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Como a ditadura da Coreia do Norte esconde Kim Jong-un

Somente um país fechado faria o mundo discutir a vida e a morte de seu chefe. O que vale é a imagem (e os riscos das ogivas nucleares)

Por Julia Braun Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 1 Maio 2020, 09h18 - Publicado em 30 abr 2020, 19h49

Tantos problemas, contágios e mortes acontecendo diariamente, à vista de todos, e eis que as atenções se voltam de repente para um sumiço: que fim teria levado o tão gorducho quanto elusivo Kim Jong-un, dirigente da Coreia do Norte? O vaidoso líder supremo, de estimados 36 anos, que não perde a chance de se exibir, deixou até de abrilhantar com sua pessoa um dos mais importantes feriados nacionais, o aniversário do avô Kim Il-sung, fundador da sucessão hereditária no bastião comunista. Pronto: foi a deixa para que dissidentes levantassem a hipótese, confirmada por uma fonte não identificada da inteligência americana, de que Kim teria passado por uma cirurgia cardiovascular e se encontraria em estado grave — falou-se até em morte cerebral. Na segunda-feira 27, a Coreia do Sul, a maior autoridade em mistérios do vizinho do norte, cravou a notícia de que “Kim Jong-un está vivo e passa bem”, hospedado no luxuoso condomínio da família em Wonsan, balneário na costa leste do país.

Rumores sobre o estado de saúde dos ditadores norte-coreanos, detentores de ogivas nucleares e de mal com quase todo o resto do mundo, sempre provocam arrepios, ainda mais porque romper a barreira de silêncio erguida em torno da Coreia do Norte e checar sua veracidade é um pesadelo para os serviços de inteligência ou veículos de comunicação do Ocidente que lidam com informações confiáveis. A via da interceptação de comunicações é tortuosa. O regime proíbe o uso da internet e oferece uma conexão doméstica limitada, além de canais de televisão e estações de rádio que só transmitem a programação oficial. O governo ainda controla a única operadora de telefonia e bloqueia ligações não autorizadas. “É um desafio enorme hackear acessos à internet doméstica e às comunicações norte-coreanas. O país está bem adiantado em cibersegurança, que utiliza para a proteção própria e para ataques eletrônicos a outras nações”, diz Yangmo Ku, professor da universidade militar de Norwich, nos Estados Unidos, e especialista em política coreana.

A NÚMERO 2 - Kim Yo-jong: sobrou apenas a irmã na linha de sucessão (Jorge Silva/Pool/Reuters)

O recurso de infiltrar espiões também não é fácil. As fronteiras são rigidamente controladas, e os poucos visitantes, investigados e monitorados durante a estada, não podem manter nenhum contato com a população, ela igualmente vigiada. Obter informações fica a cargo, principalmente, dos poderosos satélites apontados para o que acontece na Coreia do Norte. Um deles identificou o trem exclusivo de Kim parado em uma estação privativa em Wonsan, o que veio reforçar a suspeita de sua presença na cidade. Não se achou explicação para o sumiço — ainda que pronunciamentos e cartas com sua assinatura continuassem a ser divulgados. A hipótese de que teria se isolado por causa da pandemia foi levantada, muito embora o governo garanta, sem credibilidade alguma, não haver um único caso de contágio acima do Paralelo 38.

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Informações sobre o líder supremo são segredos de Estado confiados a um restrito grupo de oficiais leais ao regime. “O objetivo do governo norte-coreano é unicamente proteger a dinastia Kim. Todo o resto é secundário”, afirma Soo Kim, ex-analista da CIA e comentarista política da Rand Corporation. Uma sucessão neste momento seria especialmente complicada pela falta de herdeiro evidente. O Kim atual tem três filhos pequenos, entre 2 e 10 anos. O tio Jang Song-thaek, considerado seu tutor nos primeiros anos de governo, foi preso por traição e executado em 2013. Um meio-irmão acabou envenenado no Aeroporto de Kuala Lumpur, na Malásia, em 2017, em um episódio até hoje não esclarecido. Outro irmão caiu em desgraça antes mesmo da morte do pai, ao ser impedido de entrar na fila para o trono por não ter o “perfil” de um governante. A mais cotada é a irmã caçula, Kim Yo-jong, de 31 anos, figura com fama de durona que já representou Kim no exterior e vem subindo na hierarquia norte-coreana. “Na tradição local, as mulheres não ocupam posições de liderança. Mas, se o irmão ficar incapacitado, é provável que ela assuma o governo, sob a tutela de uma cúpula dirigente”, opina Soojin Park, pesquisadora do Wilson Center, de Wash­ington. O zum-zum-zum só terminará quando — e se — Kim, o pavão misterioso, der o ar da graça.

Publicado em VEJA de 6 de maio de 2020, edição nº 2685

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