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Projeto quer criar “Tempestade Europeia” no surfe e traz jovens ao Brasil

Para Tiago Pires, idealizador do programa, é o trabalho mental dos atletas brasileiros que transformou o esporte e faz o país dominar circuito mundial

Por Moreno Bastos Atualizado em 31 jul 2023, 15h50 - Publicado em 31 jul 2023, 14h21
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  • Famosos por seus “picos” clássicos, com ondas poderosas como Nazaré, Ericeira, Quemao e Mundaka, Portugal e Espanha no entanto, nunca incluíram surfistas de destaque no cenário mundial do surfe. Mas um projeto iniciado em 2021 na península ibérica pretende transformar essa realidade. E o Brasil, país que conquistou seis dos últimos nove títulos mundiais, tinha que ser parada obrigatória no roteiro traçado pelo projeto, que também é documentado e divulgado nas redes sociais.

    Iniciativa liderada pelo português Tiago Pires, o Saca, considerado o maior surfista da história de seu país, o EDP Surf for Tomorrow trabalha cuidadosamente na preparação de cinco promessas ibéricas: os irmãos Kai e Hans Odriozola, além de Janire Gonzalez Etxbarri, da Espanha, e os portugueses Matias Canhoto e Maria Salgado. A equipe de jovens entre 15 e 18 anos é dirigida por Zé Seabra, ex-técnico de Pires, que tem no currículo sete anos no World Championship Tour (WCT) e deixou o surf profissional em 2016.

    O programa é ambicioso e pretende transformar a Europa em um polo do esporte. Nos últimos dois anos a estratégia do grupo tem sido viajar pelo mundo, treinar e competir em algumas das melhores ondas do planeta, sob as mais variadas condições. A vinda ao Brasil, com duração de duas semanas, foi além da rotina seguida em outros países. Os jovens vieram ver de perto a base do “Brazilian Storm”, o movimento que despontou com o primeiro título mundial de Gabriel Medina, em 2014, e que vem transformando a elite do surf no país há quase uma década. E não são só as manobras inovadoras e a técnica apurada que portugueses e espanhóis vieram estudar aqui. Para quem está por dentro do esporte, a chave do sucesso brasileiro é outra, explica Thiago Pires.

    “O que mais me chama atenção nos atletas brasileiros, antes até do surgimento da ‘Brazilian Storm’, é o espírito guerreiro, a resiliência. Conheço muitos atletas de ponta que tiveram carreiras com muitas dificuldades, mas a diferença é a maneira como cada um lida com isso. É diferente de cultura para cultura”, afirma o surfista veterano. “Acreditamos que a melhor mentalidade de um atleta de surf hoje no mundo é a do brasileiro. Para além da parte técnica e física, o nosso projeto tem um foco muito grande no trabalho mental”.

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    Foi por isso que, depois de alguns dias de treinos em uma piscina de ondas no interior paulista e a disputa de um campeonato em São Sebastião (SP),  Pires e Seabra levaram os cinco jovens a Florianópolis para encontrar Leandro Dora. Durante uma semana eles treinaram com o ex-surfista profissional que desenvolveu um método de trabalho e se tornou referência no universo do surfe quando o assunto é força mental. Pai e técnico de Yago Dora, atual quinto colocado no ranking da WCT (a 1ª divisão do surfe mundial), Dora “pai” tem, na bagagem, um título mundial como treinador de Adriano de Souza, o Mineirinho, em 2015. Ele foi um dos precursores da “tempestade brasileira” e se retirou do circuito internacional em 2021.

    “O brasileiro é muito forte no desconforto. São bons em ondas ruins. Já o europeu procura o lado mais confortável”, diz o técnico Zé Seabra.“Em Florianópolis fomos absorver a experiência e a sabedoria do Leandro Dora, um dos melhores técnicos do mundo, que tem revolucionado completamente alguns dos atletas hoje no topo do ranking. A técnica dele também está muito avançada. São aéreos incríveis, manobras que ampliam a confiança de qualquer atleta”, afirma. Seabra revela a tática que traçou para formar os novos surfistas: “Se conseguirmos aliar a formação técnica a este espírito mental que só os brasileiros têm, formaremos atletas de ponta. Está na hora de construirmos também uma ‘European Storm’”, diz o português, que também é um dos idealizadores do programa EDP Surf for Tomorrow.

    Segundo Dora, os dias com os surfistas europeus foram de treinamentos intensos, com muitas horas inclusive fora da água. Além de aperfeiçoar o desenvolvimento dos jovens, a oportunidade serviu também para propagar a metodologia desenvolvida por ele, que começa a ganhar popularidade não só na elite, mas principalmente na formação de novos surfistas.

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    “Quando o Tiago Pires e o Zé Seabra me procuraram, fiquei muito entusiasmado. Eles são profissionais sérios, há muitos anos ligados e acompanhando toda a evolução do esporte. Tivemos esse surf camp muito intenso, focando o trabalho da Aprimore Surf, uma metodologia que desenvolvemos e engloba vários pilares do esporte”, afirma Dora, revelando que a metodologia está sendo aplicada no primeiro Centro de Treinamento chancelado pela WSL no Brasil, em Saquarema (RJ). “É incrível como a parte técnica trabalha junto com a parte mental, a autoconfiança do atleta. Então é nisso que a gente investe, principalmente nesta faixa etária em que o atleta ultrapassa a linha do amadorismo e se encaminha para o profissional e esta fase exige mais treinos fora d´água.” O pai de Yago Dora explica que a parte física, mental e a alimentação formam um pacote que deve ser trabalhado e que projetos como este, da EDP, que patrocinam toda uma equipe e não só um atleta ou um evento, são muito eficazes porque atuam a longo prazo para formar atletas para a elite mundial. “É muito legal contribuir para o desenvolvimento dos jovens surfistas europeus.”

    A sonhada tempestade europeia ainda parece distante, mas resultados expressivos já começam a aparecer, inclusive na passagem pelo Brasil. Os jovens participaram da segunda etapa do Hang Loose Surf Attack, tradicional torneio de base realizado no litoral norte de São Paulo, que revelou Medina, Mineirinho e o atual campeão mundial, Filipe Toledo. A espanhola Janire Gonzalez Etxbarri saiu de lá com o título, tornando-se a primeira estrangeira a conquistar uma etapa do campeonato.

    “Fico muito feliz em ser a primeira não brasileira a conquistar uma etapa. Vimos no Surf Attack como o nível feminino também é muito alto no Brasil”, diz Etxbarri. “Eu me inspiro muito na Tatiana Weston-Webb e me comparo também à Sophia Medina, porque temos a mesma idade”, afirma a espanhola de 18 anos, ao citar Tatiana, a melhor surfista brasileira do circuito mundial (8ª), e Sophia, a irmã de Gabriel e uma das promessas brasileiras nas ondas.

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