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O analfabetismo ideológico

As lições de Wittgenstein para os políticos e as massas digitais

Por João Cezar de Castro Rocha
Atualizado em 28 jan 2019, 15h16 - Publicado em 25 jan 2019, 07h00

– Em 1789 a Revolução Francesa antecipou a emergência no mundo moderno de um novo agente político: as massas urbanas.

– O deputado federal recentemente eleito Kim Kataguiri deslumbrou o conhecimento histórico mundial ao acreditar que Karl Marx compreendeu os equívocos de sua teoria em virtude dos desdobramentos da I Guerra Mundial: “O próprio Marx percebeu”, informou o erudito parlamentar Kim.

– Fala-se muito hoje em dia no analfabetismo funcional, isto é, na incapacidade de interpretação mesmo de textos simples.

– A emergência das massas foi potencializada pela difusão cotidiana de poderosos meios de comunicação. O texto impresso, por exemplo, somente se tornou plenamente um objeto do dia a dia no século XVIII.

– Ludwig Wittgenstein foi um dos mais complexos filósofos do século XX. Em 1921 publicou o clássico Tractatus Logico-Philosophicus, buscando superar os “falsos” problemas da tradição filosófica por meio de um uso rigoroso da linguagem e sobretudo de conceitos. Eis o sentido forte da célebre afirmação: “Sobre aquilo que não se pode falar, deve-se calar”.

– Lições banais de cronologia: a I Guerra Mundial eclodiu em 28 de julho de 1914. Karl Marx faleceu em 14 de março de 1883. Vamos facilitar o cálculo? 1914 – 1883 = 31. O inovador parlamentar Kim propôs um método inesperado: a hermenêutica mediúnica.

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– No século XX as massas urbanas tornaram-se protagonistas e sua movimentação errática levou ao colapso do modelo da democracia liberal. O rádio e o cinema foram fundamentais no processo de manipulação das multidões.

– Publicado postumamente em 1953, Investigações Filosóficas, outro clássico de nascença, concluiu um percurso inédito. Em seu segundo livro, Wittgenstein inaugurou uma abordagem que contradizia os aspectos centrais do Tractatus Logico-Philosophicus.

– Não terá chegado a hora de propor o conceito de analfabetismo ideológico? Nesse caso, não se trata de inépcia, porém da impossibilidade de ler o que não seja espelho de convicções políticas.

– O chanceler Ernesto Araújo escreveu um artigo intrincado a fim de iluminar a orientação de seu ministério (sei que você me entendeu perfeitamente…). Por algum motivo, imaginou que deveria esclarecer sua leitura da obra de Wittgenstein. Após linhas inquietantes, asseverou com invejável coragem intelectual: “I don’t like Wittgenstein”.

– No século XXI a explosão das redes sociais propiciou o surgimento das massas digitais, cuja forma direta e imediata de ação ameaça dar xeque-mate no sistema político; aliás, como ocorreu no plebiscito do Brexit e nas eleições de Donald Trump e Jair Bolsonaro.

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– A imprensa tem sido injusta com o poliglota que tropeça no próprio idioma. O chanceler ofereceu uma contribuição singular: por que aprender idiomas com desvelo ou estudar textos com diligência? Nonada! Basta adotar o “Método Facebook Ernesto Araújo de História de Filosofia”: “I like” ou “I don’t like”.

– Outra era a vez — já se disse.

Publicado em VEJA de 30 de janeiro de 2019, edição nº 2619

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