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Como a França ignorou adversidades e está a um passo de marca histórica

Desde o Brasil em 1962, a Copa do Mundo não tem um bicampeão consecutivo. Pragmáticos e talentosos, 'Les Bleus' não temem a Argentina de Messi

Por Luiz Felipe Castro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 14 dez 2022, 19h49 - Publicado em 14 dez 2022, 18h25

Al KHOR Nos corredores do estádio Luzhniki, em Moscou, quatro anos e meio atrás, jornalistas comentavam, em consenso: mesmo sem ser brilhante, a seleção da França que acabara de bater a Croácia e de repetir a geração de Zidane ainda teria muita lenha para queimar e deveria chegar à Copa do Mundo de 2022 novamente como favorita. Não deu outra: com Kylian Mbappé e Antoine Griezmann mais maduros, Olivier Giroud sem tanta pressão, e um time que manteve a consistência e ainda renovou seus talentos, o grupo dirigido por Didier Deschamps segue indestrutível. Nem mesmo uma série de percalços, como os cortes de diversos titulares, abalou o atual campeão. Nesta quarta, 14, a França segurou a pressão do valente e organizado time do Marrocos, que praticamente jogava “em casa”, tamanho o barulho da torcida no estádio Al Bayt, venceu por 2 a 0, e agora vai em busca de igualar uma marca que já dura seis décadas.

O último bicampeão consecutivo foi o Brasil de 1962, com brilho intenso de Garrincha e apoio de Amarildo, o Possesso, decisivo na vaga do lesionado Pelé. Guardadas todas as devidas proporções, a campanha canarinho no Chile guarda semelhanças com a trajetória desta França, que não perdeu um Pelé, mas o seu jogador mais letal, o atual Bola de Ouro Karim Benzema (também ausente em 2018 por questões disciplinares) e mais cinco peças-chave: Paul Pogba, N’Golo Kanté, Lucas Hernández, titulares na Rússia, e Presnel Kimpembé e Christopher Nkunku, todos lesionados pouco antes ou durante o Mundial.

Parecia a senha para o fracasso da França, que vinha de um último ano de ciclo turbulento e ainda carregava o histórico de se meter em confusões e dar vexame após boas campanhas — foi assim em 2002 e 2010. Nesse sentido, talvez a saída de Benzema tenha até sido benéfica: a lenda do Real Madrid passou cinco anos fora do time, enrolado em uma denúncia de suborno contra o ex-colega Mathieu Valbuena. Nesse período, chegou a zombar do colega Giroud ao ser comparado com o herdeiro de sua camisa 9. “Não se confunde um carro de Fórmula 1 com um de kart. E eu estou sendo gentil com ele. Eu sou o de Fórmula 1.” A imprensa francesa garante que Benzema não era dos mais queridos pelo grupo. Sem ele, Mbappé assumiu o protagonismo e Giroud vem dando conta do recado, com quatro gols no Mundial.

A França não joga um futebol vistoso, revolucionário, nada disso. Seu técnico Deschamps, de 54 anos, já está na história das Copas, pois é, ao lado do alemão Franz Beckenbauer e do brasileiro Zagallo, o único a ter erguido a taça como atleta, em 1998, e técnico, vinte anos depois. Mas não será lembrado por sua inventividade. É uma espécie de Dunga francês: foi um bom volante, um líder nato, e virou um técnico extremamente pragmático. Seu time joga fechado, de forma segura, explorando a velocidade de Mbappé. Há dez anos no cargo, Deschamps se manteve fiel a seu estilo e conseguiu manter o padrão com a entrada de jovens talentos como o classudo meia Aurélien Tchouámeni, de 22 anos, já uma estrela do Real Madrid e tão bom quanto ou melhor que Pogba, e os incansáveis Ibrahima Konaté e Youssouf Fofana, ambos de 23 anos. O último era o quarto reserva e hoje fez uma grande partida diante dos marroquinos.

Youssouf Fofana, jovem defensor francês, não sentiu a pressão na Copa -
Youssouf Fofana, jovem defensor francês, não sentiu a pressão na Copa (Ricardo Corrêa/Placar)
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Não sabíamos como o time poderia reagir no plano emocional, sob pressão. Mas a integração dos mais novos com os mais experientes se deu muito bem e uma dinâmica positiva se instalou no nosso time”, afirmou Deschamps na véspera. A renovação de jovens promissores não é coincidência. Desde 1988, a federação francesa mantém um centro de excelência, o Instituto Nacional de Futebol em Clairefontaine-en-Yvelines, a 50 quilômetros de Paris, para onde são mandados os garotos mais promissores. Por lá foram formados craques como Thierry Henry e a bola da vez, Mbappé. 

Na decisão do próximo domingo, 18, ele fará um duelo memorável com seu colega de PSG, Lionel Messi. Enquanto o argentino busca a taça inédita que lhe eternizará entre os maiores de todos os tempos, Mbappé segue os passos de Pelé, sendo até mais decisivo. Pode conquistar o bi aos 23 anos (dois a mais que o Rei tinha quando assistiu das arquibancadas, lesionado, o triunfo sobre a Checoslováquia em Santiago. O francês já tem nove gols em Copas, três a menos que Pelé, e sete a menos que o recordista Miroslav Klose. Ou seja, tem idade e qualidade suficientes para pulverizar todas essas marcas, além da companhia fundamental de “coadjuvantes” como Griezmann, um autêntico craque, discreto e eficiente, eleito o melhor em campo nesta quarta.

Não há um favorito claro na final de domingo, no Lusail. Ainda que a Argentina chegue mais empolgada, com Messi sedento e um time também repleto de novos talentos, esta França jamais pode ser menosprezada. Na Rússia, os times fizeram o melhor jogo da Copa, 4 a 3 para a França nas oitavas de final, com show de Mbappé. Como na final de 1970, entre Brasil e Itália, o duelo vale o tricampeonato para ambos.

Mbappé passou em branco na partida -
Kylian Mbappé, imparável e cada vez melhor, aos 23 anos – (Ricardo Corrêa/Placar)
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