifras a mais de 1,2 bilhão de indianos. A base de dados facilita o sistema de identificação no país, já que muitos cidadãos não possuem outra forma de documentação.
Somente 65 milhões de pessoas têm passaporte e 200 milhões, carteira de motorista. Não havia outro documento oficial de identificação no país além destes antes do Aadhaar.
Em uma decisão aguardada há anos, um painel de cinco juízes da Suprema Corte considerou que a base de dados está de acordo com a Constituição do país.
O tribunal estipulou que o registro no Aadhaar é necessário para ter acesso a subsídios ou programas sociais do governo. Esta utilização constituía o princípio básico do projeto, criado quando o Partido do Congresso estava no poder.
A base de dados “dá dignidade às comunidades marginalizadas (…). Seus benefícios superam os pontos negativos”, afirmou o juiz AK Sikri durante a leitura da decisão.
A Corte, no entanto, proibiu o uso da base por empresas. A utilização do sistema por organismos privados havia se transformado na parte mais invasiva do sistema na vida da população indiana nos últimos anos.
Dessa forma, cidadãos do país não podem ser obrigados a apresentar seu registro no Aadhaar para abrir contas em bancos, contratar serviços de telefonia ou se matricular em instituições de ensino privadas.
Desde sua chegada ao poder em 2014, o grupo nacionalista hindu do primeiro-ministro Narendra Modi passaram a apoiar o uso do Aadhaar em diversos setores.
Vida privada
A decisão da Suprema Corte “alivia os cidadãos normais, pois a instituições privadas não poderão mais pedir o número do Aadhaar para serviços como a obtenção de um chip de celular, a matrícula na escola ou para uma viagem”, afirmou o advogado e ativista Prashant Bhushan.
O debate sobre a base de dados Aadhaar envolve temas fundamentais como o direito à vida privada, à exclusão, à proteção dos dados pessoais e o equilíbrio entre vantagens e possíveis riscos da tecnologia.
Para os críticos do projeto, a vinculação do Aadhaar a qualquer tipo de serviço abria uma porta muito perigosa.
“Se você tem o mesmo número (de identificação) em cada base de dados, nas passagens para viajar, no telefone, no banco, então qualquer pessoa no ministério do Interior ou no serviço de inteligência pode obter todas as informações sobre esta pessoa”, afirmou no ano passado Reetika Khera, professor de Economia no IIT Delhi.
Durante a análise do caso Aadhaar, a Suprema Corte teve que determinar previamente se os cidadãos indianos tinham o direito constitucional à vida privada, o que foi confirmado em agosto de 2017.
Com base nessa mesma sentença, o tribunal descriminalizou recentemente a homossexualidade na Índia.
(Com AFP)