Emparedado por um processo de impeachment que tinha tudo para terminar com sua destituição, o presidente do Equador, Guillermo Lasso (o senhor de gravata azul na foto), de centro-direita, agravou ainda mais a crise política que há meses assola o país. Em uma canetada, dissolveu a Assembleia Nacional e convocou novas eleições para a Presidência e o Parlamento, que devem ocorrer em até seis meses. Até lá, governará por decreto. O dispositivo, apelidado de “morte cruzada”, dado seu poder de abalar as estruturas, nunca tinha sido usado, mas está previsto na Constituição. “É a melhor decisão para abrir caminho para a esperança”, discursou, enquanto tropas do Exército cercavam o Congresso. Acusado de peculato, em razão da alteração de um contrato da estatal Flota Petrolera Ecuatoriana, Lasso, que obviamente nega tudo e diz ter agido em nome do Estado, já havia se livrado de outro processo de impedimento, há quase um ano. De lá para cá, a situação escalou, graças a manifestações constantes organizadas por grupos indígenas ligados ao ex-presidente Rafael Correa, de esquerda, que protestam contra o aumento do custo de vida e a explosão da violência atrelada ao narcotráfico. Eleito em 2021, sob promessas de modernização da economia, após o desastre da gestão da pandemia do socialista Lenín Moreno, o ex-banqueiro agora protagoniza o terceiro episódio sucessivo de ameaça de desestabilização da democracia na América Latina — o Brasil, em 8 de janeiro, e o Peru foram os anteriores. A região merecia governantes melhores.
Publicado em VEJA de 24 de maio de 2023, edição nº 2842