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O amor segundo Stendhal, um dândi que escreve como poucos

Em pequeno volume acadêmico, uma compilação elegante para quem sente as dores de uma paixão

Por Redação Atualizado em 4 jun 2024, 12h20 - Publicado em 3 set 2022, 07h00

O texto a seguir faz parte da edição especial de VEJA em torno dos 200 anos da independência. A ideia é tratar as notícias como seriam publicadas naquela semana de 7 de setembro de 1822 – tudo o que viria a ocorrer depois, portanto, ainda não aconteceu. É um passeio histórico ao cotidiano de dois séculos atrás.

Desgostoso, abandonado pela amante milanesa, a bela Matilde Viscontini Dembowski, o escritor francês Henri-Marie Beyle, um dândi de 39 anos que se apresenta com um codinome de sonoridade alemã — Stendhal —, fez das dores um pequeno tratado filosófico em torno do amor. Aos poucos, ainda muito lentamente, a publicação tem corrido de mão em mão, de boca em boca. Pode estar nascendo um astuto intelectual das coisas da vida, alguém capaz de distinguir o vermelho do negro. Embora trate do amor, o livrinho não é um romance, e sobretudo não é divertido como um romance. É simplesmente uma descrição exata e científica de uma espécie de loucura a grassar na França: o império das conveniências, que cresce a cada dia, ainda mais em razão do medo do ridículo que, por causa da pobreza dos nossos costumes, fez da palavra que serve de título a essa obra — amor! — uma expressão que evitamos pronunciar sozinha e que pode até parecer chocante. A ideia central: a “cristalização amorosa”. A pessoa apaixonada cristaliza-se, isto é, fica paralisa­da, perde a habilidade de agir e raciocinar, sobretudo em presença do ser amado. É uma noção inédita.

De l’amour - Edições Pierre Mongie, Paris, 1822 -
De l’amour – Edições Pierre Mongie, Paris, 1822 – (./.)

É leitura agradável que explica simples, razoável e matematicamente, por assim dizer, os diversos sentimentos que se sucedem uns aos outros e cujo conjunto se chama a paixão do amor. Imaginem uma figura de geometria complicada, traçada com giz branco num grande quadro-negro: pois bem, a figura geométrica pode ser muito bem explicada, mas uma condição necessária é que ela já exista no quadro-negro. Essa impossibilidade é que torna tão difícil escrever sobre o amor um livro que não seja um romance.

Para seguir com interesse um exame filosófico desse sentimento, é preciso que haja no leitor algo além da inteligência; é necessário que ele tenha visto o amor. Ora, pode-se ver uma paixão? O amor é como o que no céu chamamos de Via Láctea, um amontoado brilhante formado por milhares de estrelinhas, cada uma delas sendo, muitas vezes, uma nebulosa. De l’Amour (Edições Pierre Mongie, Paris), que Beyle nos oferece, tem a infelicidade de só poder ser compreendido por pessoas que encontram tempo para fazer loucuras. Muitas vão considerar-se ofendidas, e espera-se que fiquem apenas nisso. Mas pode funcionar, e bem, para leitores que na vida foram infelizes durante seis meses por amor. Serve ao próprio autor, pode servir também a Matilde. Exige-se, de qualquer maneira, a indulgência com a forma singular dessa fisiologia do amor.

Publicado em VEJA de 13 de setembro de 2022, edição especial nº 2805

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