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A emocionante origem do nome de Éder Jofre

O maior peso-galo da história do boxe foi batizado em homenagem a um tio que fugia da polícia do Estado Novo de Getúlio Vargas

Por Fábio Altman Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 2 out 2022, 15h50 - Publicado em 2 out 2022, 15h45
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  • Eder Jofre embarca para o Japão acompanhado pela mulher Maria Aparecida, o pai e técnico Aristides Jofre e pelo empresário Abraão Katznelson (à esq.). Ele enfrentará o japonês Masaiko Harada na tentativa de recuperar o título dos pesos galo
    Éder Jofre com o pai, Aristides Jofre, a mulher, o filho e um empresário: o maior peso-galo de todos os tempos - (UH/Folhapress, 3519/VEJA)

    As pastas de papelão com elásticos já esgarçados pelo tempo contam um pouco da história de Éder Jofre. Há nelas fotografias que revelam, entre o preto-e-branco e o sépia, a aventura de um clã, os Zumbano-Jofre-, que ergueu a socos, mas também com delicadeza e permanente atuação política, a trajetória do boxe no Brasil. Em uma das imagens estão quase todos em cima de um ringue e a iluminação de cinema: Éder; seu pai, Aristides Jofre, que se casara com Angelina Zumbano; seus irmãos e seus tios – entre eles Waldemar Zumbano, o Neno, meu avô (por isso tenho as fotos guardadas em casa).

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    Sem o Nê, como o chamávamos, o mundo não ouviria falar de Éder Jofre – ao menos ele não teria esse nome. O relato do batizado de Éder Jofre é um capítulo emocionante de um tempo de chumbo, a primeira metade do século XX no Brasil. Corria o ano de 1935. Os irmãos Waldemar e Higino militavam na Aliança Nacional Libertadora, a ANL, costela do Partido Comunista Brasileiro, o PCB. Ela tinha sido criada em janeiro daquele ano por um grupo de operários, intelectuais e militares descontentes com o Estado Novo do governo de Getúlio Vargas. A revolução estava a caminho. A ANL tinha contato direto com a Internacional Comunista, conhecida como Komintern, órgão responsável pelo apoio, em dinheiro e armas, aos combatentes comunistas de todo o mundo. O movimento fracassaria, reprimido pela ditadura de Getúlio.

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    Higino foi preso e condenado a dois anos de prisão em Fernando de Noronha – conseguiu fugir e, com a mulher, Cleonice, viveu meses escondido, na clandestinidade, no interior de Goiás. Waldemar continuou na militância. Tinha 23 anos. A casa onde morava a família, no Parque Peruche, Zona Norte de São Paulo, mantinha a porta de trás constantemente aberta à noite para que ele pudesse entrar, sorrateiramente, sem perigo – ou então fugir sem ser visto. Em novembro de 1935, o levante comunista que se espalhara por Natal, Recife e Rio de Janeiro – liderado pela ANL, que tinha como comandante Luís Carlos Prestes – foi derrotado em um episódio que seria conhecido, de modo pejorativo, como a Intentona Comunista. Eis como o escritor Henrique Matteucci, no livro O Galo de Ouro, narrou aquele momento no seio dos Zumbano-Jofre: “Novembro amanheceu com bandeiras vermelhas penduradas nos fios de eletricidade. Os jornais trouxeram notícias estarrecedoras do Rio e Recife, e a burguesia pôs-se a tremer. Em São Paulo, a polícia prendeu a torto e a direito. Bastava ser operário para ser suspeito. Os Zumbano eram mais do que suspeitos. Estavam na mira da polícia, que já andava também no rastro de Waldemar. Quando a ação comunista agitou o país, Angelina estava grávida de três meses”.

    O clã Zumbano-Jofre: a família que fez crescer o boxe no Brasil
    O clã Zumbano-Jofre: a família que fez crescer o boxe no Brasil – (./.)

    Waldemar seria preso. Ficou dez dias na cadeia. Libertado, porque não o identificaram como militante comunista, saiu de São Paulo a caminho de Minas Gerais, decidido a sumir do mapa. Mas o que fazer para ganhar dinheiro e sobreviver? Como desenhava muito bem, no belo paradoxo de mãos afeitas a calçar luvas e lápis, a cada parada se oferecia para pintar cartazes dos filmes que estreavam nas salas de cinema mudo. Essa era a atividade diurna. Nas tardes, montava um ringue de boxe, com cordas que levava nas malas, e se lançava a desafios contra pugilistas locais, cobrando ingressos. Não podia, é claro, circular com o nome real, com a polícia ao encalço – tratou, então, de inventar um pseudônimo, emprestado de um boxeador austríaco: “Frank Eder”.

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    Aristides, que nunca se envolvera com política, também seria preso no início de 1936. Solto, não parava de esbravejar, a seu feitio – contra os tiras, contra o governo e um pouco contra os cunhados, embora nunca os reprimisse pela postura ideológica. Em 26 de março de 1936, Angelina acordou o marido de madrugada.

    – Aristides, Aristides, é agora, vá buscar Dona Rosa (a parteira).

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    Naquela manhã nasceria um menino.

    – “Um menino, você ouviu, Angelina? Um machito”, disse Aristides, com seu português com sotaque de quem nascera na Argentina.

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    –  Como é mesmo o nome que o Waldemar usa no boxe, para não ser preso?

    – Frank. Frank Eder.

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    – Frank é meio esquisito. Nosso menino será então Éder.

    E então o mundo conheceria Éder Jofre, o maior peso galo de todos os tempos, filho do boxe e da política. Ele foi um dos grandes nomes do pugilismo, um brasileiro que, no auge, tinha o tamanho de Pelé.

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