Guaidó convoca protestos nesta terça-feira na Venezuela contra apagão
Presidente interino pede a militares que não impeçam as manifestações e ordena a seus representantes diplomáticos a coordenação de apoio internacional
O autoproclamado presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, convocou protestos em todo o país para a terça-feira 12, contra o apagão que mantém a nação petroleira em colapso há cinco dias.
“Amanhã, às 3 da tarde [16 horas de Brasília], toda a Venezuela nas ruas”, conclamou, ao presidir a sessão da Assembleia Nacional em que foi aprovado um decreto legislativo de “emergência nacional” por causa do blecaute.
Ao justificar a medida, Guaidó classificou como “catástrofe” a situação enfrentada no país por cidadãos já mergulhados em sérias dificuldades por causa da crise econômica que assola a maioria dos venezuelanos. Desde o início do blecaute, na quinta-feira 7, 21 pessoas morreram em hospitais devido ao desabastecimento de energia. Entre elas, cinco bebês.
Segundo Guaidó, já começa a faltar água em boa parte do país, a comida está apodrecendo, o transporte e as comunicações estão interrompidos ou instáveis. “Não há normalidade na Venezuela, e nós não vamos permitir que se normalize a tragédia (…), por isso o decreto”, afirmou o líder da oposição, acrescentando que “tudo [é] produto da corrupção e da imperícia do regime”.
No decreto, o autoproclamado presidente interino pede a “cooperação internacional” para superar a grave crise e ordena a seus representantes diplomáticos no exterior que coordenem o apoio estrangeiro. Também solicita aos militares que não impeçam nem criem obstáculos para os protestos contra os apagões.
O apelo do opositor é mais um ato para culpar e pressionar o presidente Nicolás Maduro pela falta de energia elétrica que paralisa a Venezuela. “Não podemos virar a cara para a tragédia que vive nosso país”, acrescentou o político, reconhecido como presidente interino por cinquenta países.
Não há projeções sobre o alcance e as possibilidades da aplicação da “emergência nacional” em um país onde Maduro tem o apoio das Forças Armadas e o controle de todas as instituições.
Para minimizar as consequências da crise elétrica, o governo prorrogou a suspensão de jornadas de trabalho e de aulas nas escolas, que havia decretado na quinta-feira passada
A luz voltou por poucos momentos em algumas regiões nesta segunda-feira, mas a crise continua. Na madrugada, uma subestação elétrica entrou em pane e explodiu em Caracas por causas desconhecidas, agravando a situação na mesma área onde foram registrados saques no domingo.
Muitas casas têm caixas de água porque sempre há racionamento na Venezuela. Mas as bombas não funcionam sem energia. Em Caracas, moradores fazem fila para conseguir se abastecer nas fontes d’água aos pés da Montanha Ávila.
Por causa da situação, o governo vai começar a distribuir alimentos e água potável nas áreas mais carentes.
“Situação explosiva”
Os geradores de energia dos hospitais se concentram nas salas de emergência. Segundo a organização não governamental Codevida, quinze doentes renais morreram por falta de tratamento. A ONG Médicos pela Saúde informou haver 21 mortos em hospitais, mas o governo sustenta que não há falecidos.
Muitas lojas estão fechadas e há poucas mercadorias disponíveis. Há meses os venezuelanos sofrem com a falta da desvalorizada moeda corrente. Até uma pequena compra é feita por meio de transferência eletrônica, afetada pelo apagão. Muitos comerciantes estão vendendo água, carne, gasolina e até gelo em dólares.
Ao cair da noite, com as ruas às escuras, surge o temor da ação da delinquência nesse país com altos índices de violência. Há pouco transporte e longas filas se formam nos postos de combustível devido ao medo de desabastecimento, já que as bombas dependem de energia para funcionar.
“Preocupa que a Venezuela esteja entrando numa fase de colapso total, porque o país tem uma situação explosiva”, afirma o cientista político Luis Salamanca.
No aeroporto internacional de Maiquetía também há caos. As autoridades registram manualmente a entrada e saída de passageiros. Com um êxodo de mais de 3 milhões de venezuelanos desde 2015, a falta de comunicação com parentes no exterior também é angustiante.
Nova etapa da crise
Maduro sustenta que o apagão foi provocado por “um ataque cibernético eletromagnético” cometido pelos Estados Unidos contra a hidroelétrica de Guri, no Estado de Bolívar (ao sul), a principal da Venezuela e a segunda maior da América Latina, depois de Itaipu.
Já Guaidó defende que a crise de energia começou após um incêndio que afetou as torres de transmissão da hidroelétrica e que também é resultado de falta de manutenção e de investimentos e da corrupção.
“Não podemos nos acostumar com emergência. Não devemos agradecer a uns ladrões por nos devolver a normalidade. Senhores da Força Armada, é o momento, não há nada mais”, disse Guaidó, que tenta romper a principal base de apoio de Maduro, os militares.
Para o analista político e economista venezuelano Luis Vicente León, “este episódio é o resultado da destruição sistemática do país em duas décadas, mas também o início de uma nova dimensão de deterioração”. Para ele, haverá mais “radicalização das partes, sanções mais agudas e protestos”.