Datas: Frank Borman e Joan Jara
O discreto chefe da Apollo 8 e a mulher que dedicou a vida pela memória

Três frases, e apenas três, definem a aventura humana na conquista da Lua. Houve o indelével comentário de Neil Armstrong ao pisar no satélite natural, em 20 de julho de 1969, no auge da missão Apollo 11: “É um pequeno passo para um homem, um grande salto para a humanidade”. Depois, em 11 de abril de 1970, Jack Swigert, um dos cosmonautas da Apollo 13, alertou, ao notar a explosão de um tanque de oxigênio: “Houston, temos um problema”. Mas antes, em 24 de dezembro de 1968 — preâmbulo do que viria depois —, a tripulação da Apollo 8 deu a primeira volta ao redor da órbita lunar, em transmissão ao vivo pela TV, com uma nota igualmente eterna. Frank Borman, o discretíssimo chefe da trupe, pediu a palavra. Citou o livro do Gênesis, da Bíblia, e encerrou com um par de frases comoventes, dada a singeleza em oposição à grandeza do momento: “A tripulação da Apollo 8 fecha com boa noite, boa sorte e um feliz Natal, e Deus abençoe a todos vocês na boa Terra”.
Na boa Terra, o mar não estava para peixe. Vivia-se o auge da Guerra do Vietnã, Bob Kennedy e Martin Luther King tinham sido assassinados. Havia a busca pela filosofia paz & amor dos hippies, o grito revolucionário dos estudantes parisienses e a coragem da oposição contra a ditadura no Brasil, mas era um tempo complicado. Tão ruim que a bênção de Borman soou como poesia.
Um registro daquele momento virou ícone da platitude possível do nosso planeta visto do espaço: a fotografia conhecida como Earthrise, o “Nascer da Terra”, na qual se vê o azul ao longe contra a silhueta cinzenta da Lua. Durante muito tempo, houve quem atribuísse o registro a Borman — mas ele mesmo, modesto, trataria de negar a autoria. A foto foi feita por um colega de voo, William Anders. Aquela imagem inspirou Caetano Veloso a compor uma de suas mais belas canções, Terra, lembrança do tempo de cadeia: “Quando eu me encontrava preso / Na cela de uma cadeia / Foi que eu vi pela primeira vez / As tais fotografias / Em que apareces inteira / Porém lá não estavas nua / E sim coberta de nuvens”. Borman morreu em 7 de novembro, aos 95 anos.
Uma vida pela memória

Foi abominável. Preso pelos soldados a mando do general golpista Augusto Pinochet, em 11 de setembro de 1973, o compositor e cantor Víctor Jara foi torturado até a morte. Levado ao Estádio Chile — que hoje leva seu nome —, teve as mãos decepadas e foi sumariamente fuzilado. Sua viúva, Joan Jara, partiu para o exílio em Londres, com as duas filhas, uma delas com Víctor. Ao retornar a Santiago, em 1984, dedicou a vida a descobrir quem matara o marido. Em outubro deste ano, a polícia americana prendeu o ex-militar Pedro Pablo Barrientos, acusado do crime. Ele será extraditado neste mês. Joan morreu em 12 de novembro, em Santiago, aos 96 anos.
Publicado em VEJA de 17 de novembro de 2023, edição nº 2868