Às vésperas de partir para um périplo por Argentina, Chile e Brasil, o chanceler alemão Olaf Scholz declarou: “A América Latina tem um potencial inacreditável”. Não era a primeira vez. Em visita ao Brasil em 2013, como prefeito de Hamburgo, já havia declarado que a região apresentava “um potencial incrível”. Superlativos à parte, Scholz, acompanhado de uma vasta comitiva de industriais, percorreu as três maiores economias sul-americanas atrás de bons negócios para uma Alemanha abalada pela conjunção de efeitos da pandemia e da guerra na Ucrânia. Sem falar na concorrência chinesa — só no Brasil, a participação dos produtos alemães nas importações caiu pela metade nos últimos vinte anos (está em 5,1%), enquanto a China subia ao topo do pódio (22,8%). “A relação comercial entre os dois países desmoronou”, diz um relatório da Fundação de Ciência e Política, de Berlim.
Na passagem pelo Planalto, na segunda-feira 30, a primeira de um líder alemão desde 2015, Scholz não poupou rapapés. “Vocês fizeram falta, caro Lula”, declarou, deixando clara a satisfação com a troca de governo. Se em Buenos Aires, com discussões sobre a exploração do lítio, e em Santiago, com a criação de uma “força-tarefa hidrogênio” para suprir a demanda alemã do produto, o chanceler e sua comitiva debateram propostas concretas, em Brasília as questões se mostraram mais simbólicas.
A estrela oficial do encontro foi o Fundo Amazônia, desativado desde 2019 devido à má gestão ambiental do ex-presidente Jair Bolsonaro e agora ressuscitado com o aporte de 192 milhões de reais da Alemanha (parte de um pacote de 1 bilhão de reais para o meio ambiente). Falou-se sobre o adormecido acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, que Lula prometeu fechar “até o fim do semestre”, e sobre uma maior cooperação tecnológica — mais de 1 000 empresas da Alemanha atuam no Brasil, o que faz de São Paulo o maior polo industrial alemão fora do país. Foi, na descrição do telejornal Tagesschau, uma “ofensiva de charme”. Resta ver se, depois dela, a relação Alemanha-Brasil conseguirá explorar, enfim, seu “potencial inacreditável”.
Publicado em VEJA de 8 de fevereiro de 2023, edição nº 2827