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EUA debatem legalidade de armas impressas em 3D; veja como funcionam

Kits com peças para a montagem de fuzis e pistolas podem ser comprados por 1.000 dólares na internet; impressão total em casa exige conhecimento

Por Solly Boussidan Atualizado em 8 ago 2018, 07h37 - Publicado em 8 ago 2018, 07h00

Há dez anos, fabricar armas de fogo usando impressoras 3D poderia parecer enredo de ficção científica. Mas, em 2018, a prática se tornou realidade. No início da semana, um juiz federal dos Estados Unidos proibiu temporariamente a publicação de manuais para imprimir fuzis AR-15 e uma arma de plástico chamada de Liberator, que utiliza essa nova técnica.

A decisão pode dar início a uma batalha judicial entre organização pró-armas, como a Associação Nacional do Rifle (NRA, na sigla inglesa), e autoridades contrárias à distribuição desses arquivos.

A Defense Distributed, organização sem fins lucrativos sediada no Estado do Texas, havia obtido permissão do governo americano para desenvolver e divulgar arquivos digitais que poderiam simplesmente ser baixados por qualquer pessoa para imprimir armas em casa. A permissão fora concedida com base no princípio da liberdade de expressão e de publicação, garantida pela primeira emenda da Constituição dos Estados Unidos.

Algumas autoridades, incluindo os governos dos estados de Washington e da Califórnia, se mobilizaram para frear a iniciativa. Elas argumentam que as armas de plástico não são rastreáveis e representam um perigo para a segurança das comunidades americanas. Até o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, um aliado da NRA, publicou em seu Twitter que a proposta “não parece fazer muito sentido”.

O fundador da Defense Distributed, Cory Wilson, indicou que vai recorrer da decisão do juiz federal Robert Lasnik, da cidade de Seattle, que impediu a publicação dos arquivos ao menos até o próximo dia 10. Wilson argumenta que tem direito constitucional de distribuir os materiais.

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Uma arma em 24h

AFP PHOTO / Robert MacPherson (Robert MacPherson/AFP)

A arma de plástico chamada de Liberator (foto ao lado), aquela proibida por decisão da Justiça Federal americana, pode ser fabricada integralmente em casa, com impressora 3D, em menos de 24 horas e ao custo de 150 reais. A única peça a ser adicionada ao modelo de plástico impresso é um prego comum.

Mas não se trata de um produto durável. Ao ser disparada uma única vez, a arma derrete.

Há outras opções no mercado online para a compra das peças e a montagem em casa, como um brinquedo, de armas bem mais potentes, como um fuzil AR-15 e uma pistola automática Glock . Os portais do eBay e da Amazon oferecem, ao custo total de cerca de 1.000 dólares, esses kits de ghost gun.

Essas armas fantasmas tendem a se tornar objetos do desejo de pessoas mal-intencionadas e de organizações criminosas, além de enormes desafios para os setores de segurança pública e privada. Ao contrário das pistolas e rifles que podem ser comprados em lojas, feiras de armas e até em supermercados americanos, as impressas não têm número de série. Não são, portanto, rastreáveis pela polícia.

O que é a impressão 3D?

A impressão 3D é uma tecnologia relativamente moderna que permite a fabricação de objetos a partir de fios de polímero (geralmente, o ABS, plástico comum em forma de filamento), de alumínio, de nylon, de alguns metais e de filamentos especiais biodegradáveis ou misturados a fibras de carbono. A partir dos dados tridimensionais, gerados em softwares específicos, a impressora deposita o material em camadas, seguindo padrões milimétricos e muito específicos.

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A possibilidade de impressão de objetos permite uma série de aplicações específicas que, em tese, barateiam o custo da prototipagem de peças –– de celulares a partes de veículos. A maior vantagem, no entanto, é a possibilidade de criação de peças sob medida e bastante específicas, que vão de próteses individualizadas no campo da saúde a partes detalhadas de estruturas de aviões.

Há duas tecnologias principais em uso atualmente. A impressão FDM (sigla em inglês para modelamento em deposição fundida) é a mais comum e barata. Trata-se da tecnologia utilizada para a fabricação de armas em impressão 3D, que está em julgamento nos Estados Unidos. Uma impressora 3D FDM custa entre 250 e 100.000 dólares americanos.

Outra tecnologia bastante difundida é a SLA/DLP, conhecida em português como estereolitografia, com impressoras que custam entre 2.000 e 200.000 dólares americanos.

Por fim, há uma terceira tecnologia bastante comum conhecida como impressão manufatura ou Fresa-CNC. Esse tipo de impressora cria objetos tridimensionais de maneira oposta às anteriores — a partir de um bloco maciço de polímero, madeira, metal ou pedra preciosa, o equipamento retira material, esculpindo o objeto em 3D. A tecnologia ainda é a mais cara e tem aplicação industrial também — custa entre dois mil e 500.000 dólares americanos adquirir uma Fresa-CNC.

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Comunidade

“Imprimir em 3D pode ter ficado mais simples, mas ainda exige certo conhecimento”, explica Eric Sachs Kindi, 25. Formado em engenharia mecânica, ele fundou em 2017 a Teiú 3D Impressões com o amigo Rafael Elkabets, 25, na Vila Madalena, em São Paulo.

Segundo Kindi, existe na Internet uma comunidade que se ajuda, passando os “macetes” da tecnologia para quem imprime de forma amadora. “Há sites como o Thingiverse que funcionam como grandes bibliotecas de arquivos 3D, com quase todos os arquivos abertos, muito pouco restrito ou pago”, explica o engenheiro.

“Se a pessoa não tem conhecimento de modelagem 3D e noções específicas de design e engenharia em software, mesmo com uma boa impressora 3D, ela vai acabar restrita ao download de modelos prontos da Internet, sem poder usar todo o potencial criativo oferecido pela tecnologia”, acrescenta Elkabets.

Ambos contam que a impressão 3D é febre na comunidade maker, pessoas que gostam de produzir suas próprias coisas. “As pessoas imprimem desde objetos de decoração a capinhas de celular e brinquedos, mas é possível imprimir maquetes e até jóias nas máquinas”, conta Kindi.

Segundo seu sócio, Elkabets, a imaginação é o limite para esse tipo de equipamento. “Tudo o que pode ser desenhado pode ser impresso”, resume.

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Custo

A dupla empreendedora explica que o custo de produtos impressos em 3D caiu consideravelmente nos últimos anos. “São basicamente três itens que entram na conta”, afirma Elkabets enquanto segura um par de vasos cor de cobre impressos em seu ateliê.

“Há obviamente o custo hora-máquina, que inclui a depreciação, manutenção, energia consumida, e a operação das impressoras. Os materiais são o segundo item: enquanto 1 quilo de polímero para impressão FDM sai por cerca de 120 reais, polímeros e fibras especiais para objetos em SLA podem custar mais 1.400 reais por quilo. Mas o que realmente define o preço é o custo criativo, da modelagem em 3D”, explica.

Kindi conta que o processo inclui entender a ideia ou problema do cliente, criar uma solução em software, de forma especializada e que pode levar algum tempo, para só então passar ao processo da produção física. O custo tende a ser mais barato do que no varejo, se o que se busca é algo único ou específico.

“Imprimir um copo simples em 3D acaba custando mais do que comprar um copo no varejo”, explica. “O incrível da impressão 3D é o grau de detalhamento que ela permite. Um protótipo ou um produto novo costumava ser enviado a um artesão para a modelagem em argila ou, em alguns casos, para usinagem em alumínio. Era um processo que levava dias e podia ter um custo altíssimo para um simples molde que podia não servir para nada”, fala.

Eric começou na área de impressão 3D em 2015, por brincadeira, ao adquirir uma máquina na faculdade ao custo de 350 dólares. Ele imprimiu uma garra hidráulica de salvamento como parte de seu Trabalho de Conclusão de Curso. Rafael, seu amigo da época de ensino médio e também estudante de engenharia, adorou a ideia e comprou o mesmo equipamento.

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A brincadeira virou negócio quando, em 2017, decidiram criar a Teiú 3D. Na loja e atelier, eles desenvolvem produtos específicos, peças personalizadas, produtos em pequenos lotes, brindes corporativos e artigos de decoração. “Uma capinha de celular personalizada fica pronta em 3 a 4 horas e pode custar a partir de 50 reais”.

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