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“Não enterremos a democracia com Mari”

Cabe aos democratas se unirem para chorar nosso Estado de Direito. E reconstruí-lo

Por Manoela Miklos
3 abr 2018, 14h00
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  • Alejandro Jodorowsky Prullansky, cineasta chileno, consuma falar sobre o que nomeia tatuagens mentais. O machismo, o racismo, o classismo, os preconceitos todos. São programações no nosso HD, muito difíceis de desprogramar. Algo que está inscrito em nossa estrutura cognitiva e nos leva a agir sem refletir, falando de um lugar que não é o da empatia, do acolhimento.

    A vereadora do Rio de Janeiro Marielle, amiga íntima e companheira de luta pela igualdade de gênero, foi brutalmente assassinada. Uma execução extrajudicial ainda sem solução ou responsáveis conhecidos. Respostas empáticas prevaleceram nas ruas e nas redes, mas é com os que não foram capazes desse gesto, cujas tatuagens mentais impediram qualquer comoção, que quero falar.

    Em 2005, o Professor Hector Saint Pierre ousou um definição do que é terror. Em termos gerais, o terrorismo é uma ação violenta que procura, mediante a espetaculosidade do ato, provocar na população uma reação psicológica de medo, um pavor incontrolável, o terror. O terror não é fenômeno novo, é tão velho quanto a própria humanidade, acompanha a sociedade desde sempre. Os Estados, os exércitos, as etnias, os grupos organizados e até mesmo os chamados lone wofs (lobos solitários) têm empregado o expediente do terrorismo como forma de diminuir a coragem dos seus inimigos, intimidar, enfraquecer a resistência e facilitar sua vitória.

    Tendo como propósito destruir o moral de suas vítimas, o terror se realiza no âmbito psicológico do indivíduo. Seu efeito é um pavor incontrolável. Esta característica subjetiva constitui um dos problemas centrais que enfrentamos na hora de definir este fenômeno. Saint Pierre nos lembra: o medo é um fenômeno subjetivo e não há como determinar objetivamente seus limites. Tais limites dependerão sempre de fatores pessoais, funcionais, históricos e culturais, dificultando a objetividade para defini-los.

    O que sabemos é que há uma proposital diferença entre os tipos de vítimas do terrorismo e é muito importante delinear suas definições. Há uma vítima que morre ou sai ferida, aquela que sofre diretamente o atentado; Mari e Anderson e a assessora que sobreviveu ao atentado. Estas são as vítimas táticas. Há outras que ficam em pânico e descontroladas, que se identificam em algum grau com a vítima tática e sente medo. Trata-se da vítima estratégica. Enfim, o terror sempre tens fins políticos. O fundamento do terror é o sentimento de desamparo que esgarça o tecido social e destroça a democracia. A fé nas instituições são abaladas, o contrato social é rasgado, a Constituição é posta à prova. E os resultados desse processo são indizíveis.

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    Daí meu apelo: não deixemos que esse ciclo se complete. Vençamos o medo. Se Marielle não era sua representante, se ela não era aquilo que você gostaria de ver ocupando espaços de poder, lembre-se da Constituição posta à prova. Do tecido social esgarçado. Da democracia que sucumbe. E saiba, levaríamos com grande pesar Bolsonaros, Tucanos, todos aqueles que no exercício do seu mandato tivessem sua vida ceifada.

    Eu velo uma amiga. Uma companheira. Mas hoje, 50 anos depois da morte do estudante Edson Luís, quase 30 anos depois da morte de Chico Mendes, é hora de nos juntarmos novamente, polarizações à parte. Independente das tatuagens mentais de cada um, cabe aos democratas unirem-se e chorar nosso Estado de Direito. E reconstruí-lo.

     

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