Quando Emma Watson foi anunciada no elenco do novo A Bela e a Fera, versão em carne e osso (o chamado live-action) da animação lançada pela mesma Disney em 1991, houve quem estranhasse. A atriz, que vem assumindo posições consideradas feministas e chegou a recusar a oferta para viver a frágil Cinderela no cinema, protagonizaria um conto de fadas, gênero associado à, digamos, castração feminina. Mas Emma, à la Bela, enxergou algo mais em sua personagem, aliás surgida no século XVII em um romance para adultos que questionava a condição da mulher, cujos casamento e destino eram decididos à sua revelia. “Ela é curiosa, compassiva e tem a mente aberta”, disse a atriz de 26 anos à revista britânica Total Film, em janeiro. “Ela é meio estranha, forasteira naquele mundo, e desafia o que é esperado dela de maneira empoderadora. Ela desafia o status quo do lugar onde vive. Consegue se manter íntegra e ter um ponto de vista completamente independente.”
A mensagem que Bela passa é similar à que Emma tenta transmitir como figura pública, em entrevistas e redes sociais. Antenada com o espírito de sua geração, de meninas de 20 e poucos anos que vêm recebendo apelidos nem sempre carinhosos – como o de “feminazi” – pelas posições que firmam, a britânica, conhecida mundialmente desde os 11 anos por interpretar Hermione Granger na saga Harry Potter, desafia padrões e levanta bandeiras. No filme, Bela faz o mesmo: em uma passagem, vê-se a menina, a única a ler na vila em que mora, ensinar uma garotinha a desvendar um livro, o que é mal visto pelo pai da aluna.
Daí Emma considerar Bela um modelo a ser seguido pelas meninas. “Ela é o tipo de mulher que eu gostaria de interpretar para dar um bom exemplo.” A atriz, que desde 2014 é embaixadora da ONU Mulheres, divisão da entidade voltada à promoção da igualdade de gênero e do empoderamento feminino, fala abertamente, por vezes em tom didático, sobre feminismo e direitos das mulheres. “Quanto mais eu falo sobre feminismo, mais eu entendo que lutar pelos direitos das mulheres parece ter se tornado sinônimo de odiar os homens. Mas feminismo é, na verdade, a crença de que homens e mulheres devem ter direitos e oportunidades iguais”, afirmou em um evento da ONU três anos atrás.
O ativismo, embora soe positivo para parte dos fãs, vinha eclipsando a carreira da atriz. Fez poucos filmes nos últimos anos, se compararmos sua produtividade com a de muitas estrelas de Hollywood: rodou O Círculo, que deve estrear ainda em 2017, Regressão (2015) e Amor e Revolução (2015). São projetos independentes, para não dizer diferentões: no primeiro, ela vive uma recém-formada que galga posições em uma grande empresa enquanto se depara com um grande mistério envolvendo espionagem; no segundo, é uma adolescente que sofria abuso sexual do pai; e, no último, uma jovem que busca o namorado, sequestrado pela polícia durante o golpe militar no Chile, em 1973. Regressão arrecadou só 55.039 dólares nos Estados Unidos (foi melhor no resto do mundo, com bilheteria de 17,6 milhões de dólares). Já Amor e Revolução, que estreou somente nos EUA, arrecadou módicos 15.709 dólares.
Seus trabalhos anteriores foram mais populares, mas em nenhum deles Emma foi protagonista. São eles Noé (2014), de Darren Aronofsky, em que interpreta a filha adotada do herói bíblico, Bling Ring: A Gangue de Hollywood (2013), de Sofia Coppola, sobre adolescentes que invadiam e roubavam a casa de famosos, As Vantagens de Ser Invisível (2012), de Stephen Chbosky, drama jovem sobre um trio de adolescentes, e Sete Dias com Marilyn (2011), de Simon Curtis, em que faz uma assistente de figurino, com pouquíssimas aparições.
Foram filmes que atraíram espectadores e críticos – Noé, por exemplo, arrecadou 362 milhões de dólares. Nenhum, porém, chegou aos pés do fenômeno Harry Potter, uma das franquias de maior sucesso comercial do cinema, com bilheteria acumulada de 8,5 bilhões de dólares com seus oito longas (isso sem ajuste de inflação, segundo o site especializado Box Office Mojo). Hermione, que formava o trio principal da série ao lado de Harry (Daniel Radcliffe) e Rony (Rupert Grint), foi o primeiro papel profissional de Emma. E a tirou do anonimato.
Longe de ser uma personagem com ares de coadjuvante, Hermione, possivelmente a aluna mais brilhante que a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts já teve, era o verdadeiro cérebro do grupo no combate ao vilão Voldemort, na saga criada pela britânica J. K. Rowling. “Harry é muito mais intuitivo. Rony está ali apenas por estar. Hermione é a pessoa que tem um plano. Ela está no controle”, analisou Emma em entrevista à revista Entertainment Weekly.
Por crescer diante das câmeras, Emma Watson, que começou a atuar em peças de teatro na escola e em seguida embarcou na franquia Harry Potter, na qual atuou dos 9 aos 20 anos, chegou a duvidar que quisesse trabalhar com cinema na vida adulta. Dinheiro, claro, não era preocupação – ela tem uma fortuna estimada em mais de 30 milhões de libras. Em 2009, Emma iniciou um curso de literatura inglesa na Universidade Brown, nos Estados Unidos. Depois de uma pausa de dois semestres em 2011 e de assistir a algumas aulas como visitante na Universidade de Oxford, na Inglaterra, concluiu os estudos em 2014. Nesse meio tempo, voltou a ter vontade de atuar ao ler o roteiro de As Vantagens de Ser Invisível. “Li e me apaixonei. Foi uma experiência tão boa fazer aquele filme que isso resolveu o meu dilema de atuar ou não. Parei de intelectualizar a questão e tudo se tornou mais instintivo.”
Discreta, Emma evita expor sua vida. Sabe-se que a atriz foi criada no condado de Oxfordshire, apesar de ter nascido em Paris, na França, onde seus pais atuavam como advogados. Após o divórcio do casal, quando a menina tinha 5 anos, ela foi para a Inglaterra, onde passou a morar com a mãe. Há sempre muitos rumores – um deles, inclusive, de que namorou o príncipe Harry, já desmentido. Confirmado, há o namoro com o colega de faculdade Will Adamowicz, enquanto estudava na Universidade de Oxford. No começo de 2014, ela engatou relacionamento com o jogador de rúgbi Matthew Janney, com quem passou cerca de um ano. Mais tarde, à Vogue britânica, ela classificou o término da relação como “horrendo”. Os últimos flagras dos paparazzi dão conta de que ela, agora, namora o empresário americano William Knight. Ela, mesmo, não diz nada. Como Bela, Emma parece meio “estranha, forasteira” – isso no mundo das celebridades, tomado por selfies e pela exposição excessiva da vida pessoal.