O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, renovou os alertas sobre os perigos das mudanças climáticas em um discurso nesta quarta-feira, 5, Dia Mundial do Meio Ambiente. O chefe do organismo internacional citou as chuvas e enchentes no Rio Grande do Sul para soar o alarme a respeito de desastres naturais, que estão se tornando cada vez mais frequentes e intensos devido ao aquecimento global, e também pediu que o mundo supere as divisões políticas para atuar em conjunto contra o desafio que diz respeito a todos.
Em discurso no Museu Americano de História Natural, em Nova York, Guterres usou os corredores cheios de dinossauros para fazer uma analogia. Segundo ele, a humanidade é apenas uma pequena parte da história da Terra, mas, tal como o meteoro que destruiu os gigantes animais que dominaram o planeta do Triássico ao Cretáceo, o impacto dos humanos é “descomunal”.
“No caso do clima, não somos os dinossauros. Nós somos o meteoro”, declarou o chefe das Nações Unidas.
Roleta-russa
Nesta quarta-feira, o Copernicus, observatório climático ligado à União Europeia, afirmou que o mês passado foi o maio mais quente já registrado na história, mais recente da série de recordes mensais quebrados no último ano. Ao mesmo tempo, a Organização Meteorológica Mundial informou que, hoje, há 80% de probabilidade que a temperatura média global aumente mais do que o limite estabelecido pelo Acordo de Paris, de 1,5 grau acima dos níveis pré-industriais, nos próximos cinco anos.
Para evitar ultrapassar esse limite, calcula-se que existe um “orçamento de carbono” de cerca de 200 bilhões de toneladas que ainda podem ser emitidas. No entanto, em conjunto, países ao redor do mundo continuam emitindo cerca de 40 bilhões de toneladas de CO2 por ano. A este ritmo, o “orçamento de carbono” será esgotado antes de 2030.
“Estamos jogando roleta-russa com o nosso planeta”, Guterres disse, acrescentando que a batalha para manter o limite dentro de 1,5 grau de aquecimento será decidida ainda nesta década. “Tudo depende das decisões que os líderes tomarem – ou deixarem de tomar – especialmente nos próximos dezoito meses”, alertou.
Chuvas no Rio Grande do Sul
A declaração especial do chefe das Nações Unidas, chamada de “Um momento de verdade”, ocorreu após as chuvas e subsequentes enchentes atingirem mais de 476 municípios no Rio Grande do Sul, onde quase 2,4 milhões de pessoas foram afetadas. Dessas, 806 ficaram feridas, 44 desapareceram e 172 morreram.
Guterres elencou a situação no estado brasileiro como um dos exemplos de como as mudanças climáticas são perigosas, por provocarem eventos cada vez mais extremos e frequentes. Já este ano, uma onda de calor brutal atingiu a Ásia com temperaturas recordes – murchando colheitas, fechando escolas e matando pessoas. Cidades como Nova Délhi, Bamako e a Cidade do México vivem temperaturas escaldantes. Nos Estados Unidos, tempestades violentas e furacões destruíram comunidades na região sul e central do país, matando ao menos nove pessoas. Chuvas extremas inundaram também a Península Arábica e a África Oriental, além do Brasil.
“Mesmo que as emissões (de carbono) cheguem a zero amanhã, um estudo recente concluiu que o caos climático ainda custará pelo menos 38 bilhões de dólares por ano até 2050″, ressaltou ele.
Cooperação global
Apesar de não mencionar diretamente conflitos como a guerra na Ucrânia, o conflito em Gaza ou disputas intensas por influência político-econômica entre Estados Unidos e China, Guterres enfatizou que ações para combater as mudanças climáticas não podem “ficar reféns de divisões geopolíticas”. Ele cobrou especialmente os países do G20, que se reúnem em cúpula na próxima quarta-feira, 12, responsáveis por 80% das emissões globais, de liderar a transição energética para uma economia que não seja baseada em combustíveis fósseis.
“Precisamos de cooperação, e não de acusações. Nenhum país pode resolver a crise climática isoladamente. Este é um momento all-in“, destacou o chefe das Nações Unidas. “Continuar apostando em combustíveis fósseis no século XXI é como apostar em ferraduras e rodas de carruagens no século XIX”, ironizou.
Guterres pediu para que todas as nações do mundo redobrem esforços e investimentos em mitigação das mudanças climáticas, dizendo que “todas as pessoas na Terra devem ser protegidas por um sistema de alerta precoce até 2027” e que é necessário elevar o financiamento à adaptação a esse novo normal aquecido para pelo menos US$ 40 bilhões por ano até 2025.
Ele também afirmou que “o fim da era dos combustíveis fósseis é inevitável”, e exortou todos os países a desenharem planos que 1) definam uma taxa eficaz sobre emissões de carbono; e 2) tributem os lucros “extraordinários” das empresas de combustíveis fósseis.