LITERATURA
A história de vida do escritor Abdulrazak Gurnah, de 73 anos, se confunde com sua obra. Nascido no arquipélago africano de Zanzibar, na Tanzânia, Gurnah deixou seu país aos 18 anos, fugindo da perseguição do governo autoritário de Abeid Karume (1905-1972) contra os cidadãos da minoria árabe — opressão que culminou em um massacre com pelo menos 2 000 mortos. O jovem se instalou na Inglaterra, que pouco antes encerrara seu domínio colonial sobre Zanzibar. No exílio, a literatura se tornou não só um refúgio, como também uma ferramenta poderosa para Gurnah registrar com perspicácia as aflições de um imigrante longe do lar. O sentimento mais patente em sua escrita é o do estranho no ninho, dividido entre suas origens e um novo mundo que o observa como um forasteiro indesejado. De forma explícita ou nas entrelinhas, ele desenterra as raízes dessa divisão, fincadas na relação entre colonizador e colonizado. O romancista, assim, põe em xeque o caráter autobiográfico de sua obra: segundo ele, sua experiência é “a história da humanidade hoje”.
A enxuta produção de Gurnah, composta de contos e dez novelas, transita pela história da África e da Europa, do passado pré-colonial até seus efeitos em tempos contemporâneos. Professor de literatura na Universidade de Kent, em Canterbury, no sudeste da Inglaterra, Gurnah se revelou um nome de óbvio apelo para o comitê do Nobel diante do atual esforço de intelectuais e jovens europeus para expiar os pecados de seu passado escravagista e imperialista. O peso na consciência tem levado museus a devolver obras saqueadas pelas antigas potências coloniais na América Latina, África e Ásia. O mesmo combustível alimenta ativistas que vandalizam estátuas de escravocratas.
Em seus dois primeiros livros, Memory of Departure (1987) e Pilgrim’s Way (1988), Gurnah acompanha jovens africanos, um ainda no continente e outro no Reino Unido, entre as agruras da necessidade de partir e do preconceito fora de seu país. Seu título mais popular, Paradise (1994), viaja para o fim do século XIX, no leste africano, e observa, pelos olhos de um rapaz local, a invasão alemã. Tamanha bagagem sagrou Abdulrazak Gurnah vencedor do Nobel da Literatura de 2021 na quinta-feira 7.
MEDICINA
Laureados: o americano David Julius e o libanês radicado nos Estados Unidos Ardem Patapoutian.
Por que ganharam: pelas descobertas sobre temperatura e toque.
Utilidade prática: o conhecimento auxilia no tratamento de uma série de doenças, incluindo as dores crônicas.
FÍSICA
Laureados: o japonês Syukuro Manabe, o alemão Klaus Hasselmann e o italiano Giorgio Parisi.
Por que ganharam: pelo entendimento dos chamados sistemas físicos complexos ligados às mudanças climáticas.
Utilidade prática: a aferição e o cálculo do crescimento das concentrações de dióxido de carbono na atmosfera — atalho para o aumento da temperatura na superfície da Terra — são ferramentas decisivas de controle ambiental.
QUÍMICA
Laureados: o alemão Benjamin List e o britânico David MacMillan.
Por que ganharam: por causa do desenvolvimento de catálises orgânicas assimétricas, um modo de construção molecular mais simples.
Utilidade prática: a ferramenta é útil para a pesquisa de novos produtos farmacêuticos e ajudou, recentemente, a tornar a química mais verde, menos prejudicial ao ambiente.
Publicado em VEJA de 13 de outubro de 2021, edição nº 2759