A temperatura sempre alta das relações entre os Estados Unidos e a Turquia subiu alguns graus no sábado 24. O presidente americano Joe Biden não hesitou em chamar de genocídio, com todas as letras, o massacre de armênios pelo Império Otomano, ocorrido em 1915, durante a I Guerra. “Todos os anos, neste dia, nós lembramos as vidas de todos aqueles que morreram no genocídio armênio durante a era otomana e reafirmamos o compromisso de evitar que tal atrocidade jamais ocorra novamente”, disse Biden. O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, reagiu denunciando “a politização por terceiros” do debate. Em Yerevan, capital da Armênia, houve procissões com tochas — relembrando o triste episódio e celebrando o passo americano. Não foi pouca coisa, e os ecos da postura de Biden, que tocou numa ferida aberta, tendem a repercutir ainda durante muito tempo, esquentando a guerra fria entre as duas nações. Naquela amarga passagem histórica, pelo menos 1,5 milhão de pessoas, cidadãos arrancados de suas casas, foram obrigadas a marchar na direção do deserto da Síria, em condições desumanas. Convém lembrar, para medir a dimensão do barulho provocado pela Casa Branca na semana passada, que a palavra genocídio não existia no início do século XX. Foi o advogado polonês Raphael Lemkin (1900-1959), de origem judaica, quem cunhou a palavra para definir o extermínio em massa de todo um povo, promovido pela Alemanha de Hitler e que ficou conhecido como Holocausto.
Publicado em VEJA de 5 de maio de 2021, edição nº 2736